Assédio moral institucional foi tema de audiência com corregedor-geral da Justiça Federal


20/10/2023 - Luciana Araujo
Ministro comprometeu-se a seguir monitorando apuração do 'Caso Paulo Arena' e defendeu que não pode haver desprestígio aos servidores.

Da esq. para a direita: o advogado César Lignelli, o diretor Cléber Borges, o dirigente da Fenajufe e da CSP-Conlutas Fabiano dos Santos, as diretoras Rosana Nanartonis e Ana Luiza, o ministro Og e a juíza-auxliar Alcioni Escobar (Foto: Arquivo Sintrajud).

Na reunião com o corregedor-geral da Justiça Federal, ministro Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes, ocorrida na última quarta-feira (18 de outubro), a diretoria do Sindicato reiterou o pedido de rigor na apuração da denúncia de capacitismo (discriminação a pessoa com deficiência) em face do juiz-auxiliar da Presidência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Paulo Arena Filho.

Os dirigentes ressaltaram que é preciso assegurar a responsabilização do magistrado que, na presidência do Juizado Especial Federal de Ribeirão Preto, produziu despacho solicitando à Diretoria do Foro que “sejam tomadas as providências devidas para que [nome do servidor] seja colocado à disposição dessa Diretoria do Foro e posteriormente relotado em Vara ou Setor que atenda às suas necessidades especiais”. E depois ainda afirmou à mídia que demandou à administração “que o servidor fosse lotado em outra unidade judiciária, tendo em vista não haver no Juizado Especial Federal de Ribeirão Preto ambiente organizacional compatível ao trabalho nas condições estipuladas.”

O Sindicato formalizou denúncia e a Corregedoria-Regional instaurou procedimento que tramita em sigilo. Após provocação da central sindical à qual o Sintrajud é filiado (a CSP-Conlutas) o corregedor nacional de justiça, ministro Luis Felipe Salomão, considerou que “da análise dos autos, verifica-se a presença de possíveis indícios de violação dos deveres funcionais do reclamado” e determinou à Corregedoria da JF “que apure os fatos narrados” no prazo de 60 dias, com monitoramento da Corregedoria do CNJ (leia aqui). No último dia 11, o ministro Salomão estabeleceu prazo de 15 dias para que o TRF-3 informe o andamento do processo administrativo e junte o inteiro teor de eventual decisão ou acórdão, com certidão de trânsito em julgado.

“Se normalizamos esse tipo de situação vamos a uma situação de sofrimento insuportável, e aqui não está tendo nenhuma consideração da Presidência”, frisou Ana Luiza.

O ministro Og Fernandes, que recebeu o Sindicato nas dependências do TRF durante a inspeção nacional e assessorado pela juíza-auxiliar Alcioni Escobar, ressaltou estar ciente da denúncia e acompanhando o caso, embora não possa interferir na apuração já em curso na Corregedoria do Tribunal. Fernandes também destacou que apesar das diferentes perspectivas de atuação do Sindicato e da administração, “não [se] pode desprestigiar o servidor”, disse.

Assédio institucional

A cultura organizacional assediadora existente no TRF-3 e demais órgãos do Judiciário Federal no estado também foi denunciada ao ministro. O silêncio da presidente do Regional, desembargadora Marisa Santos, que mantém Arena como auxiliar da Presidência e não se pronunciou sobre o caso passados cinco meses da formalização da denúncia pelo Sintrajud, foi duramente criticado. A direção do Sindicato lembrou ainda a demissão injustificada da então dirigente sindical Beatriz Massariol, determinada por Marisa Santos e posteriormente revertida pelo Conselho da Justiça Federal da 3ª Região.

“Tivemos uma diretora do Sindicato demitida na gestão Marisa Santos, uma diretora no TRE que foi colocada em sindicância no TRE, o caso do João e vários outros, cada vez mais comuns na lógica de ‘fazer mais com menos’, além dos casos de assédio sexual praticados pelo juiz [trabalhista substituto] Marcos Scalercio. Conseguimos afastar a demissão da nossa colega, afastar o juiz e arquivar a sindicância, mas é uma realidade de assédio generalizado. Em Ribeirão Preto, uma vara que tem o melhor score da região pode ser extinta para que o pessoal “ajude outros setores a alcançarem bons índices”, apontou Ana Luiza.

O corregedor comprometeu-se a buscar reabrir canais de diálogo entre a administração — Marisa Santos recebeu a entidade apenas uma vez, durante manifestação realizada em cerimônia de inauguração da Central de Processamento Eletrônico em Campinas (leia aqui) — e a representação dos trabalhadores. E reconheceu que o enfrentamento ao assédio precisa ser feito de forma global. “Se se trata só a questão individual, resolve-se o galho e não o tronco”, disse.

Os representantes da categoria ressaltaram que o contexto de aumento permanente das metas e estrangulamento orçamentário imposto pelas políticas de ajuste fiscal, às quais as administrações se submetem, tem piorado os índices de adoecimentos e afastamentos.

“Vamos debater carreira num contexto de arcabouço, política de ‘déficit zero'”, lembrou Ana, referindo-se aos debates no Fórum de Carreira instituído pelo Conselho Nacional de Justiça. “E uma parte dos nossos salários não nos pertence como parte da carreira, que são as FCs. Também não temos o teletrabalho regulamentado, temos carência de servidores, um nível de adoecimento imenso. E estamos vivendo tudo isso ao mesmo tempo. E isso agrava muito a situação de assédio”, completou.

Pelo Sintrajud, estiveram presentes as diretoras Ana Luiza Figueiredo e Rosana Nanartonis, o diretor Cleber Borges e também o dirigente da Fenajufe e da CSP-Conlutas Fabiano dos Santos.

Cléber lembrou ainda o fato de, neste cenário de assédio institucional, os planos de assistência médica e odontológica administrados pelo Tribunal terem aumentado muito os seus preços, pressionando ainda mais a saúde dos servidores.

Rosana destacou que, apesar dos esforços dos servidores e do Sindicato para que as comissões de enfrentamento ao assédio efetivamente funcionem, muitas vezes as denúncias ficam sem encaminhamento concreto. Foi lembrado, por exemplo, que no âmbito do TRT-2 o processo para apurar a conduta do juiz Marcos Scalercio fora arquivado. Após atuação do Sindicato e denúncias de dezenas de vítimas repercutirem como escândalo na mídia, o Conselho Nacional de Justiça condenou o juiz à aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais — medida que a direção do Sintrajud considera absolutamente insuficiente como punição por crimes contra a dignidade humana.

TALVEZ VOCÊ GOSTE TAMBÉM