Um passo à frente na luta contra o capacitismo: reestabelecida garantia de direitos para surdez unilateral


19/12/2023 - Giselle Pereira
Com a lei, as surdas e surdos unilaterais deixam de depender de decisões individuais; outra conquista é a possibilidade de incluir símbolos internacionais de acessibilidade em carteiras de identidade funcional.

Os movimentos que lutam em defesa da Pessoa com Deficiência (PcD) conquistaram uma importante vitória em nível nacional: a derrubada do veto total do então presidente da República Jair Bolsonaro ao Projeto de Lei (PLC) 23/2016. A proposta garante direitos às pessoas que vivem com surdez total em um dos ouvidos (deficiência auditiva unilateral). Hoje a legislação nacional considera apenas a limitação bilateral, ou seja, em ambos os ouvidos. A decisão se deu em sessão conjunta do Congresso Nacional, no último dia 14. O texto final revisado foi publicado neste dia 18 e será promulgado pelo parlamento até o final deste mês (acompanhe aqui).

A lei vai garantir aos deficientes auditivos unilaterais direitos assegurados às pessoas com deficiência, como acesso a cotas em concursos públicos e a vagas nas empresas. Para o servidor João Carlos Peres, o Johnny, vítima de capacitismo cometido pelo juiz Paulo Arena Filho — presidente do JEF/Ribeirão Preto e auxiliar da desembargadora Marisa Santos na presidência do TRF-3 —, a derrubada do veto é uma vitória para o movimento da Pessoa com Deficiência (PcD).

“Com a lei, as surdas e surdos unilaterais deixam de depender de decisões individuais, com variações em cada estado”, destacou João.

O servidor também comemorou a possibilidade das servidoras e dos servidores de incluir símbolos internacionais de acessibilidade em carteiras de identidade funcional, aprovada pela Resolução CNJ nº537, de 13 de dezembro de 2023, que alterou a decisão nº 401/2021 do Conselho.

João Carlos ao lado das deputadas estaduais Beth Sahão (PT) e Mônica Seixas (PSOL) durante votação da moção contra o capacitismo, na Alesp. Foto: Arquivo Sintrajud

Ainda sobre o caso de João, que tem deficiência auditiva unilateral e prestou concurso para a vaga destinada a esse atributo, quando ele tomou posse no TRF-3, em 2009, já havia sido reconhecido o direito no estado de São Paulo por meio da Lei Estadual 16.769 de junho de 2018. “No meu caso, em específico, a lei nacional não traz mudanças”, disse, no entanto, lembrando que é primordial uma lei federal, que supere mais uma etapa nas dificuldades das PcD.

O processo que apura a situação vivida por Johnny no Judiciário Federal de São Paulo, cuja disponibilidade foi pedida com um documento oficial de conteúdo discriminatório assinado pelo juiz Paulo Arena Filho, continua em tramitação na Corregedoria, com acompanhamento da Corregedoria-Nacional de Justiça e da Corregedoria-Geral Conselho da Justiça Federal (CJF).

Moção aprovada na Câmara dos Deputados reforça a luta contra o capacitismo

Recentemente foi aprovada por unanimidade pela Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados a moção de repúdio às atitudes capacitistas de Paulo Ricardo Arena Filho. No documento, apresentado à Comissão pelo deputado requerente e relator Glauber Braga (PSOL/RJ) e a deputada requerente Sâmia Bomfim (PSOL/SP), os parlamentares repudiam a prática discriminatória contra o servidor com deficiência cometida pelo juiz federal.

Entenda o caso

O Diretor do Foro, juiz Marcio Ferro Catapani, havia decidido que “Considerando os termos da manifestação (9686921) que esclarece que o servidor ingressou, nesta Seção Judiciária, em vaga reservada para pessoa com deficiência, RECONHEÇO que estão presentes os requisitos legais para a instituição da condição especial de trabalho ao servidor, a fim de exercer suas atividades em regime de teletrabalho, sem acréscimo de produtividade”.

Servidores e ativistas anticapacitismo durante o protesto no JEF/Ribeirão. Foto: Gero Rodrigues

A decisão foi encaminhada ao JEF e Paulo Arena, que também acumula a função de juiz-auxiliar da presidência do TRF-3, se contrapôs nos seguintes termos: “Não é possível vencer a demanda neste Juízo sem aumento de produtividade dos servidores e magistrados! Por tal razão, sirvo-me do presente para solicitar a Vossa Excelência, que sejam tomadas as providências devidas para que [nome do servidor] seja colocado à disposição dessa Diretoria do Foro e posteriormente relotado em Vara ou Setor que atenda às suas necessidades especiais”.

Este não é um acontecimento isolado, como destacou a deputada Andréa Werner (PSB), presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), onde aprovou-se por unanimidade a moção de repúdio ao capacitismo (n.º 147/2023). A parlamentar disse que casos como esses são cada vez mais comuns, infelizmente, mas que segue na luta em rechaço às práticas discriminatórias como a vivida por João.

O Sintrajud segue cobrando responsabilização do juiz para que este caso não caia no esquecimento e fique impune.

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