Na mesa sobre disputa orçamentária, construir greve ‘para inserir servidor no orçamento’ permeou debate 


25/05/2024 - Helcio Duarte Filho
No debate sobre Plano de Lutas na Plenária da Fenajufe, a necessidade de construir a mobilização e a greve é ressaltada em muitas falas

A necessidade e a possibilidade de construção de uma greve, ferramenta para fazer com que haja negociação efetiva em torno da reestruturação da carreira, permeou o debate estabelecido na tarde do segundo dia da Plenária da Fenajufe, em Natal (RN), após as exposições dos palestrantes da mesa que tratou da disputa orçamentária.  

“Agora é o momento, servidor no orçamento”, foi uma das palavras de ordem que acompanharam a discussão da pauta, na qual não houve discursos contrários à construçÃo da greve, porém com nítidas diferenças quanto à avaliação da dimensão da necessidade e do ritmo desse processo. 

O debate sobre a disputa orçamentária e o plano de lutas aconteceu após as exposições iniciais dos debatedores da mesa “Trabalhadoras e trabalhadores do PJU e MPU como o centro da democratização do Poder Judiciário: estratégias na disputa pelo orçamento para aprovação do projeto de restruturação da carreira protocolado no STF e PGR”. 

Participaram, como palestrantes, Jean Peres (economista e assessor parlamentar), Edvaldo Dias (matemático e cientista político), Cid Cordeiro (economista e assessor sindical), Roberto Policarpo (coordenador da Fenajufe licenciado), Thiago Queiroz (assessor parlamentar da Fenajufe).

Assistir à mesa sobre disputa orçamentária na Plenária da Fenajufe

‘Construir a greve no dia a dia’

O servidor Henrique Salles, da delegação do Sintrajud e ex-dirigente da entidade, propôs a urgente construção cotidiana da campanha para criar as condições de deflagrar a paralisação. uma “O que precisamos fazer, na minha opinião, não só minha, mas do LutaFenajufe, é construir uma greve pra fechar esse projeto de lei, para que ele começar a andar no Congresso”, disse.

Ponderou, ainda, que é preciso que haja algum espaço deliberativo da categoria, com reuniões regulares, talvez mensais, sugeriu o CDE (Conselho Deliberativo de Entidades da Fenajufe), para dar continuidade a esse processo de mobilização. “A gente precisa ir numa crescente [da mobilização] até construir a greve”, finalizou.

A servidora Denise Carneiro, da coordenação da Fenajufe e do sindicato da Bahia (Sindjufe-BA), recordou que o obstáculo orçamentário não é novidade e esteve presente em todas as conquistas anteriores da categoria. “Alguma vez teve orçamento? A desculpa do orçamento sempre existiu, mas isso não impede a nossa luta, a gente tem que tentar”. 

Também defendeu um forte trabalho nas bases da categoria, em cada estado, para organizar o movimento. “Não existe como conquistar [a reestruturação da carreira] sem greve, mas para ter greve é preciso construí-la”, disse, avaliando a situação atual como muito grave. Numa evidente referência às terceirizações, à precarização e ao processo de destruição de direitos e rebaixamento salarial, alertou para o risco de essa política imposta pelas administrações e pelo governo leve ao fim da própria categoria caso não haja uma forte reação e construção de um movimento paredista.

‘Reagir ou ter a carreira ameaçada’

Ao defender a construção da greve, Fernanda Marques Rosa observou que a conjuntura e os ataques contra os direitos de quem trabalha e aos serviços públicos coloca a categoria num momento decisivo para o seu futuro. “Ou a gente radicaliza na luta ou a gente vai ficar com a nossa carreira cada vez mais precarizada”, disse a servidora da Bahia e que já integrou a base da categoria no TRF-3, em São Paulo. 

Ela mencionou o desmoronamento de carreiras, cujo ingresso é por concurso, que já foram exemplos de bons empregos para gerações anteriores de trabalhadores, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. “É isso que a gente vai querer pra gente? Acho que não, a gente vai ter que lutar pra valer”, disse, ressaltando que esta disputa envolve enfrentar o arcabouço fiscal, o teto de gastos e todas políticas que restringem recursos para o setor público e as políticas sociais, mantidas pelo governo Lula. 

Da coordenação da federação e servidor da Justiça Federal em São Paulo, Fabiano dos Santos assinalou o desafio posto de enfrentar uma política adotada pelas administrações dos tribunais que beneficia magistrados, enquanto penaliza o conjunto dos servidores e servidoras. 

“Eles se apropriam do que poderia ter sido usado para a antecipação [do reajuste salarial], para criar a licença compensatória, um penduricalho permanente”, lamentou. “Vamos à luta e a greve é nosso principal instrumento para isso”, afirmou.

‘Austeridade positivada’

O servidor Tarcísio Ferreira, ex-dirigente do Sintrajud, criticou o modo como as administrações, o Executivo e o Congresso Nacional vêm atuando em relação ao orçamento. “A austeridade não é novidade, o que é novidade é que ela tem se convertido em norma positivada, [inserida] na lei, na Constituição”, disse. 

E prosseguiu: “O orçamento tem evoluído de acordo com a inflação, então o teto é o piso. E nós ficamos vários anos sem reajuste e praticamente sem reposição dos cargos vagos. Então ficou estagnado, mas nem sequer essa margem foi repassada para [os salários]”, resgatou.

Da coordenação da Fenajufe e da base sindical do Sintrajud, Thiago Duarte disse ver dois pontos fundamentais nessa luta. “Para avançar [a questão da carreira], a gente precisa ter e cumprir um calendário de mobilização, sem isso a tendência é a gente ter menos do que a gente deveria ou nem ter nada”, disse. 

Em seguida, citou o segundo aspecto que considera indispensável nessa luta. “O outro ponto necessário é que é preciso ter unidade. Para ter unidade, é preciso ter escuta coletiva, é preciso acolher as diferenças que existem na categoria e seguir o que foi deliberado na Plenária de Belém”, disse. 

Propôs que se denuncie os privilégios da magistratura e se faça a disputa orçamentária para aprovar o projeto. “Eles precisam ter medo, temor da Fenajufe”, disse. Sobre a greve, disse que é uma ferramenta que pode e deve ser utilizada. “Nós reconhecemos a greve como um instrumento importante e que pode e deve ser usada, mas é preciso aquecer a nossa categoria com mobilizações e atividades”.

A servidora aposentada Jacqueline Albuquerque, da categoria em Pernambuco e ex-dirigente da Fenajufe, lembrou que a história da categoria já superou muitos obstáculos para construir a carreira e o plano de cargos e salários. 

“Quando eu entrei no Judiciário, eu recebi complemento de salário mínimo, como auxiliar judiciário. Vários companheiros que há muito tempo estão nessa luta sabem o quanto a gente lutou”, recordou. A servidora defendeu a proposta aprovada em Belém, assim como os demais servidores que se manifestaram, e a possibilidade de construção da greve como uma importante ferramenta de pressão da classe trabalhadora.

Aposentados

Para Madalena Nunes, servidora do PJU no Piauí e ex-dirigente da Fenajufe, sempre foi necessário muita luta para conquistar direitos. “A correlação de forças, que sabemos que não é favorável a nós, nunca foi favorável a nós. No entanto, nós conseguimos garantir direitos. Nós trabalhadores do Judiciário já recebemos [complementação] do salário mínimo”, lembrou.

Assinalou que não houve revogação da reforma trabalhista, que foi o próprio governo Lula que fez o confisco dos salários com a taxação das aposentadorias, na reforma da Previdência de 2002, que foi piorada no governo Bolsonaro, que aumentou essa contribuição. 

Madalena defendeu associar a luta pela reestruturação da carreira à campanha pelo fim da taxação previdenciária. “[Num quadro difícil], é preciso retornar às nossas bases e de forma organizada e unificada e construir a greve e que ela seja muito forte ao ponto de [pautar] o fim do confisco das aposentadorias”, defendeu.

A servidora Marli Perim, que integra a delegação do Sintrajud, também aproveitou o momento para destacar a luta pelo fim da contribuição previdenciária de quem já se aposentou, defendendo a aprovação de uma proposta e emenda constitucional que preve que isso ocorra de forma gradativa. “A [luta contra] a contribuição previdenciária dos aposentados tem a ver com o orçamento e a Fenajufe precisa encampar essa luta dos aposentados. Eu hoje não estou aposentada, mas em breve estarei e sei que têm muitos aposentados aqui”, disse. 

“A categoria está envelhecendo, aqui mesmo penso que a média deve ser 45 anos. Se a gente consegue essa vitória dos inativos não pagarem a contribuição previdenciária é um ganho para os aposentados e para o nosso futuro”, concluiu, alertando, ainda, para a necessidade de preparar a contraposição à ameaça de uma nova ‘reforma’ da Previdência.

‘De sala em sala’

Dirigente da federação, Jailson Laje disse que a primeira decisão a ser tomada é pela construção da greve e, em seguida, ir trabalhando o ritmo dessa construção. “[Investir] na organização dos trabalhadores, passar de sala em sala. A greve vai ser amanhã? Não. Mas precisamos sair daqui com a tarefa de organizar essa luta”, argumentou.  

A servidora Raquel Morel, da base sindical de São Paulo e ex-dirigente do Sintrajud, reforçou a importância de unir a categoria, organizar a luta e saber quem e quais interesses estão sendo enfrentados. “Precisamos de unidade para lutar”. disse, discorrendo sobre o que considera o principal desafio dessa campanha. “Aqui eu vi várias falas sobre como a gente vai conseguir garantir nossos direitos, e todos os nossos direitos estão ligados ao orçamento”, apontou. 

“Infelizmente a gente vê que parte do orçamento público está sendo usado para pagar a dívida pública externa e interna. E não se faz nem uma auditoria sobre essa dúvida, que muitos estudos já demonstraram [as irregularidades] e que já foi paga há muito tempo”, disse, ao criticar a continuidade dessa política no governo Lula e defender a construção do movimento paredista. 

‘Orçamento há’

O destino dado a saldos orçamentários nos tribunais, cujos valores chegaram  a ter elevação nos últimos anos, disse, também foi criticado pela servidora Luciana Carneiro, da coordenação da Fenajufe e da base sindical do Sintrajud. Citou casos de tribunais que, após destinar recursos para pautas de juízes, devolveu recursos ao Tesouro ou os utilizou em compras como pneus suficientes para cinco anos ou frotas de carros para juízes.

“Isso que estou dizendo é uma clara demonstração de que o dinheiro sempre esteve lá”, disse, mencionando, ainda, as recentes mobilizações nos tribunais federal e trabalhista em São Paulo, que levaram à reversão ao menos parcial de cortes no auxílio-saúde. “Digo tudo isso para reforçar que orçamento há, só que esse orçamento está sendo [usado] para eles, para pagar todos os passivos deles, para pagar indenizações. 

“Quando a gente fala de uma reestruturação da nossa carreira, uma sobreposição da nossa tabela, que as pessoas não fiquem paradas, inertes, segurando o queixo e pensando: não tem orçamento. Tem orçamento sim e nós queremos estar incluídos neste orçamento”, conclamou.

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