Às favas até com as aparências, a troca de cargos por votos é explícita. O presidente Michel Temer (PMDB) escancarou a tentativa de compra de votos de deputados federais na busca de ‘segurança’ para votar a reforma da Previdência. O Diário Oficial publicou a exoneração de apadrinhados de deputados que teriam votado contra o Planalto e a favor da manutenção de direitos dos trabalhadores na reforma trabalhista, no final de abril.
Quem não vota de acordo com o que o presidente determina perde seus cargos, é o recado direto e mesmo público que está sendo dado, reconhecido até por integrantes do governo. Não se sabe ainda, porém, a amplitude dessa prática de retaliação imediata adotada pelo Planalto.
Calendário
Diante de uma rejeição cada vez mais evidente e incômoda da população à PEC 287, Temer atua para criar condições que permitam votar a proposta no Plenário da Câmara dos Deputados sem risco de derrota governista. Na primeira versão do calendário pretendido, divulgado no início do ano, a intenção era votá-la até o término de março. A data não resistiu aos dois primeiros meses do ano.
Pouco antes da greve geral do dia 28 de abril, lideranças governistas na Câmara afirmavam que a meta atual era fazê-lo na segunda semana de maio. Agora, porém, isso também estaria praticamente descartado. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), sinaliza com a segunda quinzena do mês como período da pretendida apreciação da matéria.
‘Vida dura’
A rejeição à reforma da Previdência no país ganha dimensões que já não podem mais serem escondidas ou abafadas. A greve geral de 28 de abril demonstrou isso, embora o governo negue. Pesquisa divulgada pelo Datafolha, a primeira do instituto tornada pública que aborda o tema, apontou que 70% dos brasileiros maiores de 16 anos rejeitam globalmente a reforma da Previdência. Mas esse percentual é bem maior quando se trata das questões mais centrais da PEC: 87% discordam do aumento do tempo de contribuição para a aposentadoria integral e da fixação da idade mínima para que se tenha direito ao benefício.
O discurso oficial, no entanto, tenta minimizar a opinião pública. Logo após a greve geral, o líder da Maioria na Câmara, deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES), disse em entrevista ao jornal “El País” que a vontade majoritária na população não será levada em consideração pelo governo. “Temos de dizer à sociedade que a vida é dura e as reformas têm de ser feitas”, afirmou. Para buscar os votos necessários para tal intento, o uso da máquina pública estaria a todo vapor – como se vê na nomeação ou exoneração de apadrinhados de parlamentares.
Como resposta ao crescimento do movimento contrário à reforma, o governo tenta emplacar a ideia de que não haverá recuos e que conseguirá os 308 votos necessários para aprovar a PEC 287 em Plenário. Algo que no momento ainda não tem segurança para fazer, como reconheceu em recente entrevista o próprio presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).
No momento, o Planalto se empenha em votar o relatório na comissão especial que trata do tema, o que diz estar confirmado para esta quarta-feira (3). É algo bem menos complicado, já que o governo tem certo controle sobre os deputados da base aliada na comissão e pretende trocar integrantes dela para colocar gente mais ‘convencida’ da proposta. Não há, porém, certezas com relação a nada nesse momento da tramitação da emenda. Cada vez mais, parece ganhar peso a mobilização e a pressão das ruas para o desfecho, que o governo tenta acelerar, dessa história.