Mulheres Negras denunciam racismo e pedem justiça por Marielle Franco e Luana Barbosa neste 25/7


24/07/2023 - Giselle Pereira
Concentração do ato será na Praça da República às 17h30; protesto vai percorrer ruas do centro histórico a partir das 19h30.

O Coletivo de Mulheres do Sintrajud – Mara Helena dos Reis participará da manifestação que marca o Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha e de Tereza de Benguela, em 25 de julho, por ‘reparação histórica e bem viver’.  A concentração para a mobilização acontece na Praça República, Centro da capital, a partir das 17h30. De lá, após um ato político-cultural, o grupo percorrerá as principais ruas da capital paulista em cortejo precedido por ialorixás e o bloco afro Ilú Obá de Min. A atividade é uma articulação suprapartidária, supra-religiosa, autônoma e independente de governos.

As mulheres denunciarão as diferentes formas de racismo e violências agravadas pelas condições de gênero e raça impostas cotidianamente à população negra, e em paralelo, vão celebrar a data em homenagem a Tereza de Benguela, quilombola, símbolo da luta por liberdade e por um mundo sem exploração. Pedirão justiça por Marielle Franco e Luana Barbosa: mães, negras e lésbicas assassinadas em crimes que permanecem impunes e a todas as mães que têm seus filhos assassinados em chacinas pelas polícias do Estado brasileiro.

À véspera do ato, as novas revelações sobre o caso Marielle Franco demonstram a importância de manter as denúncias e cobranças em evidência nas lutas populares para que os crimes não sejam esquecidos e os mandantes sejam responsabilizados. O ex-PM Élcio Queiroz negociou delação com a Polícia Federal e apontou que a arma usada para matar a vereadora fora extraviada do paiol do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) após um incêndio, noticiou o portal UOL (aqui a íntegra do depoimento).

Todos os anos, diversos coletivos e ativistas que se aglutinam na coletiva Marcha de Mulheres Negras de São Paulo desde 2016 se reúnem para decidir um tema para o Julho das Pretas que dialogue com a conjuntura estadual e nacional. Nesta edição, a 8ª Marcha do 25 de Julho tem como mote ‘Mulheres Negras em marcha por um Brasil com democracia! Sem racismo! Sem violências! Sem anistia para fascistas! Por Marielle Franco e Luana Barbosa! Por nós, por todas nós e pelo bem viver!’

O grupo produz todos os anos um manifesto amplamente divulgado e distribuído durante o ato para a população (confira aqui o deste ano). Nele foi destacado que “inúmeras ações de luta têm sido construídas pelo movimento de mulheres negras porque grande parte da sociedade – incluindo governos e alguns movimentos sociais – ignoram que em função do racismo patriarcal e cisheteronormativo – as mulheres negras e indígenas do Brasil são as que ocupam os mais baixos extratos sociais e se encontram nos territórios invadidos e explorados, nas favelas, nas periferias e nas ruas, recebendo pouca ou nenhuma assistência de governos e do estado”, salienta trecho, que reitera como um desafio da maioria das mulheres negras é viver, não apenas sobreviver.

Entre as diversas pautas, será reafirmada, uma vez mais, a unicidade da luta das mulheres negras, cis e transgêneras, contra as opressões racistas, machistas e LGBTQIA+fóbicas decorrentes da estrutura social capitalista, articulando as perspectivas de gênero, raça e classe.

Ainda de acordo com o manifesto, o Brasil tem desafios fundamentais para o povo negro, sendo alguns deles: garantir refeição diária para mais de 33 milhões de pessoas, sendo quase 80% mulheres e crianças negras; erradicar definitivamente o trabalho escravo; reverter a situação de pobreza extrema, muito presente entre mulheres negras, e que alcançou os piores índices durante o governo anterior, cuja agenda de extrema direita, portanto racista, misógina, Lgtbtfóbica, potencializada por discurso de ódio contra os mais vulneráveis, levou cerca de 10% da nossa população a estar nesta situação; tirar o país do ranking de primeiro lugar de assassinatos de pessoas trans e travestis no mundo; combater o genocídio do povo negro que segue em curso. Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a cada 100 pessoas assassinadas no Brasil em 2021, 78 eram negras. Em 2010, essa proporção era de 66,9%. Além disso, mulheres negras representarem 62% das vítimas de feminicídio.

Ameaça aos territórios indígenas e quilombolas

A atividade de mobilização segue em solidariedade também às mulheres indígenas que lutam contra o Marco Temporal, o Projeto de Lei (PL) 490/2007. A tese ameaça os direitos dos povos indígenas assegurados na Constituição de 1988, particularmente em seu Artigo 231, que garante, categoricamente, os “direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las”. O Marco, que tramita no Senado agora como PL 2.903/2023,  representa uma ameaça histórica às populações indígenas, além disso, coloca em risco a biosfera de diversas regiões, que serão colocadas à disposição de madeireiros, mineradoras e do agronegócio, como denuncia o movimento de mulheres.

Ainda sobre a pauta fundiária e a defesa dos territórios tradicionais, demarcação e titulação, as manifestantes apontarão a política do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que durante sua administração, estagnou a regularização das terras quilombolas, o que gerou invasões e despejos durante a pandemia. Espera-se que, agora, o governo Lula (PT) cumpra com as promessas de campanha e dê continuidade ao processo de demarcação aos territórios quilombolas. De acordo com o Mapa de Conflitos – Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil, comunidades quilombolas em todo o território brasileiro sofreram ameaças e tiveram áreas desmatadas por fazendeiros.

Violência Religiosa

Além de pontuar a luta pela extinção do feminicídio, LGBTfobia, mortalidade materna, violência obstétrica e racismo ambiental também denunciarão o racismo religioso. De acordo com o II Relatório sobre Intolerância Religiosa, organizado com apoio de diversas representações, houve aumento dos casos de intolerância religiosa no país. Terreiros estão sendo incendiados e destruídos por milícias, traficantes e grupos religiosos ligados a essas facções. Em algumas situações, o desaparecimento dos territórios comunais se dá por parte do poder público, como foi o caso do terreiro de Mãe Zana, em Carapicuíba (Grande São Paulo), onde a prefeitura, sem diálogo com as lideranças religiosas, de forma autoritária, demoliu a Casa sob justificativa das obras de canalização do Córrego do Cadaval, em 2022. (saiba mais).

Histórico

O 25 de julho foi instituído no I Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-caribenhas, em 1992, em Santo Domingo, na República Dominicana. No Brasil, desde 2014 a efeméride resgata também a história da primeira mulher a comandar um quilombo – território de resistência à escravização e embriões de organizações sociais de tipo republicano, não centralizados e hierarquizados com base em critérios dinásticos. Tereza de Benguela foi reconhecida na historiografia como líder do Quilombo do Quariterê, atual Estado do Mato Grosso, por ao menos quatro décadas.

TALVEZ VOCÊ GOSTE TAMBÉM