Câmara de São Paulo vota em primeiro turno privatizar Sabesp sob protestos


18/04/2024 - Gisele Pereira e Luciana Araujo
Vereadores da base do prefeito Ricardo Nunes (MDB) apoiaram a proposta do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e votaram em primeiro turno venda do sistema de água e saneamento; movimentos sociais organizam mobilização contra a conclusão da privatização.

 

Foto: Sintaema

Sem diálogo com a população, no início da noite dessa quarta, 17 de abril, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou, em primeiro turno, o Projeto de Lei 163/2024, que trata da privatização da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp).

O PL, de autoria do Executivo, autoriza o município a celebrar contratos ou convênios para a prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário na capital paulista. Foram 36 votos favoráveis à venda do controle da empresa contra 18 contrários, num total de 54 votantes.

Com a aprovação, o projeto segue para a segunda e definitiva fase de votação,  que também só exige maioria simples – ou seja, 28 votos favoráveis de 55 vereadores. Não há uma data para a segunda sessão, mas a expectativa é que ocorra nas próximas semanas, dada a urgência de aprovação do PL pelo prefeito aliado do governador e sua base no legislativo paulistano.

No transcorrer da sessão, representantes de movimentos populares acompanharam os discursos dos vereadores e a votação protestando contra a privatização da Companhia. De forma truculenta, um manifestante chegou a ser retirado pela Guarda Civil Metropolitana (GCM) a pedido do presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil), e foi encaminhado para o 8º Distrito Policial, no bairro Brás. Henrique Oliveira e Silva é diretor do Sindicato dos Urbanitários da Baixada Santista e Vale do Ribeira e trabalhador da Sabesp. Um grupo favorável à privatização também esteve presente na galeria, provocando vereadores e manifestantes.

A CSP-Conlutas, central sindical à qual o Sintrajud é filiado, participou do ato e integra a campanha contra a privatização.

Vereadores da oposição protestaram na tentativa de barrar a votação e as bancadas do PSOL e do PT chegaram a ajuizar ação pedindo liminar para suspender a deliberação, o que não foi deferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. A ação demanda que o assunto só possa ir a voto após todas as audiências públicas que devem regimentalmente ouvir a comunidade. As “audiências públicas que haviam sido convocadas originalmente, mas que não se debruçaram sobre o novo texto substitutivo ora em votação, até o julgamento do mérito”, afirmam os parlamentares.

Imagem: Sintaema

Durante a votação, vereadores contrários à venda da Sabesp também apresentaram o resultado de pesquisa realizada pelo Instituto Quaest, divulgada na segunda-feira (15 de abril). O estudo aponta que 52% dos eleitores de São Paulo são contrários à privatização da Sabesp. O índice de rejeição à privatização da empresa estatal foi ainda maior no plebiscito realizado por organizações sindicais e populares.

Foram totalizados 879.431 votos, dos quais, 99,98% afirmaram ser contra a privatização do saneamento e dos transportes. Essa foi uma iniciativa do Sintaema, metroviários e ferroviários que contou com o apoio de diversos movimentos sociais e populares, o que inclui o Sintrajud, e buscou dialogar com a população sobre a privatização da Sabesp, metrô e CPTM.

Considerada uma das maiores empresas de saneamento do mundo, a venda da Sabesp foi autorizada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) em dezembro de 2023. Agora, o prefeito Ricardo Nunes mobilizou sua base na Câmara Municipal porque a aquisição da empresa só se torna vantajosa ao capital privado se a capital paulista puder contratar os serviços. Pela legislação municipal atual, se a empresa for privatizada a Prefeitura é obrigada a romper o contrato com a Companhia e assumir os serviços. A cidade de São Paulo é responsável por 44% do faturamento da Sabesp.

Movimentos opositores à privatização destacam que as tarifas tendem a aumentar e o serviço deve se tornar ainda mais restrito para a população que não tem condições de pagar mais caro.

Enel e linhas 8 e 9 da CPTM evidenciam efeitos da privatização

O sucateamento do setor de energia elétrica após a privatização, com a multinacional italiana Enel à frente do serviço, ficou evidente com o caos que atingiu São Paulo em novembro de 2023 e os constantes apagões de até mais de sete dias ocorridos neste ano. No ano passado, após temporal, cerca de 100 mil famílias ficaram sem luz. Mais de uma semana após o temporal, a responsável pelo fornecimento de energia, a Enel, não havia conseguido resolver o problema do restabelecimento do serviço.

O descaso revoltou a população, e em vários bairros foram realizados protestos com queima de pneus. A gestão privada também atinge cotidianamente os serviços das linhas 8 e 9 da CPTM (a Companhia Metropolitana de Trens Metropolitanos). Desde que os ramais foram assumidos pela ViaMobilidade (pertencente ao Grupo CCR) foram registrados, em média, três vezes mais problemas do que quando 0os trechos estavam sob gestão estatal. Levantamento do jornal ‘Folha de S.Paulo’ apontou em pouco mais de um ano sob administração privada, 166 falhas.

Protesto contra a privatização 

Foto: reprodução

Na galeria da Câmara, movimentos sociais e sindicatos protestaram contra o projeto, com as palavras de ordem “A água não é sua. Se privatizar, o povo vai para a rua” e “Não, não, não à privatização”. Fora do Palácio Anchieta, sede do legislativo municipal, também ocorreu manifestação durante todo o processo de votação.

Faixas e cartazes classificaram como “criminosa” a tramitação do projeto na Alesp, dado que a privatização foi aprovada em rito de lei ordinária, quando a Constituição do estado prevê, em seu artigo 206, que “águas subterrâneas, reservas estratégicas para o desenvolvimento econômico-social e valiosas para o suprimento de água às populações, deverão ter programa permanente de conservação e proteção contra poluição e superexplotação, com diretrizes em lei”. Os sindicatos e movimentos sociais prometem voltar a se manifestar já na próxima audiência e no segundo turno de votação, ambos ainda sem data.

* Texto atualizado em 18/04/2024 às 17h12, para inclusão do nome do trabalhador da Sabesp detido durante a manifestação

Assista ao debate sobre a privatização da Sabesp

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