2020: o ano em que defendemos a vida e lutamos para deter a ‘boiada’ e a ‘granada’ 


30/12/2020 - Redação
Desafios para 2021 são enormes; mas há esperança graças aos que lutam para preservar direitos, manter e melhorar os serviços públicos e combater as políticas neoliberais e da extrema direita.

Quantas vidas valem não adiar por alguns meses uma eleição? Sim, porque não resta dúvida, passadas algumas semanas, que o processo eleitoral teve impactos sobre a pandemia e o número de óbitos.

Como disse a pneumologista Margareth Dalcolmo, da Fiocruz, em entrevista à ‘Globo News’, é certo que o período eleitoral, com as suas campanhas nas ruas sem máscaras e inevitáveis aglomerações, foi “muito deletério” para o ritmo das contaminações. “Vamos ser francos, todo mundo já percebeu, em seus locais de trabalho, nas suas famílias, que a transmissão aumentou muito”, disse.

Há homens, mulheres e crianças que se foram em consequência disso. Não estamos diante de mortes inevitáveis, como explicou a pesquisadora, mas de consequências de uma opção política.

O posicionamento coletivo do Sindicato e da categoria em relação às eleições reflete o que foi a atuação do Sintrajud em 2020, assim como contra quem lutamos neste período. Servidoras e servidores de todos os tribunais nos pautamos pela defesa da vida, que passa também pela garantia de direitos, de conquistas e da prática solidária entre os trabalhadores. Fizemos isso usando, principalmente, os meios virtuais.

Não nos calamos, não nos calaram

Inevitavelmente, 2020 ficará marcado na história como um ano de dor e perdas decorrentes do vírus que se espalhou pelo mundo e ganhou fortes aliados no Brasil. O primeiro deles o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, referência da necropolítica adotada hoje no país.

Por outro lado, na história de nosso Sindicato ficará registrado que esses foram dias em que a defesa da vida, algo que já fazia parte naturalmente da essência desta entidade, ganhou proporções inéditas na nossa atuação sindical e esteve acima de tudo.

Em tempos nos quais ideologias sombrias e de ódio ganham corpo, é motivo de orgulho para todos nós que tenha sido assim. Remamos, junto com outros setores da classe trabalhadora e da sociedade civil, contra a maré dos que diziam que a economia não podia parar – leia-se, os lucros não podem parar.

Combatemos Bolsonaro e os que se aproveitaram do momento para “passar a boiada”: reduzir salários, retirar direitos, privatizar o que é público e escancarar as portas do meio ambiente para madeireiros, latifundiários e o agronegócio. Não deixamos de denunciar os que, nas esferas estadual e municipal, aplicam políticas que também levaram à perda de direitos e vidas.

Em Brasília, em nome da calamidade, decidiram congelar os nossos salários e restringir os concursos públicos. Enorme contrassenso: difícil pensar noutro momento em que tenha ficado tão evidente a importância não apenas da saúde pública, mas de todos os serviços públicos para atender à população e enfrentar a pandemia e as suas consequências sociais e econômicas.

A crise sanitária deu maior visibilidade para a extensão da pobreza em uma das dez maiores economias do mundo. Quase 80 milhões de pessoas, mais de um terço da população do país, precisou recorrer ao auxílio emergencial de R$ 600,00 – benefício que o governo tentou limitar a valor três vezes inferior.

Escancarada essa realidade, as respostas das autoridades são medidas que tendem a ampliar as desigualdades e não o contrário: privatizações; proposta de mais ‘reforma’ trabalhista e terceirizações; ataques aos serviços públicos e travas para os concursos; entrega do SUS ao setor privado; fim do auxílio emergencial; salário mínimo sem aumento real num ano em que o preço da cesta básica subiu três vezes ou mais do que a inflação oficial.

Não desistiram de reduzir os salários dos servidores, assim como já haviam criado a legislação para que essa redução ocorresse em setores privados. Asfixiar os serviços públicos, rebaixar as carreiras e reduzir os salários do funcionalismo é um projeto do governo de antes da crise sanitária – basta lembrar que está na PEC 186/2019. É parte da aplicação da Emenda Constitucional 95, que congelou os recursos federais para os serviços públicos e as políticas sociais até 2036, enquanto mantém abertas as torneiras do pagamento dos juros das dívidas públicas a banqueiros.

O site do Sintrajud noticiava, em 19 de dezembro de 2019, que a aprovação da lei orçamentária para 2020, com a previsão de redução em R$ 6 bilhões na folha de pagamento dos servidores, já demonstrava o que o governo Bolsonaro e setores da direita no Congresso, liderados por Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretendiam para o setor público.

Nossa luta não para

Apesar de tudo, lutamos. As assembleias se converteram em fórum virtuais. Nas primeiras semanas da pandemia, panelaços e barulhaços ecoaram por ruas de norte a sul do país. O Sindicato fez das lives – 57 já realizadas até agora – um espaço de debate, participação e articulação de nossas lutas. Realizamos uma eleição, a primeira em nossa história, por meios digitais e com expressiva participação, que fortaleceu nossa entidade sindical.

Os atos passaram a ser convocados por meios remotos e, depois, fomos retornando às ruas, sempre atentos às medidas de segurança sanitária. Repudiamos o racismo e a violência genocida contra pobres, pretos e favelados, que aumentaram no período da pandemia sob a omissão ou incentivo dos aparelhos estatais de segurança, assim como o aumento com frequência impune da violência contra as mulheres e o feminicídio. Demos especial atenção ao apoio solidário aos que vivem em situação de vulnerabilidade social.

O Brasil chega ao fim do ano contabilizando quase 200 mil vidas perdidas para a ‘gripezinha’, sem contar a subnotificação. Há, inacreditavelmente, quem comemore e diga que está tudo bem.

É certo que eles seguirão tentando passar “a boiada” e “jogar a granada em nossos bolsos”, como comemorou o ministro Paulo Guedes. A PEC 186 segue tramitando e poderá ser posta em pauta logo no início do ano. Mas é também verdade que a nossa resistência não foi inócua. Conseguimos deter a redução dos salários até aqui. Denunciamos o significado da ‘reforma’ administrativa, que segue paralisada. Combatemos a necropolítica e pautamos sem descanso a defesa da vida. Ao defender as liberdades democráticas e a livre organização sindical, nos contrapomos ao discurso reacionário que prega o arbítrio, a censura e a tortura. Acreditamos e apostamos sempre na força da mobilização da classe trabalhadora.

Há esperança graças a tudo o que os que governam esse país tentam destruir e levar com a “boiada”: ao empenho dos cientistas, dos profissionais das instituições públicas, dos trabalhadores do setor privado que lutam e resistem – dos que apostam na ciência, ajudam a salvar vidas e impulsionam a campanha que exige “vacina para todos” o mais breve possível.

Há sim esperança: porque, apesar dos pesares, muitos seguimos defendendo coletivamente um mundo melhor. Um mundo em que não haja espaço para as desigualdades sociais, para o preconceito e a violência racial e sexista, no qual a vida digna para todos e todas esteja sempre acima de tudo.

Seguimos na luta. A vida não pode parar.

Que tenhamos um 2021 de vida e de conquistas. Vai passar.

Diretoria executiva do Sintrajud

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