Em plena pandemia, com fóruns fechados e a população em quarentena, a Justiça Federal decidiu transformar o JEF Autônomo de Guaratinguetá em JEF Adjunto de São Bernardo do Campo. A mudança pode afetar profundamente a vida de servidores, magistrados e jurisdicionados não apenas nos dois municípios, mas em ambas as regiões onde eles se situam: o Vale do Paraíba e o Grande ABC.
A decisão foi aprovada pelo Conselho da Justiça Federal da 3ª Região no dia 27 de março, numa sessão virtual a que o Sintrajud não teve acesso. O Sindicato chegou a solicitar a retirada de pauta e o adiamento da decisão, mas o requerimento foi negado, assim como o pedido para participar da sessão. O processo agora será submetido ao CJF.
Implantado no final de 2014, o Juizado Especial Federal de Guaratinguetá tem sob sua jurisdição outros 16 municípios e conta com oito servidores (sendo quatro em teletrabalho).
A decisão do Conselho da 3ª Região se baseou em estudo da Assessoria de Desenvolvimento Integrado e Gestão Estratégica (ADEG), vinculada à Presidência do TRF-3. O estudo apontou quatro opções para substituir o JEF de Guaratinguetá na organização da Seção Judiciária de São Paulo: a instalação de uma segunda vara nos Juizados Especiais de São Bernardo do Campo, Santo André ou Americana, ou a criação de mais uma unidade judiciária em São João da Boa Vista.
Foram consideradas a estrutura física de cada uma dessas subseções, as reformas necessárias, a situação dos imóveis (se próprios ou alugados) e a demanda processual.
Embora não tenha participado da sessão virtual do Conselho, o Sintrajud segue acompanhando o processo, até para assegurar que os servidores do JEF Guaratinguetá não sejam removidos compulsoriamente. O Sindicato sempre se manifestou contra a remoção compulsória de servidores, inclusive nas discussões com a Diretoria do Foro sobre a implementação do Programa e-Vara, No entanto, a falta de pessoal e as limitações orçamentárias decorrentes da Emenda 95/2016 (teto de gastos) colocam sobre a categoria o risco permanente de a administração recorrer a esse expediente.
Outra preocupação é com a sobrecarga de trabalho. Um servidor do JEF Guaratinguetá que pediu para não ser identificado lembrou que a Justiça Federal deve receber grande volume de processos previdenciários com o fim da chamada competência delegada.
Até o ano passado, nas comarcas onde não houvesse vara federal as ações previdenciárias poderiam ser ajuizadas na Justiça estadual, por delegação de competência. A Lei 13.876/2019 limitou essa possibilidade para os casos em que a comarca se encontra a mais de 70 quilômetros da vara federal. A mudança entrou em vigor em 1º de janeiro deste ano e foi regulamentada, no âmbito do TRF-3, pela Resolução PRES 322, de dezembro do ano passado.
“Com o quadro atual de servidores, a vara de Guaratinguetá não conseguiria dar um andamento nem razoavelmente célere para o volume de processos que chegará”, alertou o servidor. “A vara tem cerca de 10 mil processos em tramitação e os previdenciários ficaram praticamente todos para o JEF”, afirmou. Ele calcula que dos 17 municípios abrangidos pela subseção, apenas Bananal poderia continuar recorrendo à competência delegada.
Diante dessa situação, o servidor especula que o quadro de pessoal do JEF pode ser incorporado à vara. “Mas não sabemos o que a Diretoria do Foro pretende”, declarou, observando que a decisão de extinguir a unidade foi tomada de forma “repentina e sem transparência”.
Apesar disso, ele declarou que a decisão não chega a surpreender. “O JEF de Guaratinguetá está na mira há cerca de três anos, desde que ficaram prontos os primeiros estudos sobre a extinção dos Juizados”, contou.
O maior problema desses estudos, na avaliação do servidor, é que não calculam bem a quantidade de serviço e podem acabar levando à remoção (com todo o transtorno para a vida pessoal). Depois, a administração acaba descobrindo que a estrutura remanescente não dá conta da demanda. “Só fico mais tranquilo por termos um Sindicato minimamente estruturado como o Sintrajud, porque as administrações vão ‘atropelando’ e fazendo o que querem”, concluiu.
“É um absurdo que esta votação tenha ocorrido num momento como este. O Judiciário está funcionando em regime de plantão extraordinário e esta não é uma matéria urgente. E para piorar, aprova-se uma mudança desse porte e, na mesma sessão, decide-se implantar o novo sistema. A mesma sessão que aprovou a extinção do JEF ratificou o ato da presidência regulamentando o novo sistema, em mais uma demonstração do atropelo ao processo”, ressalta o diretor do Sindicato Tarcisio Ferreira.