Assassinatos de Bruno e Dom escancaram ao mundo emergência indígena no país


17/06/2022 - Luciana Araujo
Execução do indigenista Maxciel Pereira, ocorrida em 2019, continua sem solução; ato neste sábado cobra ação do Estado por fim das violências contra os povos indígenas e aqueles que defendem seus direitos, além de justiça aos mortos e responsabilização de mandantes e executores.

Após 12 dias de angústia internacional, na tarde deste dia 17 de junho a Polícia Federal confirmou a veículos de mídia que parte dos restos mortais localizados no Vale do Javari (Amazonas) são do jornalista inglês Dom Phillips.

Quando este texto foi publicado, ainda não estava oficialmente confirmada a identificação do indigenista Bruno Araújo Pereira e seriam necessários novos exames nos remanescentes humanos encontrados após o pescador ilegal Amarildo da Costa Oliveira, conhecido como ‘Pelado’, ter indicado onde enterrou os dois profissionais. A ação teria sido realizada junto com Oseney da Costa de Oliveira.

Dom e Bruno estavam desaparecidos desde o dia 5 de junho e as famílias sofreram ao longo de todo esse tempo com o descaso do Estado (foi necessária uma decisão judicial, após denúncia de entidades de direitos humanos, para que a União reforçasse as buscas); o desprezo expressado em declarações do presidente da República, que chegou a responsabilizar as vítimas pelo que lhes tivesse acontecido ao entrarem na área onde foram emboscados; a afirmação do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier, que chegou a informar que não fora pedida autorização para expedição realizada por Bruno antes de seu desaparecimento e foi desmascarado com a divulgação do processo autorizativo.

Três anos antes, outro indigenista, Maxciel Pereira, foi emboscado e morto em 6 de setembro de 2019, com dois tiros na nuca, quando andava de moto com a esposa e a filha na cidade de Tabatinga, também no Amazonas. Coordenador de proteção aos povos indígenas na Funai à época em que foi morto, Maxciel já havia denunciado diversas ameaças e pelo menos quatro ataques a sua base de trabalho. Ele atuava em operações de combate ao garimpo, exploração de madeira, caça e pesca ilegais em territórios indígenas. Como Bruno, que pedira licença da Funai para manter o compromisso com a defesa dos povos indígenas e o combate às ações ilegais em territórios dos povos originários, após ter sido exonerado da coordenação de indígenas isolados durante a gestão do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro.

A morte de Maxciel segue impune.

Um ato neste sábado, 18, cobra justiça para Bruno, Dom e Maxciel. O protesto acontece às 11 horas, no vão do Masp, e é convocado pelo Sindsef-SP (sindicato dos servidores do Executivo Federal, entre eles os trabalhadores da Funai). A diretoria do Sintrajud convida a categoria a participar.

Bruno, Dom e Maxciel morreram por defender Amazônia e povos indígenas 

A forma como Bruno e Dom desapareceram e a brutalidade com a qual foram mortos — os suspeitos afirmaram à polícia terem esquartejado e incinerado os corpos antes de enterrá-los em uma vala — evidenciam a emergência que os povos indígenas vêm denunciando nos últimos anos. Infelizmente, sem grandes repercussões em território nacional. No exterior, a postura leniente do governo Bolsonaro com o garimpo e a pesca ilgais, o desmatamento e o tráfico de madeira em terras indígenas, ameaça o ingresso solicitado pelo país na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), por exemplo.

Relatório divulgado pelo CIMI (Conselho Indigenista Missionário) revelou que, em 2020, foram registrados 263 denúncias de invasões, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio em 201 terras indígenas, afetando 145 povos em 19 estados. Em 2019 foram registrados 256 casos similares, e em 2018, 111.

Em abril deste ano, a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) denunciou que uma menina yanomami de 12 anos sofreu estupro coletivo e foi morta na comunidade Aracaçá, em Amajarí, no norte de Roraima. Dias depois a aldeia foi incendiada. A ministra da Mulher, da Família é Direitos Humanos, Damares Alves, disse lamentar o episódio da criança, e fez questão de completar: “mas acontece todo dia”. A pasta comandada por Damares é responsável por evitar que seja assim.

Outro relatório, divulgado pela associações indígenas Hutukara e Wanasseduume Ye’kwana, aponta que, apesar de histórica, a violência contra os povos originários, “sua escala e intensidade cresceram de maneira impressionante nos últimos cinco anos.” O documento traz relatos de aliciamento, exploração e violências sexuais e aumento dos assassinatos.

A Univaja e a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) há tempos também denunciam a escalada da violência sob o governo que prometeu e vem cumprindo não demarcar um centímetro de terra para indígenas e se refere aos povos quilombolas como animais que seriam pesados em arrobas.

Durante o governo Bolsonaro, o desmatamento na região amazônica avançou quase 40%. Só em 2021 foram devastados 10.362 quilômetros quadrados da floresta, aumento de 29% em relação ao ano anterior.

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