SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO
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JJ - Edição 234 - 13/11/2005 - Página 8

COMBATE AO RACISMO


Lula não combate discriminação racial, afirmam ativistas

Ativistas dizem que no 20 de novembro deste ano, Dia da
Consciência Negra, não houve o que comemorar
* Da política educacional à não reabilitação de João Candido, críticas aos 3 anos de governo

Luis Carlos: sem mudanças

Por Hélcio Duarte Filho

As desigualdades relacionadas ao preconceito racial no país não mudaram após três anos de governo Lula, que criou o ministério para igualdade racial e tenta aprovar um estatuto anti-racismo. É o que avaliam ativistas do movimento e sindicalistas entrevistados por este jornal que não integram organizações que apóiam o governo.
Funcionário da Fundação Nacional de Saúde, Antonio Carlos Lourenço – que atua no movimento negro – diz que as resoluções das conferências oficiais ‘pela promoção da igualdade racial’, das quais participou, não foram aplicadas.
Para Elias José, do MNU (Movimento Negro Unificado), as reivindicações do setor não foram atendidas. “Não tem como implementar quando se está submetido ao FMI [Fundo Monetário Internacional]”, constata. Ele diz que nem questões que considerava mais simples foram resolvidas, como o acesso dos negros às universidades públicas por meio de cotas. A reivindicação, afirma, foi usada pelo Planalto para injetar dinheiro nas universidades privadas, com isenções fiscais em troca de bolsas.
Para Luis Carlos Ramos, diretor do Sintrajud, as expectativas com o governo Lula também não se concretizaram na área racial. O único avanço que aponta é a indicação, pela primeira vez, de um negro para o Supremo Tribunal Federal. “Os negros nunca tiveram nada, nunca tiveram voz neste país, sempre subalternos, sempre em segundo plano”, critica. “Mas na essência foi só isso [a indicação do ministro], não teve mais nada”, avalia. Para ele, os mais de 300 anos de escravidão jamais foram reparados. “Saímos com uma mão na frente e outra atrás: continuamos nas favelas, continuamos debaixo das pontes”
Também diretor do Sindicato, Eliseu Trindade tem opinião parecida e considera incompatível cortar investimentos públicos para pagar os juros das dívidas algo e, ao mesmo tempo, traçar qualquer política efetiva de inclusão social (ver texto à pág. 2).

Revolta da Chibata segue ‘proibida’
Não teria havido avanço nem em aspectos mais simbólicos, como a reabilitação de João Cândido (1880-1969), um dos líderes da Revolta da Chibata. O episódio, quase ignorado nas escolas, ocorreu no Rio em 1910: marinheiros insurgiram-se contra os oficiais e o governo, dominaram navios de guerra e exigiram o fim dos castigos físicos na Marinha.
Projeto de lei que anistia João Cândido (1880 - 1969), aprovado nas comissões do Senado e da Câmara, está parado no Congresso. A Marinha não revogou o ato de expulsão de João Candido, conhecido como ‘Almirante Negro’. “A Marinha hoje não fala nada sobre isso”, diz Porfílio Costa, do Movimento Democrático pela Anistia e Cidadania (Modac). Ele vê “resistência por parte da sociedade” em reconhecer João Cândido como herói nacional.


“O sonho dele era simplesmente
ser jogador de futebol.”

Mãe que teve filho de 11 anos, junto com outros quatro
jovens negros, morto pela polícia luta para que seja feita justiça

Fernanda, mãe de Wellington, 11 anos, morto pela polícia, durante ato por justiça

O desejo de justiça é o que faz a manicure Fernanda Antônio de Oliveira, aos 28 anos, ter forças para, apesar da dor, liderar um movimento contra a impunidade e a violência policial. Na tarde de 3 de dezembro, policiais militares mataram a tiros cinco jovens no morro do Estado, comunidade de Niterói, a cerca de 15 quilômetros do Rio. Todos negros.
Entre os mortos, duas crianças de 11 e 12 anos, Wellington Santiago Oliveira Lima e Luciano Rocha Tavares, respectivamente. A perícia no local mostrou que não houve troca de tiros, como alegavam os policiais, e que há evidências de que os jovens foram executados.
Fernanda é mãe de Wellington, que aos 11 anos estudava, participava de um grupo cultural que se reunia na Universidade Federal Fluminense e treinava futebol na escolinha do Gérson, o ex-craque da seleção de 1970. “O sonho dele era simplesmente ser jogador de futebol”, diz Fernanda. “Era brincalhão, elétrico, queria fazer tudo ao mesmo tempo, cheio de sonhos”, conta Daniel Vidal, professor de música de Wellington e de outro menino, de 13 anos, que também foi atingido pelos policiais (que acharam que ele estava morto) e encontra-se internado em um hospital sob risco de ter a perna amputada.
Dos doze policiais que estavam no morro no dia da morte dos meninos, quatro estão presos preventivamente. São os que estão sendo acusados de participar diretamente das mortes. O comandante do batalhão a que pertencem, porém, segue alegando que houve troca de tiros e que todos são traficantes.
A comunidade está emocionada com o caso e entidades ligadas aos direitos humanos e sindicatos apóiam o movimento por justiça. “Eu tenho certeza que ainda vai ser feita justiça para essas crianças que foram mortas cruelmente”, diz Fernanda.

HDF