SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO
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JJ - Edição 160 - 10/11/2003 - Página 6

TRÊS JUÍZES NA MIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICOM


Escândalo reabre debate sobre papel do Judiciário

Sindicalistas defendem apuração rigorosa de todas denúncias * Diretor da Fenajufe diz que ausência do setor público até em áreas sociais fomenta corrupção e reduz limites entre público e privado

Policiais federais recolhem computadores de envolvidos no caso

Por Luciana Araujo

Está nas mãos do Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região a decisão de aceitar ou não as denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal contra três juízes lotados no Fórum Criminal da JF/São Paulo.
Para o diretor do Sintrajud e da federação nacional (Fenajufe) José Carlos Sanches, “o TRF tem que aplicar a lei, até porque, no caso do Rocha Mattos, ele é reincidente”. O juiz João Carlos da Rocha Mattos foi afastado de suas funções por três anos – de 1993 a 1996 – após ter absolvido o governador Oréstes Quércia em processo sobre a compra de equipamentos superfaturados de Israel. “E o TRF em São Paulo tem que tratar isso com muito carinho por já ter outros dois desembargadores afastados por suspeitas de envolvimentos em atos ilícitos”, diz o dirigente sindical.
Na denúncia, os procuradores afirmam que “todos os acusados integrantes da quadrilha trocam ‘favores’ entre si, utilizando-se de suas funções públicas ou de suas atividades privadas visando a eficácia das ações criminosas”.
Démerson Dias, também diretor do Sintrajud e da Fenajufe, destaca que “a corrupção tem pólos ativo e passivo e, se existe, é porque se imiscuiu em todos os poderes e na relação público-privado”. Para ele, no Judiciário não é diferente. “Esse limite entre público e privado está cada vez mais tênue e as pessoas começam a encarar o público como extensão do privado. E, infelizmente a magistratura é o poder personificado. Isso contribui para que a corrupção se instale”, analisa.

Juiz acusado inocentou Nicolau

Na opinião da diretoria do sindicato, a apuração rigorosa e transparente das denúncias é fundamental para resgatar a confiança da sociedade no Judiciário. Denúncias contra magistrados pululam em todo o país, com suspeitas de formação de quadrilha, falsidade ideológica, peculato, prevaricação, corrupção passiva e outros crimes.
Particularmente no Estado de São Paulo, as decisões que beneficiaram o ex-presidente do TRT da 2ª Região, Nicolau dos Santos Neto, no caso do desvio de 169 milhões de reais das obras do fórum trabalhista da Barra Funda, são até hoje questionadas pelo Ministério Público. Nicolau foi inocentado em quatro processos e condenado apenas por tráfico de influência. O juiz Cazem Mazloum, um dos denunciados no caso da “Operação Anaconda”, avaliou à época que não houve corrupção, formação de quadrilha ou qualquer outra das graves acusações. Além de dar uma pena mais branda que o reivindicado pelo Ministério Público no processo, inocentou o ex-senador Luiz Estevão e os empresários que participaram do “Esquema Incal” (empreiteira de Luiz Estevão).
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Maurício Côrreia, embora tenha defendido apuração a fundo das denúncias, ao mesmo tempo avalia que os juízes devem permanecer nos cargos que ocupam durante as investigações preliminares. O Ministério Público, no entanto, pediu o afastamento dos acusados, a abertura de procedimento administrativo e a prisão preventiva de Rocha Mattos. O Órgão Especial do TRF-3, em reuniâo extraordinária no último dia 7, determinou a prisão de Mattos e seu afastamento da funções. mas todos os envolvidos no caso têm 15 dias, contados a partir da citação oficial, para apresentar defesa. A próxima reunião do Órgão Especial está marcada para 13 de novembro.
Nesse meio tempo, o juiz Rocha Mattos, por exemplo, já explicitou à imprensa intenção de solicitar sua aposentadoria. Caso o pedido seja aceito pelo Tribunal, pelo menos o procedimento administrativo contra o juiz perderá efeito jurídico, tendo em vista que a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) determina a extinção de quaisquer procedimentos disciplinares após a passagem do juiz para a inatividade.

Para sindicalista, governo manobra ao falar em “reforma”

Após a divulgação do escândalo, o super-ministro José Dirceu (Casa Civil) reabriu a artilharia para aceleração da “reforma” do Judiciário que tramita no Congresso Nacional. O diretor da Fenajufe Caio Teixeira questiona a manobra do governo. “É necessário cautela quando esses casos ganham uma forte exposição na mídia. A última vez que isso aconteceu foi com o ‘Lalau’ e claramente havia uma pressão do senador ACM para aprovar uma reforma do Judiciário de interesse do capital”. diz.
Caio ressalta que “toda denúncia de corrupção deve ser apurada severamente, mas que a reforma do Judiciário proposta não traz nenhum mecanismo novo de apuração e punição dessas situações”.
Para Démerson Dias, “o fortalecimento do Estado a serviço do bem público” é a melhor forma de combater a corrupção. “Na medida que o Estado se ausenta das áreas sociais em geral, abre espaço para que a relação entre o público e o social seja pautada pelo lado corporativo e privado”, afirma.