SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO
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JJ - Edição 160 - 10/11/2003 - Página 7

Juristas pedem impeachment de Nelson Jobim

Declarações do próprio ministro, reconhecendo que fraudou a Constituição de 1988, movem o pedido encaminhado ao conselho da OAB

FHC, Maurício Corrêa e Jobim, na posse deste último no TSE

Doze renomados juristas entregaram à Ordem dos Advogados do Brasil requerimento para que ela encaminhe pedido de impeachment do ministro Nelson Jobim ao Supremo Tribunal Federal. Assinam o documento, entre outros, Dalmo Dallari, Fábio Konder Comparato e Celso Antonio Bandeira de Mello.
A iniciativa é movida pelas recentes revelações de Jobim, vice-presidente do STF, que disse ter participado, em 1988, de grupo de deputados da Comissão de Redação da Câmara que incluiu itens na Constituição Federal sem que eles tivessem sido votados pelo plenário. À época, Jobim era deputado federal constituinte. Nem todos os itens incluídos foram revelados, mas sabe-se que dois deles tratam da independência entre os três poderes e da “medida provisória”.
Dalmo Dallari diz que a intenção não é puni-lo pelo que fez há 15 anos. “Nós queremos que ele seja afastado porque ele próprio confessou que não tem condições morais para ser juiz do Supremo”, afirma. Para Dallari, Jobim não atende mais à exigência constitucional de “reputação ilibada”, prevista para quem integra o STF. Nomeado para o STF pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, em abril de 2004 Jobim deve assumir a presidência do órgão máximo do Judiciário.
O pedido de impeachment não agradou às entidades de magistrados. A Ajufe se diz preocupada com a “instabilidade jurídica” que o caso pode provocar. “O tratamento do episódio deveria se conter no ambiente próprio da crítica acadêmica e da história nacional”, diz trecho da nota da Associação dos Juízes Federais.


ENTREVISTA COM DALMO DALLARI


Jobim não tem condições morais para ficar no STF, diz Dallari

Dalmo Dallari: indignado

Um dos 12 juristas que assinam pedido de impeachment, Dalmo Dallari diz que o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Nelson Jobim, reconheceu ser mentiroso e que o Judiciário deveria tomar a iniciativa de corrigir suas próprias falhas. Leia, a seguir, trechos da entrevista concedida a Luiz Carlos Máximo, da equipe do Jornal do Judiciário.

Jornal do Judiciário - Porque o sr. está pedindo o impeachment do vice-presidente do STF, ministro Nelson Jobim?
Dalmo Dallari - Nós, um grupo de advogados, discutimos o assunto e resolvemos pedir o impeachment porque achamos uma indignidade o comportamento do ministro. Não o comportamento há 15 anos atrás, mas o comportamento agora. Porque pra alguém pode parecer estranho que a gente esteja querendo, agora, punir o ministro pelo que ele fez há 15 anos. Não é isso. Nós queremos que ele seja afastado do Supremo porque ele próprio confessou que não tem condições morais pra ser juiz do Supremo. A Constituição exige do juiz do Supremo Tribunal uma reputação ilibada. Um homem que vem a público e quase assim em tom de desafio, de molecagem e diz “olha eu cometi fraude num caso muito importante que era lá da constituinte...”, e diz isso com ar de brincadeira como se fosse uma molecagem. Se ele está dizendo a verdade agora, ele revela uma indignidade, ele é um mentiroso confesso, e se ele está mentindo agora, é mentiroso também. É um homem que não tem condições morais pra permanecer no Supremo Tribunal. Nós nos lembramos de um aspecto técnico que é fundamental também. Quando um processo é submetido a julgamento, porque são muitos os processos, há um juiz que lê, um relator. Então muitos julgamentos serão feitos com base no que o ministro Jobim disser o que está contido nos autos, mas como ele mesmo confessa que é um fraudador ele poderá mentir. Poderá dizer aos colegas coisas que não correspondem ao que estão nos autos. Então, de qualquer maneira ele agora está se revelando inidôneo. No mesmo dia em que ele confessou ser um fraudador ele deveria ter pedido a sua exoneração”.

O pedido de impeachment é somente uma reação de indignação ou é uma possibilidade real?
Antes de mais nada existe uma demonstração de inconformidade, uma reação indignada. A nossa capacidade de indignação está inteira. Nós não nos acostumamos com a corrupção, com a fraude, com a mentira. Continuamos exigindo seriedade e honestidade. Este é o primeiro passo. O segundo é dar a nossa iniciativa um valor de denúncia. Para que as pessoas que agem desse modo não continuem circulando por aí como grandes personagens. Quanto ao aspecto prático de ser possível ou não obter o afastamento do ministro, realmente não será fácil. Mas deve ser tentado.

O que motivou o ministro a dar esse tipo de declaração? Seria uma estratégia de marketing para o livro que acabou de escrever sobre a constituinte de 88?
Existem várias hipóteses. Uma delas que acho que é mais profunda é que o ministro continua sendo um auxiliar de Fernando Henrique Cardoso. Porque na verdade ele sempre se comportou como um auxiliar de FHC, e eu mesmo já escrevi mais de uma vez que ele era o verdadeiro líder do governo no Supremo. Poucos dias antes desse escândalo, FHC publicou um artigo no jornal “Estado de São Paulo” propondo uma mini-constituinte, a revogação da Constituição. E e vejo que o ministro Jobim continua sendo um auxiliar e está trabalhando no sentido de desmoralizar a Constituição.

Como o sr. analisa a posição da Ajufe (Associação dos Juízes da Justiça Federal) contrária ao pedido?
Acho que está mais do que na hora de os juízes brasileiros perceberem que essa atitude de querer tapar o sol com a peneira, de querer esconder as suas falhas, é mais negativa do que positiva. Na verdade o Judiciário brasileiro sempre teve muito medo de ser exposto, muito medo de que alguém lhe dissesse que ele não é perfeito. E agora há tantas coisas acontecendo, tantas falhas sendo reveladas, que o Judiciário deveria tomar a dianteira no sentido de corrigir essas falhas.