SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO
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JJ - Edição 76 - 26/11/2001 - Página 2

Idéias

Uma página para a livre expressão de opinião

A ordem mundial e vô Ernesto

Claudio Klein

Em outubro visitei no Paraná meu avô Ernesto, que completou 83 anos no dia 20 daquele mês. Filho de imigrante alemão, perdeu seus pais antes dos 5 anos. Criado por padrinhos, trabalhou desde menino. Nunca foi à escola. Manuseia bem os números, mas não sabe ler ou escrever.
Homem da terra, possui a sabedoria de quem é simples. Não faz idéia do que seja uma página na Web, globalização ou neoliberalismo. Sabe da época de plantar e colher o milho, o feijão, o trigo, as fases da lua e que o Brasil nunca deixou de ser explorado "pelo estrangeiro".
Ao 18 anos, deixou o litoral e fixou-se no planalto central de Santa Catarina, onde se casou com minha avó Lucia. Com seu trabalho, cultivou a terra "criando de tudo um pouco", costume entre pequenos proprietários do sul.
Outro dia, lendo o jornal, lembrei-me de uma "prosa" que tive com avô Ernesto. Pelos idos da década de 50, diz que, aborrecido com o preço do pó de café, que segundo ele vinha da Argentina, resolveu arriscar e plantar algumas mudas nas encostas do rio Canoas: "já pensou, tinha que vender um saco de feijão para poder comprar 500g de pó de café!!". Passou a produzir seu café. Nunca confirmei se o café vinha mesmo da Argentina (que não produz), sei que é hábito nos rincões afastados do sul substituir o café pela cevada, cultivada em regiões de clima ameno.
A Alemanha hoje, apesar de um clima propício ao cultivo da cevada, é o país que mais exporta café. Compra uma saca de 60 kg a U$ 35,00 na bolsa de Londrina e vende embalada para o resto do mundo com lucro de 10.000%. Com 1 kg de café em grão pode-se fazer mais de 50 cafezinhos. Em New York, nas extintas cafeterias do World Trade Center, o expresso era vendido por U$ 3,00. Nesta proporção, a mesma saca saída dos abarrotados estoques do Brasil pode render até 10 mil dólares. Um lucro de mais de 30.000%.
Um negócio da Alemanha.
Não perguntei, mas acho que meu avô Ernesto, que é analfabeto mas entende de números, diria que a única forma de a Alemanha continuar ganhando 30.000% de lucro dos brasileiros é continuar pagando U$ 35,00 ou menos pelas sacas de café que produzimos aqui.
Na nova ordem, o papel dos países periféricos é fornecer matéria-prima barata. Voltamos ao puro colonialismo da época mercantil, com a diferença que não há mais índios para receber os colonizadores.
Está em jogo a sobrevivência do capitalismo, que mantém a sua sobrevida ao manter e ampliar as taxas de lucros nos países centrais.
O Brasil sempre foi um país colônia, que exporta mercadorias básicas. Cerca de 65% do que vendemos são commodities, vendidos a preço baixo em grandes quantidades. Assim como no século passado, nossa economia vive de ciclos - açúcar, borracha, café, etc. Estamos no ciclo da soja, do frango, da celulose e da laranja. O Brasil vem consumindo-se, sugando as riquezas do solo e subsolo e aumentando a produção. Ano passado, as exportações aumentaram 31,4%. Os preços caíram 8%. A balança comercial continua deficitária.
A 4ª Conferência da OMC, ocorrida há pouco no Quatar, nada mais tenta fazer do que or ganizar a "nova ordem".
Cabe ao sul vender saca de café em grãos, ao norte o pó embalado a vácuo; ao sul vender couro, ao norte sapatos; ao sul laranja, ao norte suco; ao sul cascalho de ferro, alumínio, ao norte automóveis, aviões e computadores; ao sul ervas, ao norte remédios; ao sul miséria, ao norte ostentação; ao sul ressentimento, ao norte segregação; ao sul camicases, ao norte destruição.
Não acho que a solução para o neocolonialismo em andamento seja a encontrada pelo avô Ernesto, que plantou e produziu seu pó de café.
A solução passa por ações coletivas, que possam colocar o povo, unido e determinado a mudar, nas ruas. Desde 99, quando o povo parou Seatlle durante a 3ª Conferência da OMC, os "donos do mundo" não tiveram mais tréguas. Sempre que se reuniram enfrentaram milhares de manifestantes repudiando a nova ordem mundial. A solução está em colocarmos para fora do poder pessoas e organizações nocivas à raça humana, como FHC, Bush e o FMI.

Claudio Klein servidor do TRF, e diretor do Sintrajud.


Charge do Kacio, publicada no Correio Brasiliense


O câncer do Judiciário

Espinho na Garganta

Câncer é um mal que não tem cura e que vai degenerando as células do organismo, mas que, dependendo do caso, pode ser superado ou não.
Infelizmente, no Judiciário existe esse mal, que vai destruindo os seres humanos pelo seu lado mais frágil, o seu lado psicológico, a sua auto-estima, a sua capacidade laboral, a sua saúde. Mas o pior de tudo é que esse câncer prolifera por debaixo dos panos, sem transparência e sem moral. Pega os servidores de surpresa e os transforma em sujeitos dependentes de uma ajuda médica para continuar no seu trabalho, o que inclui medicações, terapias... E então, com sua capacidade profissional prejudicada, vem a queda de seu desempenho. A manobra é tão nojenta, é tão desprezível, que abala a todos que estão solidários ao colega prejudicado, e o câncer vai continuando a destruir as células de um Poder tão sem poder, porque a contaminação certamente conta com a participação de uma chefia insegura e mal intencionada, que está com as cartas na mão nos manipulando, e se esquece que a cúpula nada produzirá sem a nossa participação.
Aí, eu me pergunto: que Justiça é essa que acaba com as pessoas , que, por conseguinte, destrói famílias também, pois desestrutura a todos que estão ao redor?

"No Judiciário, esse mal vai destruindo os seres humanos pelo seu lado mais frágil, a sua auto-estima"

Para acabar com isso, nós servidores, que estamos fora ou dentro desse grupo de risco, devemos nos unir e somar a outras lutas como 11,98%, PCS, arrastão, redução de jornada, fim do neoliberalismo e a preservação de nossos lugares nos setores em que trabalhamos.
Temos que começar a brigar por nossos direitos e contra a invasão de estagiários com ou sem remuneração, que nos dão a sensação de estar vendo lá adiante a terceirização de nossos serviços, que também é um câncer, com a diferença de estar chegando mais devagar, dissimulado, para acabar com a nossa categoria.
Sugiro então fazermos um ato de protesto na nossa base a cada rasteira que nossos colegas levarem. Pois hoje são eles e amanhã poderá ser cada um de nós.
Companheiros, mesmo que nos julguem uma ralé, juntos poderemos vencer essa minoria escrota que contamina nosso Judiciário e desrespeita a nossa pessoa. Somos tão ou mais importantes do que eles no todo.

Espinho na Garganta é pseudônimo de técnico judiciário da Justiça Federal de SP.


FRASES


DA GREVE-1

"Não vamos recuar da greve por que o governo está aplicando um pacote da ditadura militar sobre nós"

Paulo Amnérico
servidor do INSS, defendendo a greve, que seria vitoriosa, apesar do pacote antigreve e dos salários cortados.


DA GREVE-2

"O país vive a maior insegurança jurídica da história"

Antônio Carlos Viana Santos
presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), sobre o desrespeito do governo às decisões do STJ que mandam pagar os salários de grevistas


DE ONTEM

"Sem música a vida seria um erro"

Nietzsche