Na sexta-feira, 20 de março, operadores de telemarketing da Almaviva do Brasil paralisaram suas atividades e organizaram um protesto diante da unidade da empresa em São Paulo, chegando a ocupar uma das faixas da rua da Consolação, na região da Paulista.
“El, el, el, queremos álcool gel!”; “Veja não, álcool gel é solução!”, dizia o coro dos trabalhadores. Até então, o Brasil contabilizava 647 casos de covid-19, com sete mortes. Uma semana depois, o número de casos passou de 3.400, com 92 mortes.
Segundo os operadores, a empresa não fornece os insumos para higienização recomendados pelas autoridades de saúde, sendo que quatro casos suspeitos já haviam sido relatados entre os funcionários. Eles também denunciavam a proximidade entre os postos de atendimento, o que contraria as orientações do Ministério da Saúde para uma distância mínima de 1 metro entre as pessoas.
Com 37 mil funcionários no país, a Almaviva é uma das maiores empresas do ramo de telemarketing no Brasil e tem sede na Itália, um dos epicentros da pandemia. Após protestos dos empregados, sua unidade na cidade italiana de Palermo foi fechada e os trabalhadores passaram a operar em home office.
Protestos semelhantes, com atos e paralisações, foram registrados em outros call centers brasileiros. Operadores de telemarketing das empresas Atento e Teletech disseram à reportagem da BBC News Brasil que, apesar da pandemia e das medidas preventivas decretadas por vários governos, continuavam a trabalhar com pouco distanciamento dos colegas, em espaços sem ventilação com até 400 trabalhadores.
A mobilização aconteceu à margem dos sindicatos. O Sintratel (filiado à UGT) e o Sintetel limitaram-se a anunciar que estavam requerendo das empresas “a redução do fluxo de trabalhadores(as) nas operações, possibilitando, assim, o distanciamento mínimo exigido”, além de cobrar higienização dos ambientes de trabalho, transporte fretado para os trabalhadores, flexibilização da jornada, férias coletivas e home office.
Ambas as entidades também fizeram questão de lembrar que o setor de telemarketing foi incluído entre as atividades essenciais definidas no decreto do governador João Doria (PSDB) que determinou a quarentena em todo o estado.
A Almaviva enfrentou maior resistência em Sergipe, onde o Sindimarketing Sergipe (filiado à CSP-Conlutas) entrou com ação judicial e chegou a fechar a empresa. Após recorrer da decisão, entretanto, o grupo italiano conseguiu autorização para o retorno das atividades com 30% do efetivo, o que coloca 1.600 trabalhadores sergipanos em risco.
Nos Correios, depois que um trabalhador do Centro de Distribuição Domiciliária (CDD) da Vila Maria (zona norte de São Paulo) foi diagnosticado com a covid-19, a Federação Interestadual dos Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras dos Correios (Findect) apelou à representação da Organização Mundial da Saúde (OMS) no Brasil e à Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).
Em documento de 17 páginas enviado a ambas as organizações, a Findect (filiada à CGT) relata que os Correios não estão fornecendo equipamentos de proteção individual (EPI’s), álcool em gel 70%, máscaras, luvas e condições básicas de higiene aos funcionários.
“Pode haver dezenas de casos silenciosos nos Correios, mas sua direção continua obrigando o pessoal a trabalhar normalmente sem fornecer individualmente os itens de higiene e segurança imprescindíveis para prevenção”, diz a Findect, em nota publicada no site da entidade.
A Federação solicita ainda que a estatal adote o home office e o revezamento de turno e que dispense funcionários que fazem parte dos grupos de risco (os que têm mais de 60 anos e os hipertensos, cardíacos, asmáticos, doentes renais e fumantes com deficiência respiratória e quadro de imunodeficiência).
Em nota divulgada na última quarta-feira, 25, os Correios afirmaram que estão seguindo a determinação da Presidência da República, segundo a qual os serviços postais são considerados essenciais.
A empresa alegou ter adotado medidas, como a orientação aos empregados quanto aos cuidados básicos de higiene, a disponibilização de álcool gel 70% em locais próximos às estações de trabalho e a intensificação de procedimentos de higienização e limpeza do ambiente e equipamentos. Sobre a distribuição de EPIs, luvas ou máscaras, a empresa não se pronunciou.
Empregados que fazem parte dos grupos de risco estão fazendo trabalho remoto, segundo a nota dos Correios. No entanto, a empresa anunciou que vai suspender pagamentos de adicionais, benefícios e até salários desses funcionários e dos afastados pela pandemia.
Contra essa medida se insurgiu a Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos e Similares (Fentect), ligada à CUT. Em resposta ao anúncio dos Correios, a Fentect ingressou com ação na 15° Vara de Trabalho de Brasília para garantir o salário integral dos trabalhadores.
“Nós estamos fazendo uma campanha e conseguimos afastar todas as pessoas do grupo de risco, as funcionárias que são mães e que têm pais em grupos de risco, mas a empresa está tentando forçar o retorno deles. Além disso não estão garantidos os equipamentos de segurança necessários, nem para os trabalhos essenciais. Não tem luvas, não tem álcool gel, e em alguns lugares não há nem sabão e papel toalha para higienizar as mãos. Temos vários companheiros com suspeita de contaminação e um colega faleceu em decorrência do coronavírus, ele era atendente comercial na agência de São Carlos. Nós já estamos discutindo a necessidade de uma greve”, informa Ezequiel Filho, integrante da coordenação setorial dos trabalhadores dos Correios da CSP-Conlutas e da oposição à diretoria do Sindicato daquela categoria em São Paulo.
O Sindicato dos Metroviários de São Paulo obteve liminar para o afastamento dos trabalhadores dos grupos de risco.
Eles não poderão exercer atividades nas estações, bilheterias e plataformas. Aos metroviários e terceirizados que permanecerem nesses postos deverá ser garantido o fornecimento de EPI´s, além de álcool gel e luvas.
O Sindicato defende a realização de plano de contingência, com redução de fluxo de passageiros, trens e fechamento de estações de menor porte. Há uma semana, a entidade enviou carta ao governador, ao secretário estadual de Transportes e à Assembleia Legislativa pedindo a suspensão de toda a produção e dos serviços não essenciais.
Os ferroviários conseguiram liminar com o mesmo teor para proteger os empregados e terceirizados da CPTM, numa iniciativa do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana. Apesar da quarentena, no começo da semana o Sindicato ainda notava algumas estações e trens cheios.
Em São José dos Campos, para garantir o isolamento social dos trabalhadores recomendado pelas autoridades de saúde, o Sindicato dos Metalúrgicos partiu para a greve, decretada no último domingo, 22 de março.
Nesta sexta-feira (27), a Ericsson anunciou licença remunerada para os funcionários, em regime de revezamento, depois de tentar na Justiça barrar as atividades organizadas pelo Sindicato. Com isso, a paralisação já alcançou 82% da categoria na região.
“Esta é uma greve em defesa da vida dos trabalhadores; ficar dentro da fábrica representa um risco para todos”, afirma o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, Weller Gonçalves. A entidade aponta que na Itália a região mais atingida pela pandemia é a que concentra o cinturão industrial metalúrgico. O Sindicato é filiado à CSP-Conlutas.
O Sintrajud está convocando os servidores do Judiciário Federal em São Paulo a subscreverem uma carta aos parlamentares contra as propostas de redução de salários e por medidas efetivas contra a covid-19. “Todos os serviços que não são essenciais ao atendimento em saúde, assistência social e preservação de liberdade devem ser imediatamente suspensos, pelo bem da coletividade”, afirma a carta.
O texto também exige a revogação imediata e integral da MP 927/2020, que abre brecha para o corte de salários no setor privado por quatro meses, além da revogação da Emenda 95 (teto de gastos) e da suspensão da tramitação das Propostas de Emendas Constitucionais que compõem o Plano ‘Mais Brasil’, entre outros projetos. O governo Bolsonaro acabou recuando do corte de salários no setor privado, mas segue estudando a redução salarial do funcionalismo e o texto da MP 927 ainda possibilita esse ataque no setor privado, entre outros.
Na segunda-feira, 23, as centrais sindicais se reuniram para discutir o impacto da pandemia de coronavírus sobre os trabalhadores brasileiros e as medidas propostas pelo governo. Ao final do encontro, as centrais aprovaram uma nota que aponta a MP 927 como uma medida “cruel, escandalosa e macabra”, mas não fala da necessidade de paralisar todos os setores não essenciais para o combate ao coronavírus nem indica a construção de uma greve geral.
Embora tenha participado da reunião, a CSP-Conlutas não assinou o documento. Para a Central, o texto manifesta confiança no Congresso e propõe um grande pacto nacional com o empresariado.
“Precisamos apresentar uma saída dos trabalhadores, porque essas pessoas têm alguma esperança de que serão defendidas, de que terão a vida e os direitos em primeiro lugar na nossa lista de reivindicações”, afirmou o coordenador da CSP-Conlutas Luís Carlos Prates, o Mancha. Ele defendeu uma “quarentena geral” como única forma de deter o avanço da pandemia.