Solidariedade aos desabrigados do edifício Wilton Paes de Almeida


02/05/2018 - Luciana Araujo

O prédio onde funciona o Sindicato continua fechado ao atendimento ao público. Assim que houver liberação a categoria será informada. Por ora, divulgamos abaixo a nota da diretoria do Sintrajud em solidariedade aos desabrigados.

Em contato com o Padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo, o Sindicato foi orientado a que doações para as famílias que ficaram desabrigadas sejam entregues no Centro de Inclusão pela Arte, Cultura, Trabalho e Educação (CISARTE). A necessidade maior dos moradores neste momento é de fraldas, leite, alimentos não perecíveis e mantimentos – especialmente para crianças – e produtos de higiene (principalmente sabonetes, absorventes femininos, toalhas de banho). O CISARTE fica no Viaduto Pedroso, 111 – Bela Vista, e funciona 24 horas. As doações podem ser entregues preferencialmente até às 23 horas.

O Sintrajud também solicitará às administrações autorização para disponibilizar caixas de coleta para doação nos próprios locais de trabalho da Capital. Assim que for possível a categoria será informada.

Confira abaixo a nota da direção do Sindicato:

A diretoria do Sintrajud manifesta solidariedade às cerca de 370 pessoas que moravam no Edifício Wilton Paes de Almeida, localizado na esquina da rua onde está instalada a sede do Sindicato com a Avenida Rio Branco. Ao menos 146 famílias, de acordo com o Corpo de Bombeiros, viviam no local.

Muito foi falado que a tragédia de hoje estava anunciada. Uma tragédia anunciada, de fato, em relação à qual há a confirmação de ao menos um desaparecido, o rapaz de nome Ricardo, que os bombeiros tentavam resgatar exatamente quando o prédio veio abaixo. No entanto, a causa original do terrível acidente de hoje não é responsabilidade das pessoas que lá viviam, mas do poder público, que tinha conhecimento da ocupação do prédio com problemas estruturais desde 2009 e nunca fez nada para resolver a falta de habitação dos brasileiros, brasileiras, brasileirinhos e imigrantes atingidos pelo déficit habitacional gigantesco no país e na capital paulista.

Construído na década de 1960, o edifício abrigou a sede da Polícia Federal até 2003. Entre 2007 e 2009 foi instalada ali uma agência do INSS onde constantemente eram denunciados pelos servidores o alagamento do espaço por rupturas de encanamento e infestações de ratos e insetos. Depois de fechada a agência do INSS, o edifício ficou abandonado novamente, até que foi ocupado por quem não tem onde morar.

Passados nove anos de ocupações a União (proprietária do imóvel que ninguém quis adquirir num leilão realizado em 2015) nada fez para assegurar às famílias o direito constitucional à moradia. Além disso, o Poder Central do país também permitiu que um imóvel de sua propriedade deixasse de cumprir qualquer função social ou destinação. Situação que significa ainda depreciação de patrimônio público de toda a população brasileira pagadora de impostos desde o consumo até a renda – incluindo a parcela da sociedade que é mais regressivamente taxada, que são as pessoas mais pobres, exatamente as que acabam forçadas pela condição de vida a ocupar um lugar para morar. No Brasil essas são as pessoas que pagam mais impostos em comparação com o que recebem. Muito mais, proporcionalmente, do que os detentores de grandes fortunas.

Desde 2017 o imóvel estava em processo de transferência ao município de São Paulo. Mas nem a Prefeitura nem o Governo do Estado tomaram também qualquer providência para que as pessoas que viviam em situação de evidente risco na ocupação pudessem acessar programas habitacionais e terem para onde ir em condições adequadas.

A tragédia do edifício Wilton Paes de Almeida foi produto do descaso do poder público com a população pobre e com o patrimônio de toda a sociedade brasileira.

Não à toa o presidente ilegítimo Michel Temer foi escorraçado ao tentar fazer proselitismo no local.

Para completar o quadro de desrespeito absoluto à legislação e à vida pelos agentes públicos constituídos, a sociedade paulistana foi informada na tarde de ontem pela mídia que em março deste ano o Ministério Público arquivou inquérito aberto em 2015, após denúncia de um morador do prédio sobre risco de desabamento. Segundo informação divulgada pelo ‘Jornal Nacional’, da TV Globo, o MP usou como base para arquivar o procedimento um laudo da Defesa Civil que atestava não haver riscos estruturais no imóvel. Após a tragédia, agentes públicos falam em alteração da estrutura em razão do calor do incêndio.

Por tudo isso, a diretoria do Sintrajud não coaduna com o discurso de que a responsabilidade pela tragédia é das pessoas que viviam em situação juridicamente irregular. “Quando morar é um privilégio, ocupar é um direito”, afirmam os movimentos que lutam pelo cumprimento do artigo 6° da Constituição Federal de 1988 em um país que tem 7 milhões de imóveis desocupados e 6 milhões de pessoas sem teto, de acordo com dados levantados pela Fundação João Pinheiro. #QuemOcupaNãoTemCulpa

A direção do Sindicato também convida a categoria a somar esforços na rede de solidariedade cidadã que se formou desde a madrugada do desabamento. A população paulistana tem doado roupas, alimentos e produtos de higiene. E é fundamental essa postura num momento em que as pessoas estão na rua e o poder público só oferece às famílias os famigerados albergues (sem nenhuma condição de privacidade e com restrições à entrada de mulheres com filhos maiores ou casais, além dos riscos da exposição de crianças ao convívio permanente com estranhos). As pessoas que viviam no Wilton Paes de Almeida são trabalhadores e trabalhadoras que exigem o direito à moradia que seus impostos deveriam lhes assegurar. E devemos também somar nossa voz à defesa de que os poderes públicos cumpram sua obrigação e não imponham a uma parte dos brasileiros a condição de cidadãos de segunda classe.

Não aceitamos a tentativa de criminalização do movimento de luta por moradia, e rejeitamos os despejos anunciados para outras 70 ocupações na região Central sem que haja solução efetiva de moradia digna para as pessoas. A retirada da população de lugares de risco não pode ter como “solução” apenas jogá-las em outras condições indignas num momento de alta dos aluguéis, do custo de vida e do desemprego. A solução para a questão da moradia não pode se afastar do que estabelece a Constituição do país.

Diretoria do Sintrajud

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