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9/11/2016

No Rio, ato contra pacote que antecipa PEC 55 toma a Assembleia por 3h

Ocupação da Alerj por servidores, a maioria do sistema de segurança, foi contra projetos que taxam a categoria em 30% e podem virar "modelo" para o país

Não havia, ao que parece, nada planejado. Mas a insatisfação e a revolta dos servidores com as medidas que o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) tenta aprovar teriam sido o motor da invasão e ocupação, por cerca de três horas e meia, da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Desde o início do protesto, ainda pela manhã da terça-feira (8), isso se expressava nos discursos feitos do carro de som e nas conversas entre os milhares de manifestantes que se aglomeravam em torno do Palácio Tiradentes. É ali que os 70 deputados fluminenses vão decidir se os 22 projetos enviados pelo governador vão ser ou não convertidos em lei.

 

Imediatamente apelidado de ‘pacote de maldades’, as propostas são apontadas pelos servidores como uma antecipação, que se aprovadas podem virar ‘parâmetro’ para outros estados e para a esfera federal, dos efeitos de proposições como a PEC 55 (ex-PEC 241) e o PLP 257. Estes projetos que ‘congelam’ orçamentos e salários são tratados como prioridades pelo governo de Michel Temer (PMDB) em âmbito nacional. É contra eles que centrais sindicais, sindicatos e movimentos sociais convocam uma jornada de protestos que inclui dois dias prioritários de manifestações: 11 e 25 de novembro.

 

Troca de lado

 

O que ocorreu no Rio, é necessário ressaltar, não foi um ato como os outros. Havia servidores da saúde, da educação, da Justiça Estadual, que estão em greve, e de alguns outros setores. Porém, a grande maioria dos que participaram pertencem ao sistema de segurança estatal – militares (bombeiros e policiais) e civis (policiais e agentes do Departamento do Sistema Penal). Homens e mulheres que estão mais acostumados a estar do outro lado das manifestações, integrando as forças de repressão do estado.

 

A insatisfação e revolta, no entanto, não se restringe a tais setores. É evidente que ela é generalizada e inevitável entre os servidores estaduais. Faz pouco tempo, o Rio patrocinava grandes eventos e festas com dinheiro público, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Agora, os servidores veem o governador do mesmo partido que há dez anos governa o estado, e agora o país, anunciar um pacote que, na prática, levará o servidor a perder 30% de sua remuneração somente a título de contribuição previdenciária. Isso, é claro, se o pacote anunciado na sexta-feira (4) for aprovado, algo que parecia uma tendência nas contas do governo, mas que, agora, ganha cada vez mais ares de incerteza.

 

O possível pacote de medidas impopulares já era cogitado há algumas semanas. Dois dias antes de ser enviado ao Legislativo, cerca de mil servidores de diversas áreas, mas majoritariamente da Justiça Estadual, protestaram no mesmo local para tentar barrar a aprovação da controversa proposta que oficializa o ‘estado de calamidade financeira’ no Rio de Janeiro. Sabia-se que tal projeto, aprovado com a ressalva de que os salários dos servidores não podem ser reduzidos, seria o passaporte para outras medidas. 

 

Desde que elas foram anunciadas, os servidores não saíram mais das ruas, com atos diários no Centro da cidade. A pretendida greve geral de todos os segmentos que compõem o funcionalismo estadual ganha, por conta disso, contornos mais palpáveis. A espetacular ocupação da Assembleia Legislativa ocorreu no início da tarde da terça-feira (8). O local já estava cercado pelos manifestantes – além do cordão de policiais militares que acompanhavam o protesto. As imagens da multidão em volta da casa legislativa circulavam pelas redes sociais e despertavam atenção.

 

Do carro de som, chegou-se a propor um abraço ao prédio. A proposta foi mal recebida. A ideia de invadir ganhava força entre os que estavam nas escadarias do Palácio Tiradentes. Os servidores forçaram e entraram pela porta da frente. Em pouco tempo, ocuparam corredores, as galerias e o plenário. Estiveram no gabinete do presidente da casa, deputado Jorge Picciani, também do PMDB. Negam que tenham danificado algo.

 

O deputado Wagner Montes (PRB), famoso por apresentar programas populares na TV, tentou, em vão, conter os ânimos. Não conseguiu falar muito. “Ninguém queria conversa com nenhum deputado”, relata uma manifestante que participou do ato. Houve, como divulgado em alguns veículos de comunicação, um momento aparentemente isolado em que um grupo de policiais gritou o nome do deputado de extrema direita Flávio Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). Quem viu a cena, porém, assegura que, tenha ou não o parlamentar adeptos entre os policiais que ali estavam, o que ocorreu foi algo fora do contexto e longe de expressar o caráter do protesto.

 

Palácio ocupado

 

Os deputados, quase todos, ou não conseguiram entrar no prédio ou já haviam deixado o local. A Alerj ficou sob o controle de cerca de mil servidores – com apoio de alguns milhares lá fora que não arredavam o pé das imediações – que a ocuparam por três horas e meia. Lá dentro, formou-se uma comissão, na qual foram representadas todas as categorias envolvidas, inclusive a saúde, educação e Justiça – que compunham um setor muito minoritário no protesto.

 

Em assembleia no plenário do Palácio Tiradentes, decidiram por redigir uma nota a ser entregue à Presidência da Alerj e aos parlamentares. O documento afirma que a ocupação foi um alerta para o governador e os deputados e que os protestos não vão parar enquanto as medidas não forem derrubadas. O texto faz três exigências: a primeira, é que o pacote de medidas seja arquivado – os servidores ressaltaram que não aceitam emendas. A segunda, a libertação do subtenente bombeiro Mesac Efrain, um dos líderes da corporação, preso administrativamente por 30 dias por ter dado declarações à imprensa denunciando os cortes de verbas. Por fim, defendem ainda a abertura do processo de impeachment contra o governador do estado.

 

Saiu da assembleia dos que ocupavam o Palácio a decisão de desocupar o prédio. Na falta de outra autoridade para recebê-la, eles entregaram a nota ao comandante-geral das forças policiais que estavam de serviço no local. Em seguida, saíram pela porta da frente, cantando o Hino Nacional ‘com entonação de protesto’, como definiu um manifestante. Os policiais do batalhão de Choque apenas observavam – alguns, aliás, demonstravam estar emocionados. Há quem afirme ter visto lágrimas nos olhos de soldados.

 

Governo e TJ

 

O presidente da Alerj, Jorge Picciani, divulgou nota na qual alega que o que ocorreu foi “um crime e uma afronta ao estado de direito” e que os “prejuízos causados ao patrimônio público serão registrados e encaminhados à polícia para responsabilização dos culpados”. Diz ainda que não haverá recuo: as mensagens do governador começarão a ser analisadas a partir do dia 16 de novembro.

 

Mais do que a reclamação e as ameaças de Picciani, merece atenção o silêncio do governo do estado. Há uma aparente crise envolvendo autoridades no Rio. O presidente do Tribunal de Justiça, Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, não para de dar declarações duras contra o ‘pacote de austeridade’, que classifica como inconstitucional e inaceitável. Pouco depois da ocupação, um juiz de primeira instância concedeu liminar suspendendo a tramitação de um dos projetos do pacote, o que cria uma alíquota extra de 16% para contribuição previdenciária dos servidores, que duraria um ano e meio e poderia ser prorrogada.

 

Esse é um de uma série de itens que envolvem direitos dos servidores e da população. Há ainda o aumento definitivo da alíquota de 11% para 14% - algo, aliás, que o governo federal gostaria de estender para todos os servidores do país. Ou o fim de benefícios assistenciais, como o aluguel social, e de uma espécie de ‘Bolsa Família’ estadual. O mais grave, ressaltavam muitos servidores nos atos, é que o que está em risco é o desmonte permanente dos serviços públicos. O grande desafio, dizem, é fazer a população que sentirá na pele os efeitos dessas propostas – que estão associadas no âmbito federal aos projetos que congelam os orçamentos (PEC 55 e PLP 257) – abraçar a causa e participar das manifestações.




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