Sintrajud oferece acolhimento a vítimas de assédio sexual e moral


09/12/2022 - Shuellen Peixoto e Luciana Araujo
Sindicato tem procedimento específico para atendimento a mulheres vítimas de assédio, preservando a identidade e sigilo, e garantindo atuação no caso.

Crédito: Kit Gaion

A atuação contra o assédio moral e sexual no ambiente de trabalho no Judiciário Federal no Estado de São Paulo é parte fundamental da ação do Sintrajud desde a sua fundação. Lamentavelmente, as denúncias de assédio sexual no Judiciário não são novidade, e o Sindicato já atuou em diversos casos, obtendo condenação de assediadores e reparação a vítimas nos últimos anos.

As denúncias de centenas de casos de assédio sexual envolvendo o juiz substituto do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região Marcos Scalercio, foram divulgadas na imprensa. As denúncias foram levadas a público, também mantendo as identidades das denunciantes em segredo, após a localização de outras mulheres que relataram terem sido submetidas aos mesmos crimes em diversos períodos. E não só no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, mas também num curso preparatório para concursos onde o juiz foi professor.

Foi a pressão pública e atuação do Sintrajud, em parceria com entidades como a Me Too, que garantiram que o caso chegasse ao Conselho Nacional de Justiça, que determinou a abertura de procedimento administrativo disciplinar para apuração das denúncias de assédio sexual, moral e até estupro imputadas ao juiz Marcos Scalercio, e seu afastamento cautelar.

Para a diretora do Sindicato, Luciana Carneiro, coordenadora do Coletivo de Mulheres – Mara Helena dos Reis, o caso Marcos Scalercio demonstra a importância de denunciar e acolher as mulheres que são vítimas de assédio. “Nós conseguimos uma grande vitória no caso do Scalercio, mas não foi a primeira; o Sindicato atua inicialmente no acolhimento da vítima, num segundo momento, busca conversar com a vítima para saber o que espera e como deseja que o Sindicato atue,; além de buscar fazer o que de melhor podemos para garantir que o assediador seja penalizado e retirado do local de trabalho da vítima”, destaca Luciana Carneiro.

A servidora explica que no Sindicato, toda denunciante tem seu sigilo garantido. “Quando chega uma denúncia ao sindicato o primeiro tratamento é procurar a vítima para dar um acolhimento. Quando a vítima chega a fazer uma denúncia é sinal de que ela já está muito fragilizada com o assédio que está sofrendo, por isso nosso primeiro passo é acolhimento”, explica a servidora. “As denúncias ficam restritas a um grupo muito pequeno de pessoas, fundamentalmente, a coordenadora do Jurídico, Eliana Ferreira, mais uma advogada da equipe, e uma ou duas diretoras do Sindicato”, afirmou Luciana.

A diretora também reforçou que o Sintrajud mantém aberto o canal de denúncias de assédio sexual, bastando preencher o formulário abaixo para comunicar à entidade seu caso e buscar acolhimento e atendimento. Todas as denúncias devem ser encaminhadas também ao tribunal do qual a vítima pertence. (Preencha o formulário aqui)

A atuação contra o assédio sexual também é parte das ações do Coletivo de Mulheres – Mara Helena dos Reis, que reúne servidoras, estagiárias e funcionárias do Sindicato. Sobre a atuação do Sintrajud e do Coletivo no caso que envolve o juiz Marcos Scalercio, a imprensa do Sindicato entrevistou Bruna Guimarães e Camila Gradin, integrantes da coordenação do coletivo. Confira abaixo:

 

SINTRAJUD:  O Sindicato e o Coletivo têm acompanhado as denúncias contra o juiz Marcos Scalercio. Apesar da legislação, de se tratar de operador do Direito num ramo do Judiciário que julga muitas denúncias similares e das normativas do CNJ e do Tribunal, o que você avalia que “autoriza” um juiz a proceder desta forma?

Bruna: Acredito que o que “autoriza” é a confiança no pacto masculino tácito de não enfrentar a misoginia e o machismo estruturais, presentes em todas as esferas da vida.

Camila: Na justiça existe uma cultura organizacional que funciona sob os comandos principalmente de hierarquia, muitas vezes autoritária, na qual juízes e chefes se valem do cargo para ter tratamento diferenciado até em pequenas coisas dentro do ambiente de trabalho por ocupar esse cargo superior. Esse tratamento, em diversos contextos, de revência e temor por parte de subordinados, leva a uma normalização de um ambiente propicio a abuso de poder e assédio.

 

SINTRAJUD:  E um cara desses pode ter julgado ou pode vir a ser designado a julgar ações de trabalhadoras que denunciaram assédio moral e sexual, comprometendo a imagem de toda a JT e o direito que é função do ramo assegurar. O Tribunal deveria cuidar também disso, não é?

Bruna: O Tribunal e qualquer instituição pública deveria zelar pela integridade física e emocional de todos os seus servidores e isso, obviamente, inclui as servidoras mulheres. Neste caso, observa-se que não houve a adoção das medidas necessárias para proteção das servidoras, que, inclusive, só agora ficaram sabendo que havia denúncias gravíssimas a respeito de um Juiz. Podendo inclusive terem ocorrido outros casos de assédio durante todo o período de silêncio da Instituição. Isso certamente compromete a imagem do Tribunal e gera falta de confiança na instituição.

Camila: A conduta denunciada do Marcos Scalercio deveria ter apuração transparente e exemplar para desfazer esse ambiente autoritário presente na cultura institucional e na sociedade do “Você sabe com quem está falando?”. O afastamento dele deve ser imediato para o bom andamento da investigação uma vez que está sendo julgado  pelos seus pares e é difícil imparcialidade e para que o judiciário saia do lugar de cúmplice de seus membros. O fato de ser juiz do trabalho é um agravante, pois as cidadãs que precisam ter sua lide judicial resolvida, precisam que o responsável entenda a implicações de estar sofrendo uma violência física e/ou psicológica e moral num ambiente de trabalho, e não poderem simplesmente se desvencilhar da situação, pois o trabalho é fonte de sobrevivência de sua família. Entendo o medo de denunciar, de ser desacreditada ou  sofrer represálias,  e que falar sobre o assédio é revivê-lo, sei que é doloroso.

 

SINTRAJUD:  Muitas vezes as mulheres têm medo de denunciar. O que você diria a elas?

Bruna: Eu diria que entendo o medo de denunciar. Não é fácil, nossa palavra não tem a mesma validade da palavra de um homem. Mas para aquelas que conseguiram denunciar eu só tenho a agradecer.

Camila: Entendo o medo de denunciar ser desacreditada ou sofrer represálias, e que falar sobre o assédio é revivê-lo, sei que é doloroso. Mas a tolerância a todo tipo de violência contra mulher é resultado de construção social, e só com o enfrentamento coletivo mudamos os rumos das coisas, assim, digo que nós, mulheres, devemos acolher umas às outras e nos organizar civilmente em coletivos e ONGs e movimentos sociais para que façamos coletivamente e com muito mais força.

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