Sinais do adoecimento mental, por Daniel Luca


02/03/2017 - Redação

A passagem de um estado saudável para uma situação de enfermidade não é um processo simples e definido. Não é possível dizer em que momento um indivíduo não pode mais ser considerado saudável. Essa mudança é processual, algo que caminha de um estado a outro, sendo que nem a saúde nem a doença são estáticas e homogêneas. Diversos pesquisadores da área da saúde utilizam, então, o conceito de “processo saúde-doença”, compreendendo que nunca se é 100% saudável ou 100% doente, pois o processo envolve essas duas situações.

Alguns aspectos do trabalho podem levar a um desgaste mental do individuo, o que contribui para o adoecimento. O desgaste pode causar alterações no corpo e na mente dos trabalhadores, que são também sinais de que está se desenvolvendo um processo de adoecimento.

Esses sinais iniciais podem ser diversos, sendo a fadiga um dos mais comuns. É a sensação de cansaço presente no dia a dia e que não é superada nem por uma noite de sono nem pelo final de semana. A fadiga chega a afetar o desempenho no trabalho e mesmo outras dimensões da vida dos trabalhadores, como a familiar e a social. Alguns importantes aspectos dessa fadiga são a irritabilidade, as alterações do sono e o desânimo.

A irritabilidade é comumente sentida por familiares e colegas, apesar de nem sempre ser percebida a relação com o trabalho. Brigas mais freqüentes, menos paciência para lidar com filhos e outros problemas do cotidiano podem ser alguns dos sinais. A principal alteração do sono em tais situações é a insônia e, com o descanso comprometido, o cansaço se acumula ainda mais. Pode haver outras alterações, como sono leve, aumento do sono, sonolência durante o dia e dificuldade de acordar para o trabalho.

Já o desânimo é relacionado ao sentimento de tristeza, falta de motivação e de disposição para tomar iniciativas. Ademais, o cansaço pode se manifestar também como alterações na fome e dores diversas. Além da fadiga, outros sintomas que podem ser sinais de adoecimento no trabalho são as somatizações, como hipertensão, gastrite ou problemas dermatológicos.

Agir antes que se desenvolva um adoecimento mais grave
Se por um lado o cansaço pode ser um sinal desse desgaste, por outro lado pode ser o prenúncio de um adoecimento mais grave. A pesquisadora Edith Seligmann aponta que vários trabalhadores que desenvolveram quadros de adoecimento psíquico ou sintomas desta natureza relataram ter passado por períodos extensos de fadiga.

Por vezes, trabalhadores não tomam nenhuma providência frente a esses sinais por acreditarem que os sintomas em breve irão passar e tudo voltará a ficar bem. É comum também que trabalhadores não busquem ajuda por medo de tirarem licenças médicas e isso ser mal visto pelas chefias. Porém, se o adoecimento é relacionado ao trabalho, o servidor só retomará a situação de saúde se resolver o problema que está sendo maléfico ao seu corpo e mente; caso contrário, a situação só tende a piorar, surgindo sintomas mais graves, com alto sofrimento psicológico e a necessidade de tratamentos duradouros.

Quanto antes for detectado o desgaste e o sofrimento, melhor será o tratamento e mais forças o trabalhador terá para tomar iniciativas contra esse problema. É importante conversar com familiares e colegas, mas acima de tudo é fundamental buscar ajuda profissional com psicólogos, psiquiatras, fisioterapeutas ou médicos do trabalho, de acordo com cada situação.

Tratar o adoecimento é fundamental, mas não podemos perder de vista que, se não atuar nas causas da enfermidade, mesmo o melhor tratamento será apenas “enxugar gelo”. É fundamental agir sobre o processo de trabalho para mitigar ou extinguir os elementos adoecedores que causam o desgaste mental e construir em seu lugar práticas que promovam a saúde dos trabalhadores.

Referência:
Trabalho e desgaste mental: o direito de ser dono de si mesmo. SELIGMANN-SILVA, Edith. São Paulo: Cortez, 2011.

(*) Daniel Luca é psicólogo e assessor do Sindicato na área de saúde do trabalhador.

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