Seminário discute racismo na sociedade brasileira neste sábado


08/11/2018 - Luciana Araujo

A filósofa estadunidense Angela Davis ressaltou em palestra ministrada no ano de 1997, em São Luís do Maranhão, que “classe [social] informa a raça, mas raça também informa a classe. E gênero informa a classe. Raça é a maneira como a classe é vivida. Da mesma forma que gênero é a maneira como a raça é vivida. A gente precisa refletir bastante para perceber as intersecções entre raça, classe e gênero, de forma a perceber que entre essas categorias existem relações que são mútuas e outras que são cruzadas. Ninguém pode assumir a primazia de uma categoria sobre as outras”.

A síntese de Angela explica de maneira cabal a realidade da parcela negra (somatória de pretos e pardos, de acordo com os critérios do IBGE) da população brasileira. E ganha peso a análise da construção histórica desta realidade no momento em que o país discute as possibilidades de retrocesso nas já limitadas políticas públicas de combate às desigualdades sociorraciais no Brasil: como as leis que estabelecem cotas para afrodescendentes e indígenas em concursos públicos e vestibulares, a Política Nacional de Saúde da População Negra, a titularização de territórios, a disparidade salarial e de acesso à educação etc.

Nosso país foi fundado sobre a violência da colonização e da escravização baseada no racismo. E esses elementos estruturantes da sociedade brasileira até hoje marcam as vidas dos cidadãos e das cidadãs negros e negras. Estudo publicado em 2017 pela Oxfam Brasil mostra que “mantida a tendência dos últimos 20 anos, os negros só terão equiparação salarial com os brancos no Brasil em 2089”. Por outro lado, 71% das vítimas de mortes violentas são jovens negros.

Mesmo no serviço público, onde a possibilidade de acesso é menos desigual em razão do ingresso por concurso, a baixa escolaridade imposta pelas segregação econômica, social e regional prejudica mais à população negra. Há carreiras públicas no Brasil, país onde 54,9% da população se autodeclara negra, cuja composição étnico-racial é similar à de nações europeias. O Judiciário enquadra-se nesta situação.

A pesquisa de perfil e opinião da categoria realizada neste ano pelo Sintrajud identificou que 18% dos servidores do Judiciário Federal no Estado de São Paulo são negros (14% pardos e 4% pretos). Um crescimento de mais de 100% em relação a 2006, primeira vez em que o Sindicato realizou estudo do tipo. A responsável técnica da pesquisa, Genilda Souza, avalia que o aumento deve-se mais ao reflexo que se deu em toda a sociedade brasileira de mais pessoas se autodeclarando negras do que propriamente ao incremento dos quadros funcionais. A autodeclaração à classificação indígena de raça/cor não atingiu representatividade estatística.

Quando a barreira da escolaridade é superada e pretos e pardos ingressam no funcionalismo as discriminações se expressam na ocupação de postos de chefia, direção ou espaços decisórios. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, o número de parlamentares eleitos neste ano que se autodeclaram pretos ou pardos soma 24,36%. No Senado, 14 dos 32 integrantes da legislatura que se inicia em 2019 se autodeclaram negros. Como só em 2014 o TSE incluiu o quesito raça/cor na qualificação de candidatos a cargos eletivos no país, o Senado informa não ter o mapeamento étnico-racial dos senadores eleitos nas legislaturas anteriores.

O Censo realizado pelo CNJ em 2014, por exemplo, “esqueceu” de perguntar quantas das juízas brasileiras são negras. No Perfil Sociodemográfico dos Magistrados divulgado este ano a questão foi incluída e verificou-se que, entre as mulheres, o contingente negro era de 15% antes de 1990 e está em 16% para o ingresso após 2011. A participação de homens negros na magistratura – ou autodeclaração – quase dobrou, embora ainda seja muito inferior à composição étnico-racial do país. Eles eram 12% antes de 1990 e, após 2011, passaram a representar 22% dos quadros.

Transformar esta realidade é uma urgência para termos um país efetivamente digno de seu povo. Por isso o Sintrajud se engaja nesta discussão, com o objetivo de fortalecer a luta antirracista, e convida você a participar do Seminário ‘A Situação dos Negros e Negras no Brasil’. A atividade acontece no hotel São Paulo Inn (Largo de Santa Efigênia, 44) em razão das obras no 15º andar do edifício sede do Sindicato. Após o debate haverá uma apresentação de Hip-Hop sob direção de Eder Carlos (Peba Zunir) e uma apresentação do grupo teatral do Sintrajud, o Erga Omnes. Durante o evento também serão expostos quadros do trabalhador terceirizado Lucas Rodrigues (Maloca).

Temário do evento:

‘A organização do movimento negro no Brasil’
Jupiara Castro, representante da Fasubra no Conselho Nacional de Saúde e fundadora do Núcleo de Consciência Negra na USP.

 

 

 

‘A revolução burguesa no Brasil e o racismo como ideologia’
Márcio Farias, professor convidado do Celacc (Centro de Estudos Latino Americanos sobre Cultura e Comunicação) ECA/USP.

 

 

 

‘Racionalidade punitiva colonial e racismo no Brasil’
William Meneses, bacharel em Direito e supervisor de publicações do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).

 

 

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