Relator atende governo, contraria juristas e vota a favor da PEC da ‘Nova previdência’


10/04/2019 - Helcio Duarte Filho

O relator da ‘reforma’ da Previdência na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara, deputado Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), seguiu a determinação do governo e apresentou relatório de 53 páginas que propõe a aprovação sem alterações da Proposta de Emenda Constitucional 6/2019, que muda radicalmente a Previdência Social no Brasil.

A CCJ analisa a admissibilidade constitucional da matéria, antes de o texto ser encaminhado para a Comissão Especial que analisará o seu mérito. Deputados da oposição pediram vistas à proposta e criticaram a pressa dos partidos governistas em votá-la ‘sem sequer discutir com profundidade um assunto que tem alto impacto na vida das atuais e das futuras gerações’.

O deputado federal Pompeo de Mattos (PDT-RS) apresentou um voto em separado, na qual propõe uma série de alterações em aspectos no que considerou ferir a Constituição Federal de 1988. O presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL-PR), quer iniciar o debate em torno do parecer na segunda-feira (15) e votá-lo no dia seguinte, na terça-feira (16). A pressa teria ainda relação com a Semana Santa – o governo teme que a votação fique para após o feriado.

Em uma leitura nervosa e na qual teceu ao menos duas observações críticas quanto ao que está sendo proposto pelo governo, o deputado mencionou as inconstitucionalidades observadas na proposta por juristas que foram à Comissão numa sessão anterior, mas uma a uma descartou-as, mesmo que, em alguns momentos, não transparecesse muita convicção.

Ao menos três de cinco juristas que estiveram na Comissão apontaram ilegalidade na proposta por ferir as chamadas cláusulas pétreas da Constituição Federal – que são definições que não podem ser suprimidas por emendas constitucionais. Entre as cláusulas pétreas estão os direitos e garantias individuais.

Capitalização

Sobre o item do texto que prevê a criação do regime de capitalização, que na prática substituiria o atual, de repartição, o relator disse não haver inconstitucionalidade, mesmo que se possa considerar o modelo “inconveniente”. Esse é um dos aspectos apontados por juristas como inconstitucional porque significaria o fim do direito à Previdência Social no Brasil. “Capitalização não tem nada a ver com Previdência”, disse, quando esteve na comissão, o advogado Cezar Britto, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, classificando o modelo como uma poupança individual de alto risco.

O relator Marcelo Freitas, porém, não viu problema legal na proposta. “Não há imutabilidade [na Constituição] quanto ao sistema de previdência nem obrigatoriedade de que o sistema de previdência seja o de repartição. Podemos até sustentar que a modificação do sistema seja inconveniente ou que existem outras formas melhores, mas não que seja inconstitucional”, disse.

Embora tenha defendido a aprovação sem alterações, o deputado governista sinalizou discordância no mérito quanto às mudanças propostas para a aposentadoria do trabalhador rural e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que o governo pretende reduzir o valor inicial para R$ 400,00, menos da metade do salário-mínimo. São pontos, disse, para serem analisados na Comissão Especial a ser instalada após a tramitação na CCJ.

Acesso restrito

Logo após fazer esta foto, Claudia teve de deixar o plenário da CCJ, que foi fechada à população.

A sessão transcorreu com as portas praticamente fechadas à população – deputados da oposição recorreram contra essa decisão do presidente da Comissão, que sumariamente negou os recursos. “Não conseguimos chegar à sala da CCJ, o corredor de acesso estava interditado, não se chegava de jeito nenhum a não ser quem tivesse um convite especial, que ninguém tinha”, disse a servidora Claudia Vilapiano, da Justiça Federal em Campinas e diretora do Sintrajud.

A dirigente do sindicato participou da mobilização, promovida por militantes contra a reforma, entre eles da Auditoria Cidadã da Dívida, no corredor que antecede a entrada para os plenários, onde distribuíram material e tentaram conversar com os deputados sobre as razões de defender a rejeição da PEC 6/2019. Ela avalia, no entanto, que é preciso aumentar a pressão sobre os parlamentares. “Não podemos cometer o erro de deixá-los à vontade para [votar] uma proposta tão ruim para os trabalhadores”, disse.

Na tarde desta quarta-feira (10), Claudia esteve reunida com o deputado Pompeo de Mattos e o dirigente do Sintrajufe/RS Rodrigo de Mello Mércio. O parlamentar explicou seu voto afirmando que “temos uma posição muito clara, o PDT não é contra a reforma, é contra esta proposta de reforma. Não somos refratários a fazer o debate sobre a previdência, que pode ter alguns ajustes. Mas dessa maneira que está não tem como corrigir, ela é insanável. Por isso apresentei um voto em separado. Infelizmente sabemos que não vai prosperar porque o governo não vai apoiar, vai apoiar a ideia deles e fazemos o contraponto para dizer o quão maléfica é esta proposta”, disse.

“Vão matar o INSS, ferir de morte os regimes próprios de previdência, e aqueles que são de carreiras de Estado, com salários médios um pouco mais altos, serão afetados também. Porque na hora que vier a capitalização nocional, que é a capitalização sem noção, ela é fictícia. E eu sou de previdência complementar, mas não se trata de previdência complementar”, afirmou ainda o parlamentar.

Claudia também conversou com a deputada Sâmia Bomfim (PSOL/SP). Na avaliação da parlamentar, o governo “ainda está bastante despreparado e sem uma base de apoio significativa. Além do PSL, do Novo e um ou outro deputado do PSDB, os parlamentares não se posicionaram a favor do projeto”, disse. “Na semana que vem segue o debate e eles querem instalar a Comissão Especial. E aí a batalha vai ser ferrenha, porque é o debate de conteúdo mesmo, e eles podem estar mais fortes. Então vai ser necessária muita mobilização”, apontou a deputada.

Frente contra a reforma

Na semana anterior, em uma série de atividades na Câmara, dirigentes sindicais dos serviços públicos e de setores privados, além de representantes das centrais sindicais, buscaram articular no Congresso Nacional a conformação de uma frente de luta para tentar barrar a reforma. “Nossa prioridade é a defesa da aposentadoria e da Previdência pública”, disse, à reportagem, o servidor Adilson Rodrigues, da Justiça Federal de Santos (SP) e da coordenação da Fenajufe, a federação nacional da categoria, ao final de uma semana na qual os representantes sindicais haviam participado de reuniões com as lideranças da minoria e da oposição.

“Falamos da importância de estabelecer uma luta unificada dos servidores com o conjunto das entidades dos movimentos sociais e trabalhadores da cidade e do campo. Foi sinalizado um esforço conjunto para termos um espaço de conversação permanente, para que tenhamos uma campanha que faça chegar aos trabalhadores as nossas posição com relação à reforma”, disse.

Em outra reunião, com as centrais sindicai, formou-se um comitê que terá a função de tentar dar certa centralidade às diversas iniciativas contrárias à PEC-6. “É um esforço de todos em convergir para estar numa mesma linha e numa mesma trincheira de enfrentamento contra a reforma”, explica Adilson.

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