Relação do suicídio com a crise econômica, dificuldades financeiras e desemprego


02/03/2017 - joebetho

Os períodos de crise econômica são marcados em geral por aumentos das taxas de suicídio. O crash na bolsa em 1929 deixou no imaginário da população na época a imagem de investidores se atirando de prédios após terem perdido boa parte de seu dinheiro que estavam em ações. Para, além disso, a crise que se instalou após 1929 levou a um aumento real na taxa de suicídios.

Diversas pesquisas sobre a crise econômica mundial recente apontam também altas nas taxas de suicídio. Estudo feito com dados das taxas de suicídio em dez países da Europa durante os anos de 2007 a 2009 apontaram aumentos de 5% à 17%, com Irlanda e Grécia entre os mais afetados.

Outra pesquisa, comparando dados de antes e depois de 2007, indica que EUA, Canadá e Europa tiveram cerca de 10 mil suicídios mais diretamente ligados à crise e recessão econômica. Além de forte aumento na venda de antidepressivos. Nos estados unidos, os estados que tiveram mais demissões as taxas de suicídios eram significativamente mais altas que os outros.

Segundo a Direção Geral de Saúde de Portugal na comparação entre o período de 1999-2003 (antecessor à crise) e 2008 – 2012 (em crise), houve um aumento de 22,6% na taxa de suicídio no país. Ainda sobre Portugal, uma pesquisa em uma região do país aponta para aumento das tentativas de suicídio em 47% no sexo feminino e 35% no sexo masculino, além de uma estimativa de aumento de 30% nos casos de depressão.

Boa parte destes suicídios tem ligação com o aumento do desemprego nestes períodos. Uma análise com dados de 26 países da união européia, entre 1970 e 2007, aponta que em indivíduos com menos de 65 anos a cada 1% de aumento na taxa de desemprego acarretava uma subida de 0,79% na taxa de suicídio.

No Brasil não é diferente
A recente crise que foi sentida na Europa e EUA a partir de 2008, não havia chegado com a mesma intensidade no Brasil até recentemente.

Em 2015, devido à crise e a redução dos postos de trabalho, quase um milhão de famílias passaram das classes médias para as mais pobres. Hoje, só na região metropolitana de São Paulo são dois milhões de desempregados e este número tende a aumentar, segundo estimativas. Junto com o aumento do desemprego enfrentaremos a suas conseqüências à saúde mental dos trabalhadores, além dos efeitos negativos das outras características da crise em si.

O desemprego afeta a saúde mental de diversas formas, pois é marcada por sentimentos de insegurança, vulnerabilidade e é uma situação de descontinuidade profissional e impossibilidade realização de planos futuros. Acarreta falta de confiança em si e nos outros, sentimentos de culpa e uma perspectiva pessimista de vida que se soma à sensação de impotência face à própria condição.

A desesperança gerada pelo desemprego é um sentimento marcante, no qual não vê possibilidade de melhora no futuro, não se consegue vislumbrar uma saída para a situação. A pessoa terá dificuldade em empenhar esforços em uma iniciativa se não tem esperança de que tal projeto pode dar certo. Ademais, sentir que ficará nesta situação para sempre pode gerar uma angústia profunda. Este sentimento é alimentado pela frustração da busca constante de trabalho, sem ter sucesso.

Este aspecto é tão forte que algumas pesquisas apontam que a desesperança pode ter maior correlação com suicídio do que a depressão – que é bastante presente entre aqueles que cometem suicídio.

Os desempregados de longa duração tendem a ser os mais afetados psiquicamente e com maior risco de buscar o suicídio como saída. Ser do sexo masculino e ter baixo nível educacional são outros dois fatores de risco para a tentativa de tirar a própria vida.

O Desemprego se relaciona também com o isolamento social, propensão ao uso de álcool e drogas, sentimento de ineficácia, estresse, separação conjugal, contração de dívidas e outros aspectos negativos que contribuem para a piora do quadro psíquico e social do indivíduo.

Além da saúde mental, a saúde física também tende a ser afetada pelas crises econômicas e o desemprego. A vivência do estresse tende a reduzir a defesa imunológica; a perda de renda acarreta a redução dos gastos com saúde, dificultando a realização de determinados tratamentos; a piora nas condições de vida tende a aumentar a transmissibilidade de doenças em alguns casos; além de também uma piora no serviço público devido a políticas de cortes nos gastos sociais.

Como se pode notar a crise econômica, sobretudo o desemprego, pode acarretar uma forte desestruturação na vida de um indivíduo, tanto no que se refere à saúde física, quanto nos aspectos psicológico, econômico e social – podendo levar a pessoa ao ato desesperado de suicídio.

Mas apesar de ser relativamente comum em crises o aumento do índice deste tipo de ato, pesquisadores apontam que é errado naturalizarmos tal relação, pois há, sim, políticas que podem ser feitas que ajudem a conter o aumento nos índices. Estudos apontam que na Suécia, por exemplo,que conta com uma maior rede de apoio e assistência, os problemas econômicos não refletiram tanto aumento na taxa de suicídio, que mantiveram-se estáveis.

Outros dados apontam que em regiões em que muitas pessoas fazem parte de organizações como associações, sindicatos e grupos desportivos, os efeitos adversos da crise e do desemprego para a saúde foram reduzidos substancialmente.

É fundamental, lógico e humano, então, uma política econômica que ao invés de onerar os trabalhadores pela crise, onere classe que concentra a riqueza. Um conjunto de ações que distribua renda, garanta emprego, moradia, controle de preços entre outras questões fundamentais para a classe trabalhadora e assim possa garantir as condições de vida, saúde da população.

O avesso
O Brasil, entretanto, não é um país que tem a cultura de proteção ao trabalhador, e a história prova que essa realidade só muda com união e luta da classe trabalhadora.

Vivemos hoje um quadro de recessão econômica e mais de 12 milhões de trabalhadores estão desempregados. A solução encontrada pelo governo Temer (PMDB) para solucionar a crise é dar sequência ao plano de governo do PT. Ele trabalha fortemente para aprovar medidas no congresso que prejudicam a classe trabalhadora.

O PLP 257, apresentado pelo governo e Congresso como plano de salvamento dos estados, na verdade, congela o orçamento dos serviços públicos por dois anos, provocando arrocho salarial dos servidores, precarizando serviço público, o que piora muito as relações de trabalho.

A PEC 241 é outra proposta que o governo Temer tem se desdobrado pela aprovação. Essa proposta de Emenda Constitucional congela o orçamento público federal por 20 anos, desobriga o investimento mínimo na saúde e educação e outros serviços essenciais que, hoje, têm percentual orçamentário obrigatório. Proíbe a criação de novos cargos ou funções, reestruturação de carreira e realização de concursos no setor público.

A reforma da Previdência mexe com todas as categorias de trabalhadores. Ela reduz o valor mínimo da aposentadoria (que hoje equivale ao salário mínimo) e aumenta a idade para obtenção do benefício (o governo quer instituir 65 anos para mulheres e 701 para homens).

A segurança da CLT também está em jogo. Uma reforma trabalhista que está em pauta propõe que as negociações entre empregados e patrões valha mais que a CLT, com isso, tudo o que está assegurado em lei, como o 13º salário, férias, licença maternidade e licença paternidade, licença prêmio, perde a obrigatoriedade de cumprimento.

Tudo isso pode agravar a segurança do trabalhador e virar fator de agravamento de doenças emocionais e mentais.

Um estudo realizado pela OMS mostra que o Brasil foi o quarto país latino-americano com o maior crescimento no número de suicídios entre 2000 e 2012, com 10,4%, ficando atrás apenas da Guatemala (20,6%), México (16,6%), Chile (14,3%). De acordo com o estudo, o Equador é o quinto país a registrar aumento percentual (3,4%).

Em números absolutos, o Brasil é líder entre os países latino-americanos em número de suicídios. De acordo com o relatório, foram 11.821 suicídios só em 2012.

Apesar de terem apresentado um aumento maior de suicídios que o Brasil no período, os outros três países que lideram o crescimento de casos na América Latina têm quantidades bem inferiores de casos.

Efeito indireto do suicídio
O suicídio é um indicativo claro do sofrimento que assola quem o pratica, mas ele tem um efeito posterior e indireto, que é o sofrimento e trauma que acomete familiares, amigos, pessoas próximas e as que presenciam ou que estão no local onde o suicida atentou contra a própria vida.

Isso tem acontecido com freqüência incomum no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, na Barra funda, onde em dois anos os servidores presenciaram quatro suicídios e cinco mortes. O último foi ainda mais traumático por envolver uma criança de apenas quatro anos, que foi levada pelo pai para o salto da morte.

As conseqüências nos trabalhadores podem ser desastrosas, mas sobre esse assunto trataremos em matéria especial que será veiculada na última semana do Setembro Amarelo.

Leia mais:
Reorganização produtiva e suicídio
Mitos e fatos sobre o suicídio

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