Prorrogação da entrega do IRPF mantém confisco sobre a renda do trabalho


23/04/2021 - Luciana Araujo
Defasagem da Tabela de IR é de 113,09%; novo prazo de encerramento da entrega das declarações vai até 31 de maio de 2021.

“Considerando que o IPCA desde 1996 acumulou em 346,69% e a tabela do IR foi atualizada em apenas 109,63%, para haver algum grau de justiça no imposto seria necessário um ajuste médio da tabela de 113,9%. Em 1996, a isenção atingia trabalhadores que ganhavam até nove salários mínimos, hoje, em 2021, os isentos são aqueles trabalhadores que ganham, no máximo, 1,73 salários mínimos”. Assim o economista e assessor do Sintrajud Washington Moura Lima explica didaticamente a injustiça tributária brasileira e o debate que o governo de Jair Bolsonaro camuflou ao adiar o prazo de entrega das declarações de imposto de renda das pessoas físicas neste ano, em razão dos impactos da pandemia do novo coronavírus nas vidas de todos.

O prazo de mais um mês desviou o foco do debate sobre o patamar confiscatório da tabela atual, que o presidente da República dizia que mexeria quando estava em campanha e não tocou no assunto em dois anos de mandato. Quando candidato, Jair Bolsonaro dizia que atualizaria a isenção do IRPF para quem ganha até cinco salários mínimos (R$ 5.500,00 hoje). A proposta, de outro lado, beneficiaria quem está no topo da escala salarial e os rentistas, com uma alíquota unificada de 20%, que aumentaria a contribuição da parcela média da população, maioria dos contribuintes. Diante das críticas, o presidente preferiu manter o benefício aos rentistas e o sacrifício de quem ganha menos ao invés de propor a atualização da tabela para corrigir a defasagem inflacionária, como mínimo.

Atualmente, a isenção do IRPF está limitada aos trabalhadores que recebem até R$ 1.903,98 (o que excede este valor na renda do trabalho é taxado de acordo com as faixas de 7,50%, 15%, 22,5% e 27,5%). Com a correção da tabela, o teto para isenção do IRPF seria de R$ 4.022,89. No caso do desconto relativo a dependentes, hoje os trabalhadores podem abater até R$ 2.275,08 do imposto da base de cálculo do IR. Se a tabela fosse atualizada, a dedução seria de R$ 4.850,40.

“O que eles liberam dos ricos é quase três vezes mais do que arrecadam da parcela cada vez mais pobre da sociedade brasileira”, ressalta Washington.

Robin Hood às avessas

O economista destacou à reportagem o estudo produzido pela Unafisco (a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), que demonstra que a atualização da tabela do IRPF representaria uma redução na arrecadação de R$ 111,78 bilhões — da qual o governo afirma não poder abrir mão —, mas mostra que a opção é taxar os pobres e aliviar os ricos. O Estado brasileiro poderia arrecadar R$ 315 bilhões somente neste ano caso fosse regulamentado o imposto sobre grandes fortunas, previsto na Constituição Federal, e alterada a política governamental de isenções fiscais — quase três vezes o montante retirado do bolso dos trabalhadores. Os dados evidenciam que “a granada” que o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou em reunião interna do ministério no ano passado ter plantado no bolso dos servidores públicos atinge todos os trabalhadores que conseguiram manter seus empregos.

Washington Moura frisa ainda que o problema do confisco do imposto de renda cobrado das pessoas físicas no Brasil se acumulou durante os governos FHC, que congelou por quatro anos a tabela do IRPF em um momento de inflação muito alta. “Os governos do PT ainda corrigiram uma parte do problema, embora não tenham recuperado as perdas acumuladas, mas houve correções na tabela próximas a inflação, desses anos. Desde 2016, com o governo Temer, novamente a tabela está congelada e o governo Bolsonaro, que prometeu na campanha eleitoral corrigi-la, não está fazendo isso”, conclui o economista.

Prazos

A alteração no prazo limite de entrega das declarações deste ano foi aprovado no Congresso Nacional e regulamentada na Instrução Normativa RFB nº 2.020, publicada no dia 9 deste mês. A Receita Federal destaca que “também foram prorrogados para 31 de maio de 2021 os prazos de entrega da Declaração Final de Espólio e da Declaração de Saída Definitiva do País, assim como, o vencimento do pagamento do imposto relativo às declarações.”

O pagamento do saldo do IRPF não descontado na fonte deve ser feito até 10 de maio de 2021, para a quota única ou até o final deste ano, em até seis parcelas pagas até 31 de dezembro deste ano. Por isso, quem enviar a declaração depois de 10 de maio deve pagar a primeira cota por meio de DARF, sem prejuízo de débito automático das demais prestações.

O cronograma de restituições não foi alterado, tendo início também em 31 de maio. Quem entregar a declaração antes, recebe antes a devolução do imposto pago a mais.

 

Tabela de incidência mensal do IRPF

Base de cálculo (R$)Alíquota (%)Parcela a deduzir do IRPF (R$)
Até 1.903,98
De 1.903,99 até 2.826,657,5142,80
De 2.826,66 até 3.751,0515354,80
De 3.751,06 até 4.664,6822,5636,13
Acima de 4.664,6827,5869,36

Fonte: Receita Federal

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