Propriedade privada e propriedade social


02/03/2017 - joebetho

“Não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas, pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua consciência.”

Nessa passagem do Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política, Marx coloca em evidência a divergência de princípios entre idealismo e materialismo filosóficos. Pois, não vivendo o homem senão em sociedade, necessariamente, para sua existência, ele entra em determinadas relações básicas, econômico-sociais; e, como reflexos de tais relações, produz suas ideias, princípios, categorias, resultando, assim, não serem mais do que produtos históricos e transitórios, suas próprias ideias,, princípios e categorias.

Erguendo-se a superestrutura (Arte, Moral, Direito, Estado, Política… enfim a Ideologia) sobre a base, esta determina aquela. Por isso, as relações superestruturais, ideológicas, têm raízes na forma concreta de propriedade, no conjunto de relações materiais, econômicas: “A forma concreta de propriedade revela o mais profundo segredo, a base oculta de todo o sistema social” (Marx – Engels, Manifesto do Partido Comunista); e Marx, em sua monumental obra, O Capital, cita Linguet: “O espírito das leis é a propriedade.”

E em cada época, caracterizada pór seu modo de produção e respectiva superestrutura, a sociedade se apresenta num determinado grau de desenvolvimento socioeconômico: comunismo primitivo, escravismo, feudalismo, capitalismo, socialismo (futuramente, comunismo científico); porquanto: “O moinho a braço dá a sociedade com o senhor feudal; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalismo industrial” (Marx, Miséria da Filosofia). Não significando, porém, que a nova sociedade não seja gerada no seio da anterior, pois é exatamente o que se dá – uma saindo das entranhas da outra: “infestada, segundo Marx, pelos estigmas da antiga sociedade de cujos flancos saiu”.

É evidente que na apropriação e posse de bens se concretiza propriedade; na apropriação e posse por poucos ou pela coletividade, principalmente dos meios de produção, reside a diferença entre capitalismo e socialismo. No sistema do “salve-se quem puder” é própria a acumulação, por poucos, de bens (capital); e é óbvio que, assim sendo, a grande maioria resta despossuída, causando espécie que certo economicismo exótico não seja capaz de perceber, em tão simples fato, a origem da maioria empobrecida, subjugada e explorada pela propriedade privada da minoria. “A propriedade privada atual, a propriedade burguesa, é a última e mais perfeita expressão do modo de produção e de apropriação baseado no antagonismo de classe, na exploração de uns pelos outros” (Marx – Engles, Manifesto do Partido Comunista).

Em 1789, a Revolução Francesa assestou o golpe decisivo no feudalismo, não só na França , mas em todo o mundo. Na luta contra os senhores feudais, idéias progressistas, ganhando foro, chegaram a ser proclamadas formalmente em Lei: soberania do povo, direitos inalienáveis, liberdade de palavra, de consciência etc.

Não obstante tão retumbantes declarações, em todo o mundo legalizou-se o domínio do capital sobre o trabalho. Não dispondo o trabalhador de capital nem de instrumento de trabalho , viu-se forçado a trabalhar para o capitalista, aceitando suas condições; resultando, de um lado, amplas possibilidades de exploração, e de outro, privações para a maioria, concluindo-se não ser o capitalismo essencialmente distinto do escravismo ou do feudalismo, porquanto se baseia na propriedade privada dos meios de produção.

Em 1917, se não mudada a base, Lênin não teria inaugurado o Socialismo em seu vasto país. No dia seguinte à Revolução Socialista de Outubro (26/10/17, de acordo com o calendário Juliano então vigente), foi decretado na Rússia: “A propriedade latifundiária da terra é abolida imediatamente sem qualquer indenização. É abolido para sempre o direito da propriedade privada sobre a terra. Toda a terra converte-se em patrimônio de todo o povo.” Em síntese, esse foi o dispositivo inicial com o qual Vladimir Ilitch Ulianov (Lênin) mudou o curso da História do século XX, sem o qual nenhuma mudança teria ocorrido em seu país e no mundo.

O que nos diz respeito à nossa pátria mãe gentil, frustradas as esperanças de milhões de brasileiros de que a Constituição de 1988, ora vigente, pusesse fim ao descalabro no tocante à terra; muito pelo contrário, não fazendo senão a nova Carta institucionalizar privilégios em nome de um direito de propriedade anacrônico, recrudesce a justa luta dos Sem-terra… Cadê a tão necessária e esperada Reforma Agrária, prometida, sucessivamente, em palanques de cacmpanhas eleitorais, por tantos candidatos à Presidência da República?! Um deles chegou a prometer uma reforma agrária mansa e pacífica!

Joel de Andrade Teixeira é servidor aposentado da Justiça Federal

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