A Comissão Especial da Câmara dos Deputados que discute o projeto de lei (PL) 7180/2014, conhecido como ‘Escola sem Partido’, encerrou os trabalhos na última terça-feira (11 de dezembro) sem deliberar sobre o texto. Após várias sessões, diante da falta de quórum e da resistência de entidades e parlamentares contrários à proposta que determinaria o cerceamento do que professores podem abordar em sala de aula, o presidente da comissão, deputado Marcos Rogério (DEM/RO), decidiu não mais convocar reuniões do colegiado.
Sem a votação e com o fim da legislatura, o projeto será arquivado. E a tramitação da propositura só poderia ser reaberta, a pedido do autor, em 2019. No entanto, Rogério deixa a Câmara para assumir uma das vagas de senador por seu Estado a partir do ano que vem. A tramitação de outra proposta no mesmo sentido terá de começará do zero, com a criação de uma nova comissão.
Para a direção do Sintrajud, o arquivamento foi uma vitória da organização dos educadores e suas entidades, que estiveram em todas as sessões da Comissão pressionando contra a aprovação do relatório do deputado Flavinho (PSC/SP). “Este projeto ameaça não só a democracia, mas a formação crítica dos cidadãos, é um grande retrocesso para educação brasileira”, afirmou Henrique Sales, diretor do Sindicato e servidor do TRT.
O projeto, defendido pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), e por setores conservadores e ligados à bancada religiosa do Congresso, estabelece que as escolas seriam obrigadas a afixar cartazes com deveres do professor. Entre essas obrigações o texto determina que “ao tratar de questões políticas, socioculturais e econômicas, apresentará aos alunos, de forma justa, as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito”. Muitos educadores passaram a questionar como lidar com temas como racismo e nazismo (já que há autores que defendem tais práticas, que no país são tipificadas como crime). Outra preocupação de professores é que o PL veta também abordagens do que qualifica como “ideologia de gênero” na educação e busca restringir o que docentes poderiam falar durante as aulas. No entanto, há no país farta literatura informando que muitas crianças vítimas de abuso sexual ou pedofilia são salvas após ouvir sobre o assunto em palestras na escola.
O estudo “Estupro no Brasil: vítimas, autores, fatores situacionais e notificações no sistema de saúde entre 2011 e 2014”, produzido pelo IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas), verificou que 69,9% das vítimas eram crianças e menores de idade. Mais de 10% sofriam de alguma deficiência física e/ou mental. Já o “Atlas da Violência 2018” aponta que foram registrados 45.497 estupros no sistema de segurança pública em 2016 – mais da metade dos casos envolvem crianças de até 13 anos.
Os defensores do projeto argumentam que os professores e autores de materiais didáticos vêm se utilizando das aulas e obras para tentar obter a adesão dos estudantes a determinadas correntes políticas e ideológicas.
A Frente Escola Sem Mordaça, composta por sindicatos e movimentos sociais de todo o país, defende que as leis atuais impedem qualquer tipo de abuso por parte dos professores e alerta que o projeto aponta para o cerceamento da atividade pedagógica e a imposição da mordaça no ato de lecionar.
“A vitória inicial dos professores sobre este projeto nos mostra que é possível enfrentar os ataques contra nossos direitos com unidade de todos os setores”, destacou Henrique Sales.