O Sintrajud promoveu debate virtual para discutir os impactos da Inteligência Artificial (IA) no trabalho, sobretudo no Poder Judiciário brasileiro, bem como os mecanismos e riscos associados ao uso dessa ferramenta, que intensifica a exploração do capital. A transmissão, ocorrida nessa quinta, 10 de outubro, contou com a participação do ex-dirigente do Sintrajud e da Fenajufe Démerson Dias e do pesquisador e professor da UEMG Matheus Viana. A atividade foi conduzida pela dirigente Isabella Leal (TRT-2).
Para os convidados, é preciso estarmos atentos à reestruturação da automação e às mudanças nas relações de trabalho, que vêm gerando transformações que precisam ser debatidas. Para eles, o labor no judiciário tem sido progressivamente plataformizado, datificado e centrado na extração de dados, subordinados ao uso das novas tecnologias. Nesse contexto, a Inteligência Artificial (IA) é um meio e não um fim para a realização do trabalho, cuja mão de obra vem sendo cada vez mais precarizada.
Embora a IA esteja presente no cotidiano do Judiciário, em 66% dos tribunais do país, aponta o CNJ, é imprescindível destacar, afirmaram os palestrantes, que estamos diante de um processo que é mais amplo do que apenas a incorporação de novas tecnologias. Trata-se de uma ferramenta que está sendo incluída nos processos decisórios do judiciário. Os dados, no entanto, precisam ser qualificados e subordinados, e isso é feito essencialmente por humanos, portanto, não é uma atividade neutra.
Matheus Viana, pesquisador e professor da UEMG apresentou o processo de produção da Inteligência Artificial, que envolve tecnologias baseadas em aprendizados de máquinas que supõem uma grande quantidade de dados a serem tratados; processo esse feito por trabalhadores precarizados de diferentes religiões do mundo, pessoas que alimentam os algoritmos, além de diversas outras formas de captação de dados.
Ele explicou ainda que predomina no imaginário que o desenvolvimento tecnológico, em especial no campo da IA, culminaria na substituição do trabalho humano por robôs. “Não temos dados consistentes para afirmar que ela está tornando o trabalho humano obsoleto, pelo contrário, a mão de obra humana tem sido ainda mais essencial e explorada”, disse, salientando que a IA é um recurso técnico e não intelectual.
Mencionou as estratégias de controle e gerenciamento laboral que passam a ser feitos por algoritmos, e entender como essa discussão nos atinge e as consequências disso em termos de direitos digitais e privacidade de dados é fundamental. No Brasil não temos uma legislação sobre a IA, apesar dos avanços da LGPD, o que torna o debate ainda mais complexo e fundamental o debate.
Outro que contribuiu com o debate foi o ex-dirigente do Sintrajud e da Fenajufe Démerson Dias, que tem estudado a questão. Ele chamou a atenção para evitar compreender a IA como um fim, quando, na verdade, trata-se de um meio para a realização do trabalho que não é neutro e intensifica a exploração do trabalho. “É importante que a gente, enquanto Sindicato, compreenda esse debate para até mesmo fazermos o enfrentamento necessário diante do uso dessa ferramenta”, apontou.
Démerson, que é servidor do TRE – São Paulo, explicou sobre os riscos da reestruturação e da plataformização no serviço público. Atendendo aos interesses das políticas neoliberais, que geram a desvalorização de tudo que é público, inclusive dos servidores, a IA implica em redução de salários, direitos e de postos de trabalho. “Cargos não serão mais preenchidos e o trabalho do servidor público será terceirizado”, alertou Démerson, que já abordou a problemática em discussões sobre carreira. Defendeu que quanto a esses aspectos a categoria não pode deixar de discutir, pois é preciso enfrentá-los enquanto coletivo.
Durante a live, os servidores e servidoras puderam tirar dúvidas com os palestrantes sobre diversos pontos da inclusão da ferramenta no cotidiano dos trabalhadores e a importância de fortalecer o espaço do Sindicato como instrumento de luta diante da precarização das condições de trabalho.
Ministro Barroso desrespeita servidores
De forma desrespeitosa, o Ministro Luiz Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal, proferiu uma declaração na qual demonstrou um plano para tornar oficiais de justiça “obsoletos” e desvalorizar o trabalho dos servidores. A fala foi feita em evento no Tribunal de Justiça de São Paulo em setembro deste ano.
Ao explicar as novidades implementadas no sistema de justiça no país com o uso da IA, Barroso afirmou que já está em estudo “a melhor maneira de reaproveitar os oficiais de justiça, que progressivamente vão se tornar obsoletos nesse novo mundo”. A fala repercutiu, gerando críticas ao ministro (Leia aqui nota do Sintrajud).
“O Sintrajud continuará debatendo o tema com a categoria, pois a live foi o primeiro passo para ampliação desse debate. Seguimos acompanhado a discussão sobre a implementação da Inteligência Artificial nos Tribunais e as reivindicações dos servidores, no processo de reestruturação produtiva, que impacta na carreira e na saúde dos trabalhadores”, destacou a diretora Isabella Leal, servidora do TRT-2. Como parte da centralidade da luta do Sindicato, durante o Encontro Estadual de Base o tema IA e condições de trabalho será abordado. A atividade ocorrerá nos próximos dias 18 a 20 de outubro e está com inscrição aberta.