A medida da administração do TRT-2 referente aos oficiais de justiça (Ato GP/CR nº 5/2017), em linhas gerais, realoca parte do oficialato nas varas, retirando-os da Central de Mandados. A função de oficial de justiça é tradicionalmente compreendida como trabalho externo ao tribunal e o Ato altera a natureza da tarefa, o que é em certa medida uma violência psicológica, no sentido de uma alteração arbitrária no trabalho desses servidores. Ao optar por essa profissão no concurso, o oficial de justiça pressupõe que as tarefas serão de forma geral externa. Alterar isso é, em certa medida, opor-se à opção profissional desses servidores.
Ademais, a medida coloca os servidores em uma situação de considerável incerteza, no sentido de não ficar claro o limite de suas atribuições. Considerando que nas varas o desvio de função já não é algo raro, fica a insegurança acerca da possibilidade de os oficiais serem solicitados pelos juízes a realizarem tarefas fora de sua alçada – na prática, uma forma de a administração utilizar oficiais para atender a demanda de trabalho nas varas que deveria ser atendida por novos servidores, pela via de novos concursos.
O ato pode ser compreendido como um desrespeito e um ataque aos trabalhadores que, se colocado lado a lado com outros atos, não seria um exagero dizer que estamos diante de um assédio moral organizacional.
Para a autora Lis Andréa Soboll, o assédio institucional se configura como “Interações entre o indivíduo e a organização ou a administração da empresa, as quais utilizam da violência e da hostilização, de forma continuada e crônica, na formulação de procedimentos e políticas organizacionais, na forma de mecanismos de gestão abusivos sem necessariamente existir um agressor personalizado”.
Assim como os outros servidores do tribunal, os oficiais sofrem com as perdas salariais e a falta de reajuste, com a diminuição do quadro devido à não realização de concursos, com o autoritarismo ora praticado por um ou outro juiz, mas que permanecem inadvertidos – chegando a casos extremos como juíz abrindo processo criminal contra oficial de justiça. Outras ações e omissões da administração também atingem os oficiais de justiça negativamente, como a ausência de políticas efetivas em relação à segurança desses servidores.
As pesquisadoras Liz Soboll e Thereza Gosdal apontam que esse tipo de assédio “se esconde no ‘poder diretivo’ legítimo do empregador, utilizado de forma abusiva, e envolve ofensa aos direitos fundamentais dos trabalhadores”. Fica evidente no próprio ato da Administração do TRT a tentativa de se escudar nessa legitimidade, ao apontar que competem aos oficiais de Justiça “as atribuições relacionadas com a execução de mandados e atos processuais em processos físicos e eletrônicos”, isto é, reforçando que, na interpretação da Administração, essa medida estaria dentro de suas atribuições possíveis.
Ademais, a autora também discorre sobre o discurso freqüente por trás dos atos de assédio moral institucional: “A incidência e a fluidez do assédio organizacional no contexto do trabalho atual encontram suporte no discurso que busca justificar tais práticas como necessárias e legítimas, em nome da razão e da necessidade, dentro de uma lógica estritamente econômica”. O discurso da Administração não difere muito do que foi apontado pela autora e apóia-se na ideia de que o PJE alterou a dinâmica de trabalho, possibilitando que o trabalho exercido externamente pelo oficial de justiça possa ser realizado internamente, dentro das varas.
Assim como o assédio moral interpessoal, o assédio moral organizacional/institucional também deve ser enfrentado de forma coletiva, reivindicando uma organização do trabalho que não afete negativamente a moral e a saúde dos trabalhadores.
Essa ação, aparentemente, é parte de uma política de cortes e enxugamento devido à crise, visando utilizar trabalhadores supostamente menos sobrecarregados (oficiais de justiça) para ajudar nas áreas mais sobrecarregadas (varas), ao invés de enfrentar o problema da forma correta, que é realizando novos concursos.
(*) Daniel Luca é psicólogo é assessor do Sindicato na área de saúde do trabalhador.