Nota: Contra a política e o golpismo de Bolsonaro, mobilizar e lutar em defesa dos direitos, dos serviços públicos e das liberdades democráticas


16/07/2021 - Redação
Sintrajud repudia declarações que atacam servidores da Justiça Eleitoral e reafirma a luta pelo Fora Bolsonaro

Foto: Cláudio Cammarota

Nos últimos dias, em meio às investigações da CPI da pandemia no Senado, após grandes manifestações populares contra o seu governo, e vendo cair ainda mais seus índices de popularidade, Jair Bolsonaro lançou-se em mais uma de suas movimentações golpistas. Insinuou e reiterou que não pretende aceitar o resultado das eleições caso não lhe agrade e aumentou o tom das acusações e desqualificações à Justiça Eleitoral.

Tudo isso ocorre após o Brasil haver ultrapassado a injustificável marca de mais de meio milhão de mortos pela pandemia (excluída a possível subnotificação), sob uma gestão que atentou contra os protocolos de saúde pública, incentivou o uso de remédios sem eficácia comprovada e com efeitos colaterais muitas vezes graves, ridicularizou as medidas sanitárias e de distanciamento social, e não apenas desacreditou as vacinas como foi comprovadamente negligente em promover a vacinação da população, como vem sendo demonstrado. Centenas de milhares de vidas poderiam ter sido salvas, não fosse uma política que vem sendo justificadamente caracterizada como genocida. No recente escândalo, depois de vários dias de silêncio, Bolsonaro acabou por admitir que tomou conhecimento das denúncias em torno da negociação da vacina Covaxin e não conseguiu afastar de si as evidências de prevaricação.

Os ataques ao sistema eleitoral intensificam-se na mesma medida em que Bolsonaro vê aumentar cada vez mais a insatisfação com seu governo, e sua identificação crescente, perante a opinião pública, com casos de corrupção. Ao patrocinar sucessivos ataques à lisura das eleições, falar abertamente em fraudes sem apresentar nenhuma prova ou indício, além de tentar desviar o foco dos escândalos e de deslegitimar o sistema que o elegeu, o presidente coloca também em dúvida a capacidade e a idoneidade dos servidores da Justiça Eleitoral, postura que deve ser veementemente repudiada. Bolsonaro chegou a ser notificado pelo corregedor-geral da JE para apresentar provas de suas denúncias, porém até aqui limitou-se a afirmar em conversa com apoiadores que as apresentaria “se quiser”.

O desprezo do governo Bolsonaro aos servidores e ao serviço público é uma regra e se expressa inclusive em sua proposta de “reforma administrativa” (PEC 32/2020), que entre muitos ataques visa também enfraquecer os servidores concursados e favorecer indicações políticas, que em muitos casos estão ligadas à operação de esquemas de corrupção, como tem apontado a CPI da pandemia, entre outras diversas denúncias sob investigação.

Conforme fica mais acuado pelas denúncias e pela impopularidade, Bolsonaro eleva sua retórica golpista, e tenta colocar as forças militares a serviço de seus planos, além de suas ligações com setores das chamadas milícias. Entre seus movimentos estão a ocupação por militares de milhares de cargos de confiança no governo, o fomento a grupos paramilitares, com sua política de armas, o incentivo à insubordinação de polícias militares, as “pregações” a oficiais de baixas patentes. Merece destaque a relação estabelecida com a cúpula das Forças Armadas, que teve como episódio recente a troca no ministério da Defesa e a queda simultânea dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, com o realinhamento subsequente.

Esse arranjo revelou-se de modo mais expresso com a nota absolutamente despropositada e com caráter explicitamente golpista do ministro da Defesa e dos comandantes das Forças, publicada na noite de 7 de julho, em reação a uma fala do presidente da CPI da pandemia. Em um curto texto, tentaram censurar o exercício do poder legislativo, afirmaram-se como “fator essencial da estabilidade do País” e lançaram ameaças. Em seguida, o comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Carlos Junior, aumentou o tom das ameaças à CPI, na forma de “um alerta”, em entrevista ao jornal ‘O Globo’, no que foi endossado pelo comandante da Marinha, o almirante de esquadra Almir Garnier Santos.

Não se pode deixar de mencionar também o abafamento do caso do general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, que participou de ato político em palanque com Bolsonaro, conduta expressamente vedada a militares da ativa e passível de punição – que não ocorreu. Pazuello foi processado pela Procuradoria da República no DF por improbidade em sua desastrosa gestão da pandemia. E acaba de ser revelado que o ex-ministro chegou a participar de negociação de vacinas com sobrepreço, com intermediários, fora da agenda, diferentemente do que afirmou à CPI, onde também é investigado.

A condescendência com que reagiram os demais Poderes, além da grande mídia comercial, a essas movimentações de Bolsonaro, assim como em outros episódios nos últimos meses e anos, é mais uma expressão da duvidosa solidez das instituições, de que tanto se fala, e do alto grau de tolerência e permeabilidade do sistema político brasileiro ao autoritarismo, à segregação e à violência como meio de “solução” de demandas sociais e de prevalência de interesses empresariais e particulares em detrimento dos direitos e condições de vida da ampla maioria da população.

Esse sistema político foi erigido com a chamada redemocratização após duas décadas de uma sangrenta ditadura civil-militar, derrubada após ondas de pressão popular. Seu marco central é a promulgação da Constituição de 1988, e tem cada vez mais se revelado como um grande pacto de conciliação e acomodação de forças e interesses dominantes. As conquistas sociais e políticas da nova Carta começaram a ser interditadas e desmontadas desde o dia seguinte e progressivamente ao longo de todas essas décadas, e foram mantidas, em camadas distintas, as bases de perpetuação de uma democracia de baixa intensidade, de um estado de viés autoritário, uma economia periférica e uma sociedade profundamente desigual.

Os militares e civis que operavam o regime ditatorial e suas atrocidades saíram ilesos de responsabilidades pelos crimes cometidos, diferentemente do que ocorreu em países vizinhos. Muitos desses agentes permaneceram nos espaços de poder institucional junto às elites oligárquicas, colocando para debaixo do tapete as sujeiras e mantendo latente a herança do período ditatorial. E hoje, por mais que neguem no discurso, são parte indissociável do núcleo central do governo Bolsonaro e corresponsáveis pelas consequências de suas políticas.

Essa constatação é fundamental para compreendermos o caráter e os limites da democracia representativa no Brasil e das atuais instituições que lhe sustentam, e como reagem – ou não – ao golpismo e suas variações. E também para explicar o retorno ao centro do poder político de setores vinculados ao retrocesso e ao obscurantismo, personificados na figura de Jair Bolsonaro, embora nunca tenham efetivamente saído de cena. Um candidato que surfou na onda da crise política e lançou-se como “antissistema”, embora sendo dele parte orgânica, além de ardoroso defensor das ditadura e da tortura e disseminador de preconceitos e notícias falsas.

Por isso, como já argumentamos em nota anterior, os trabalhadores não podem apostar nessas mesmas instituições para conter os ímpetos autoritários do mandatário e de seus aliados, nem para ver atendidas as suas mais elementares reivindicações democráticas e sociais. Grande parte dos setores políticos que hoje se opõem ao governo buscam promover ajustes pontuais de rota, ou promover desgastes calculados visando as próximas eleições. E divergências superficiais à parte, há entre eles um acordo na implementação da agenda ultraliberal de desmonte dos direitos sociais e dos serviços públicos, e da entrega de todos os recursos e patrimônio públicos à exploração privada – razão pela qual ainda há setores expressivos que dão sustentação a Bolsonaro.

O calendário eleitoral não contempla o calendário de nossas necessidades. Não é possível esperar até 2022 por uma solução, nem consentir com a continuidade regular desse projeto, notadamente sob o atual cenário de tragédia sanitária e humanitária. Já são incontáveis os crimes de responsabilidade praticados e mais de uma centena os pedidos de impeachment até aqui engavetados pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, em continuidade à postura de seu antecessor, Rodrigo Maia. O fator definidor será o grau de mobilização popular.

Somente com ampla mobilização popular poderemos deter qualquer ensaio autoritário e defender nossos direitos, conquistados com muito suor e sangue ao longo de gerações. Parte dessa luta é também o combate à “reforma administrativa” de Bolsonaro e Paulo Guedes, que atenta contra o que ainda há de democrático no interior do estado brasileiro – o trabalho diário de milhões de servidoras e servidores públicos de todas as esferas, em todo o país, em prol da população, apesar de todas as dificuldades e do desrespeito de que são alvo. Por isso seguimos em defesa dos serviços públicos e de todos os direitos neles materializados, e reafirmamos: Fora Bolsonaro e todo o seu governo!

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