30 anos da Constituição: Nos somamos ao repúdio ao “movimento” de Toffoli


05/10/2018 - Luciana Araujo

Soou como um tabefe às vítimas e a qualquer um na sociedade que defenda os princípios basilares da Constituição de 1988 a declaração do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, de que o golpe empresarial-militar desferido contra o país em 31 de março de 1964 e a ditadura que se abateu por 21 anos teria sido um “movimento”.

Para piorar, o chefe da Corte guardiã da Carta Magna referiu-se a um ex-preso político que foi também torturado para “sustentar teoricamente” sua conclusão: o historiador Daniel Aarão Reis. Em entrevista à versão on line da revista ‘Carta Capital’, Aarão Reis rejeitou de pronto a tese do ministro e apontou o segundo erro histórico de Toffoli, a autoria de tal “tese”.

A declaração do ministro não poderia ter sido feita em momento mais infeliz, quando setores sociais vão às ruas pedir nova “intervenção militar” de forma absolutamente contrária à Constituição, e quando direitos são atacados de forma inédita no pós redemocratização.

Pior ainda, o presidente do STF afaga os ditadores após diversos militares na ativa e na reserva, incluindo um candidato à vice-presidência da República, terem burlado a Constituição defendendo a possibilidade de ação das Forças Armadas ou “autogolpe” contra a “anarquia”.

Toffoli emitiu a estapafúrdia opinião na última segunda-feira (1º de outubro). Ironia da história, o comentário deu-se em seminário sobre os 30 anos da Constituição, na Faculdade de Direito da USP. Quatro dias após o presidente do STF fazer publicar no Diário Oficial a nomeação do general da reserva Fernando Azevedo e Silva para exercer cargo comissionado CJ-3 em seu gabinete.

Nomeação do general Fernando Azevedo e Silva para o gabinete da Presidência do STF.

Ex-Comandante Militar do Leste, Azevedo e Silva teria sido indicado à Presidência do Supremo pelo comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas. Por sua vez, Villas Bôas é aquele general-político que recentemente sentiu-se à vontade para ir ao Twitter pressionar o STF à véspera de julgamento, alertando que a Arma estaria atenta “às suas missões institucionais”, e que, na semana do atentado ao candidato líder nas pesquisas, declarou ao jornal ‘O Estado de S.Paulo’ que o próximo governo eleito pode “ter sua legitimidade questionada”.

A transcrição da fala de Toffoli, publicada no portal ‘iG’ e disponível em vídeo divulgado no portal ‘G1’, mostra ainda que o ministro avalia que se os militares cometeram algum erro naquele período foi apenas o de ter permanecido no poder.

“Os militares foram um instrumento de intervenção e, se algum erro cometeu, foi, ao invés de ser o moderador que, em outros momentos da história, interveio e saiu, eles acabaram optando por ficar. E o desgaste da legitimidade em todo esse período que acabou recaindo sobre essa importante instituição nacional que são as Forças Armadas”, disse Toffoli. Para em seguida justificar que “por isso que hoje eu não me refiro mais nem a golpe e nem a revolução de 1964. Eu me refiro a movimento de 1964”

Dias Toffoli, presidente do STF

Assista ao vídeo aqui.

Diante do constrangimento geral, nesta quinta, 04, durante as comemorações à Constituição na Corte que comanda, tentou emendar-se. Não conseguiu. E em artigo no jornal ‘O Estado de S.Paulo’ neste dia da aniversariante, exclama “vida longa” à Constituição de 1988, ao mesmo tempo que advoga a continuidade de sua descaracterização por meio de novas emendas como uma “necessária” reforma da previdência.

Repudiamos ver o presidente da máxima Corte de Justiça brasileira relativizar a censura, as prisões arbitrárias, as torturas e assassinatos cometidos pelo Estado de ao menos 380 pessoas, entre as quais o portal ‘Memórias Reveladas’ resgata que há ainda 147 desaparecidos. Tudo isso pouco depois da Comissão Interamericana de Direitos Humanos condenar pela segunda vez o país pelo descumprimento do dever constitucional de apurar os crimes da ditadura empresarial-militar e punir os responsáveis. Sobre a decisão da CIDH, proferida em 4 de julho no caso Vladimir Herzog, o presidente do Supremo mantém absoluto silêncio. Talvez a nova leitura do ministro sobre os anos de chumbo explique o porquê.

Diretoria executiva do Sintrajud

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