Na 10ª semana de atos, marcada pelo combate ao racismo, Lira admite dificuldade em votar PEC 32


19/11/2021 - Helcio Duarte Filho
Mobilizações em Brasília associaram luta contra a 'reforma' Administrativa ao combate à discriminação racial; campanha vai prosseguir até que PEC seja arquivada

A décima semana de mobilização presencial em Brasília contra a ‘reforma’ administrativa (PEC 32) foi particularmente especial. Primeiro, porque foi demarcada por referências às lutas do povo negro contra o racismo, a discriminação e por igualdade social. Segundo, porque terminou com as declarações do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), admitindo, pela primeira vez, não ver condições de pautar a proposta em Plenário este ano. 

Não que os servidores e servidoras que participaram das mobilizações tenham alimentado avaliações de que essa briga está ganha. Longe disso. Mesmo porque o principal defensor da ‘reforma’ no Congresso não foi taxativo de que não levará a PEC 32 a voto.

O discurso do presidente da Câmara até começa assim, porém termina mencionando que a proposta está pronta para ser apreciada no Plenário. “Nós temos quatro semanas pela frente. Temos matérias importantes ainda para votar. Na reforma Administrativa, nós cumprimos o que falamos, não mexemos em nenhum direito adquirido, não mexemos no sistema de aposentadoria. Com a pouca mobilização de quem quer a PEC e com o pálido apoio do governo, a gente não tem como trazer uma matéria dessa à pauta. Ela está pronta para o plenário a qualquer momento”, disse a jornalistas, na quinta-feira (18), após reunião com líderes partidários que tratou da pauta da semana seguinte.

Também não é recomendado esquecer que tal declaração, talvez não casualmente, ocorre uma semana após o presidente Jair Bolsonaro, em sua live semanal, e o ministro Paulo Guedes (Economia), em um evento organizado por banqueiros, voltarem a defender aprovar a ‘reforma’ em 2021. Manifestações também marcadas pelo reconhecimento explícito de que o governo barganha com empresários a troca de uma isenção fiscal de R$ 16 bilhões nas folhas de pagamento, em dois anos, por apoio à PEC 32 e à PEC dos Precatórios, batizada pelos trabalhadores de ‘PEC do Calote’.

Mais uma semana 

O que é certo é que se conquistou mais uma semana sem que o governo tenha conseguido levar a PEC 32 a votação – proposta que lideranças governistas já cogitaram aprovar em poucos meses no Congresso, quando teve início a sua análise na Câmara no primeiro semestre.

“São dois meses de luta aqui de luta em Brasília contra essa PEC 32, mas desde que ela foi apresentada (em setembro de 2020] estamos dialogando com a população”, observa a servidora Luciana Carneiro, diretora do Sintrajud e que integrou a delegação do sindicato nesta semana na capital federal. Ela ressalta que a possibilidade de levar essa luta às ruas, com todas as precauções sanitárias, permitiu avançar na campanha e conquistar apoio e receptividade por parte da população. 

A servidora também destaca o fato da mobilização contra a PEC 32 ter sido pautada  nestes dias pela Semana da Consciência Negra, parte da luta contra o racismo. “Foi uma movimentação muito importante a nossa encenação do derramamento do sangue do povo negro, as nossas palavras de ordem ‘Fora Bolsonaro racista'”, disse, sobre os atos que também associaram a ‘reforma’ a uma medida de discriminação racial. Isto por que coloca em risco a sobrevivência de serviços públicos que atendem a direitos sociais que, se destruídos, atingirão em cheio o povo negro.

Para Luciana, a declaração de Arthur Lira “foi fruto da mobilização”. “Eles achavam que essa PEC seria fácil de ser aprovada como foi a reforma da Previdência em 2019. Só que eles encontraram uma barreira de categorias, as trabalhadoras e trabalhadores do setor público organizados, para garantir direitos não só do setor, mas para o conjunto da população”, disse. “Isso tudo é fruto da nossa luta, da nossa mobilização, da nossa articulação e das nossas construções. Semana que vem será mais uma grande semana de mobilizações. Esperamos que mais uma vez a PEC não seja pautada. Não que acreditemos na palavra do Lira. Nem ele, nem Guedes, nem Bolsonaro merecem nossa confiança, sabemos que o desejo deles é aprovar essa PEC para agradar ao mercado e aqueles que podem bancar as suas eleições em 2022”, assinala.

Preocupação com os protocolos sanitários

Desde que o Sintrajud retomou a convocação de atividades presenciais de mobilização, a preocupação com os cuidados e protocolos sanitários de prevenção à covid-19 tem sido uma constante – o que passa por uso de máscaras, álcool gel, distanciamento e rotina de testagens.

No entanto, constatou-se suspeita de contaminação em uma das integrantes da delegação. Imediatamente foram tomadas medidas de isolamento e testagem em todos. O resultado deu positivo para a servidora Maria Ires Lacerda e negativo para os demais. Ires passa bem, está em casa e em isolamento.

“A gente está tomando os cuidados. Estou isolada para não contribuir para proliferação do vírus. Foi um choque quando recebi o resultado, pois sempre tomo muito cuidado, mas com tanto carinho, tanto apoio, tanta solidariedade estou me sentindo melhor”, disse a dirigente do Sintrajud. A servidora lamenta que a insistência do governo em pautar um projeto desta magnitude em plena pandemia, como vem sendo denunciado, acabe expondo trabalhadores que buscam impedir a destruição do serviço público. “E mesmo tomando todos os cuidados, sabemos [da gravidade] do vírus, a gente pega sem saber como”, disse, reforçando a constatação de que a pandemia não acabou.

* ERRAMOS: Na verdade, a semana de mobilizações em Brasília contra a ‘reforma’ de 15 a 18 de novembro foi a décima na qual o Sintrajud esteve presente.

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