Modelo de mineração ‘privatizado’ e ‘transnacional’ levou a desastres, diz movimento de atingidos


29/01/2019 - Luciana Araujo

O segundo desastre ambiental envolvendo a mineradora Vale no espaço de três anos é resultado de um “modelo de mineração que é privatizado e transnacional, inteiramente a serviço do lucro das grandes empresas”. Quem afirma é o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que atua nas áreas afetadas em Minas Gerais por meio de brigadas que buscam sobreviventes e ajudam a socorrer vítimas e seus familiares.

O rompimento de barragem de rejeitos da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), que faz parte do Complexo Paraopeba, ocorreu na sexta-feira (25). Estima-se que 14 milhões de metros cúbicos de resíduos provenientes da exploração de minério de ferro tenham sido despejados no Rio Paraopeba, afluente do São Francisco. O Corpo de Bombeiros já havia confirmado, até a tarde da segunda-feira (28), a morte de 60 pessoas, mas estimava em 292 o número de desaparecidos. A tragédia repercutiu no país e no mundo e gerou tristeza e indignação, parte dela expressada nas redes sociais.

‘Foi um crime’

O MAB – movimento nacional que existe há 20 anos e defende as populações atingidas por barragens – afirma que o que ocorreu em Brumadinho foi um “crime continuado da Vale contra o povo brasileiro” e uma tragédia anunciada que poderia ter sido evitada. Faz três anos e dois meses, outro desastre ocorreu em Mariana, também em Minas Gerais, deixando pelo menos 19 mortos e destruindo a bacia do Rio Doce. Até hoje ninguém foi punido e nenhuma família recebeu as casas prometidas como parte da indenização.

“Mais uma vez essas grandes empresas e a conivência dos governos demonstram as suas prioridades pelas taxas de lucro em detrimento da qualidade de vida da população. Não há desenvolvimento regional, há destruição de vidas e contaminação dos rios e da natureza”, diz trecho de nota divulgada pelo movimento.

Integrante da coordenação do MAB, Robert Rodrigues disse que a Vale vem tentando deslegitimar os movimentos sociais que atuam em torno da defesa dos atingidos por barragens e da população ribeirinha. “A Vale está tentando se desresponsabilizar e culpar os movimentos sociais”, disse a professores que participavam do congresso nacional da categoria dos docentes das instituições públicas do ensino superior, em Belém (PA). Segundo o coordenador do MAB, que pediu apoio militante e de estrutura ao movimento, a previsão é de que 19 municípios sejam atingidos pelo desastre, que também classificou como um “crime” da Vale, assim como ocorrera em Mariana.

ONU também fala em crime

A Organização das Nações Unidas (ONU) também defendeu que o caso seja investigado como um crime. “Esse desastre exige que seja assumida responsabilidade pelo o que deveria ser investigado como um crime. O Brasil deveria ter implementado medidas para prevenir colapsos de barragens mortais e catastróficas após o desastre da Samarco de 2015”, disse à BBC News Brasil Baskut Tuncak, relator especial das Nações Unidas para Direitos Humanos e Substâncias Tóxicas, referindo-se à tragédia de Mariana.

Privatização

A então Vale do Rio Doce foi privatizada em 1997, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A entrega da empresa à iniciativa privada foi marcada por um forte movimento de resistência e uma série de decisões judiciais provisórias suspendendo o leilão. O consórcio controlador da ex-estatal tem como principal acionista o Bradesco.

Em 20 anos a empresa cresceu, mas voltada quase que apenas para a exploração e exportação de minérios, tendo a China como principal destino dos recursos do subsolo brasileiro. No período, as políticas econômicas adotadas no país reduziram o peso da indústria na economia nacional e projetaram o país como um grande exportador de commodities, produtos de origem primária de baixo valor agregado.

As privatizações são defendidas pelo governo de Jair Bolsonaro, cujo ministro da Economia, Paulo Guedes, vem defendendo privatizar tudo o que for possível. A proposta, porém, não é popular. Recente pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha confirmou a posição contrária às privatizações como majoritária na população brasileira.

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