A diretoria do Sintrajud vem fazendo críticas ao projeto de reestruturação administrativa da Justiça Federal desde 2017. A principal é que o projeto hoje denominado e-Vara parte da premissa de adequar o funcionamento da justiça às restrições orçamentárias impostas pela Emenda Constitucional 95, que congela o orçamento primário até 2036.
A direção do Sindicato também manifestou preocupação com os impactos que as mudanças terão na saúde física e mental dos servidores.
Vale ressaltar que, embora algumas demandas apresentadas pela entidade tenham sido atendidas, como a melhor distribuição das funções comissionadas; o compromisso de que não haverá remoções compulsórias; e a inclusão nas diretrizes do projeto da necessidade de assegurar condições que não prejudiquem a saúde dos trabalhadores, ainda há muitas lacunas e proposições que não foram incorporadas.
Diante do anúncio do projeto-piloto no Fórum da JF em Santos e da abertura de edital de chamamento para servidores de todo o estado que pretendam trabalhar na Central de Processamento Eletrônico (CPE) a ser instalada naquele fórum em fevereiro, a diretoria do Sindicato divulga a nota técnica abaixo para o conjunto da categoria.
Procurada pelo Sintrajud, a coordenação do projeto informou que os servidores lotados na JF/Santos não precisarão se inscrever no processo seletivo. Os que não forem compor a e-Vara serão automaticamente designados para a CPE. Segundo informado à direção do Sindicato pela administração, o edital destina-se a servidores de outras subseções que tenham interesse em trabalhar na CPE, presencialmente, em teletrabalho ou trabalho remoto. Para a direção do Sintrajud, em relação ao edital publicado não há segurança do aproveitamento automático dos servidores na CPE. Os critérios para seleção dos colegas de Santos que vão compor a e-Vara ou CPE continuam sem a devida publicidade, o que tradicionalmente resulta nas escolhas subjetivas historicamente questionadas pelo Sindicato.
Leia abaixo a íntegra da nota, cuja versão em PDF pode ser baixada clicando aqui.
Posicionamento da diretoria executiva do Sintrajud sobre o Programa e-Vara
Foram publicados em 15 de setembro deste ano os atos normativos que instituíram o Programa para o Processamento Judicial Eletrônico na Seção Judiciária de São Paulo, antes batizado “Rede PJe” e agora denominado “Programa e-Vara”. E neste dia 11 de novembro foi publicado o Edital de Chamamento 3/2019 – que abriu inscrições para os servidores que tenham interesse em atuar no projeto-piloto[1] da Central de Processamento Eletrônico (CPE) que será implantado na Subseção Judiciária de Santos, a partir de fevereiro de 2020.
Preliminarmente, o SINTRAJUD vem alertando desde o início dos debates sobre o projeto que a reestruturação organizacional em questão tem uma premissa errônea. Sobre isso, desde 2017 o Sindicato posiciona-se contrariamente, dado que não é factível elevar a qualidade da prestação jurisdicional sem investimento, nem oferecer serviço público com a necessária qualidade mantendo-se e aprofundando-se o déficit de servidores verificado atualmente na Terceira Região. No entanto, seguiu orientando a Administração no desenvolvimento do projeto a compreensão de que “não há espaço para as soluções adotadas no passado (“mais varas”; “mais cargos”; “mais concursos”)”[2].
A lógica de redução de custos, intensificada de forma acelerada após a promulgação da absurda Emenda Constitucional 95, que congela os gastos públicos até 2036, leva à dinâmica evidentemente insustentável, de fazer cada vez mais com menos recursos, sobrecarregando os servidores e ameaçando os seus direitos e da população em geral.
A CPE-Santos e sua respectiva estrutura organizacional já estão em fase de implantação, com a remoção do Administrativo, Distribuição e Central de Mandados (CEMAN) do primeiro pavimento do Fórum. A readequação do terceiro andar juntou o Administrativo, a CEMAN e ainda servidores do gabinete da 4ª Vara Feral no mesmo piso da Central de Conciliação, Contadoria, Informática e Perícias. O sexto pavimento está em fase de desmontagem e os servidores da 3ª e 4ª Varas foram alocados em espaço exíguo, onde já funcionavam as Secretarias da 1ª e 2ª Vara – chamando a atenção a divisão de equipes funcionais de uma mesma Vara em andares diferentes. Os demais setores acima mencionados estão provisoriamente alocados de forma precária dentro do Fórum.
E a publicação do Edital de Chamamento trouxe aos trabalhadores o temor de qual será o futuro de quem não for selecionado a integrar a equipe da e-Vara. Os critérios não objetivos de seleção – a) verificação de histórico funcional e experiência profissional e b) realização de entrevista – potencializam o medo de “descarte” de servidores avaliados como “sem perfil de assessoria”. O que seria o referido perfil exatamente? Quais critérios objetivamente definiriam o “perfil de assessoria”? Como ficará a lotação de servidores inscritos no processo seletivo que não forem aproveitados nem nas e-Varas nem na CPE?
Na avaliação da Diretoria do Sintrajud, o processo de chamamento deve servir tão somente para preencher cargos vagos, após o aproveitamento de todos os servidores e servidoras lotadas em Santos, e deve ser absolutamente objetivo, com oportunidades iguais a todos que postularem remoção. Os servidores da JF/Santos, por sua vez, não podem correr nenhum risco de serem colocados à disposição da Diretoria do Foro.
Todos os servidores aprovados em concurso público de provas e títulos estão aptos ao desempenho das atribuições do cargo e não podem ser descartados ou preteridos com base em critérios que violam os princípios da igualdade e da impessoalidade.
O projeto iniciado em 2017, quando a Presidência do TRF incumbiu a Diretoria do Foro da Justiça Federal de São Paulo de formular a mudança estrutural das atividades dos servidores, respondendo a consolidação do Processamento Judicial Eletrônico, foi originalmente denominado “Rede PJE”. Desde então, o SINTRAJUD sempre destacou a necessidade de democratizar a discussão, para envolver o conjunto da categoria que será a grande impactada pelas mudanças. Entretanto, o debate ficou restrito a poucas esferas e realizado de forma insuficiente.
Ainda que a Administração tenha oportunizado ao SINTRAJUD apresentar seu posicionamento sobre o tema, em reunião com os coordenadores do projeto e por escrito, isso por si só não chancelou a reestruturação como amplamente discutida.
O SINTRAJUD também considera que foi insuficiente a exposição do projeto em algumas conferências, com participação facultativa dos servidores e prazo para envio de e-mails. Fomentar a participação requer um método, com rodadas de reuniões nos locais de trabalho, com dispensa dos trabalhadores das suas tarefas diárias e dedicação exclusiva de tempo necessário para discutir e formular posicionamento, o que não ocorreu.
Prova da ausência do devido debate é que nas duas subseções “voluntárias” à implementação do projeto-piloto, Santos e Campinas, os servidores não foram devidamente consultados e envolvidos. Os magistrados que dirigem estas unidades manifestaram dispor dos serviços prestados pelos trabalhadores sem o menor diálogo com a categoria.
Neste sentido, o SINTRAJUD, além de destacar as preocupações com a saúde dos servidores, propôs uma série de medidas para evitar condições inadequadas de trabalho e defender mudanças que de fato dinamizem a administração, sem prejudicar os servidores, sendo as principais:
Muito pouco do que foi proposto pelo SINTRAJUD foi acolhido. Em relação ao projeto original, houve pequena melhora na distribuição das funções comissionadas entre as unidades. Foi incorporada a demanda para impedir remoções compulsórias e incluída nas diretrizes do projeto a preocupação com o impacto sobre a saúde dos servidores.
O compromisso de não levar a cabo remoções compulsórias representa um avanço. Porém, a medida vem acompanhada da obrigatoriedade de o/a servidor/a aderir ao trabalho remoto, com um posto de trabalho na unidade da Justiça onde reside e subordinado a uma CPE distante, desagregado da equipe à qual pertence, o que poderá causar graves problemas adaptação e impactos à saúde.
Na distribuição das funções, o projeto original previa para a e-Vara, com 8 servidores, 1 CJ-3, 3 FC5 e 4 FC4. Ao final, restou aprovado para o mesmo número de servidores 1 CJ3, 3FC5, 2FC4 e 1 FC 3.
Na Central de Processamento – CPE, para onde serão deslocados ⅓ dos servidores das Varas, as funções serão de valores menores e haverá mais servidores sem função. A CPE-Santos, com 20 servidores, será comandada por 1 FC6 e contará com 4 FC5, 4 FC3 e 4 FC 2.
Ainda que o projeto tenha melhorado neste aspecto por causa da intervenção do SINTRAJUD, permanece a distorção com servidores melhor remunerados em uma unidade em relação à outra. Tal fato preocupa ainda mais porque a CPE ficará incumbida dos atos padronizados, sem cunho decisório, “atividade meio”, setor de menor prestígio, que será pressionado pela terceirização.
O argumento da Administração para manter mais FCs nas e-Varas é a suposta necessidade de atrair e manter servidores “melhor qualificados” para trabalho supostamente mais árduo e de maior pressão. O SINTRAJUD não concorda com isso, pois todas as unidades prestam serviço de igual relevância e, por maior que seja a quantidade ou complexidade do trabalho, cabe à Administração proporcionar ambiente saudável e agradável, não se prestando a FC como contrapartida à superexploração que adoece.
O SINTRAJUD reafirma sua posição de que as mudanças administrativas e as transformações oriundas do desenvolvimento tecnológico-científico devem estar a serviço da sociedade e ser usadas para propiciar melhores condições de trabalho aos servidores.
O Programa e-Vara, no entanto, concretamente só aponta para o aumento da produtividade, eliminação de suposto “tempo ocioso” do servidor, intensificação do ritmo de trabalho, sem medidas concretas para a melhoria das relações de trabalho e preservação à saúde do servidor. Nesse aspecto, só houve a incorporação da “preocupação” com o ambiente de trabalho e com o impacto das tecnologias sobre a saúde dos servidores como diretriz do programa (Prov. CJF3R, art. 2, VII).
Não se trata de oposição à inovação, mas de reivindicar que ela traga medidas concretas que beneficiem os trabalhadores, como redução da carga de trabalho; redução de jornada; medidas de promoção à saúde, tais como mobiliário adequado, aferido por laudos de ergonomia, intervalos intrajornadas, ginástica laboral, entre outras.
Mas não é isso que se verifica no Programa. Ao contrário, vislumbra-se a intensificação da exploração e a perspectiva de aumento dos adoecimentos. Por isso, não é despropositada a principal reivindicação do SINTRAJUD: a redução de jornada de trabalho sem redução de salário, em relação à qual a Administração sequer se pronunciou. Sobretudo quando se sabe que, nos termos da lei 8.112, art. 19, a jornada entre 30 e 40 horas deve ser fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, cabendo ao Tribunal reconhecer que a intensificação ritmo de trabalho, ininterruptamente em frente ao computador, com intensificação de movimentos repetitivos, comporta a medida para preservação da saúde, pelo menos como diretriz, na atual fase.
Não podemos consentir ou permitir que a precarização, terceirização e superexploração dos trabalhadores, em hipótese alguma, sejam apresentadas sob o rótulo de modernidade e levadas adiante sem a devida problematização.
Toda mudança que melhore a prestação do serviço jurisdicional e a qualidade de vida e trabalho dos servidores contará com irrestrito apoio desta entidade, mas, ainda pesam muitas dúvidas e problemas no programa e-Vara. Por isso, a posição do SINTRAJUD desde o princípio tem sido de crítica e independência, não descartando a possibilidade de se opor frontalmente ao programa caso não se verifique efetiva melhora das relações de trabalho.
O SINTRAJUD estará junto com os servidores e servidoras de Santos, sempre vigilante na defesa dos direitos, discutindo os impactos da implantação e apresentando à Administração os pleitos que forem deliberados. Não faz sentido submeter a totalidade dos servidores a mudanças estruturais de grande impacto, com desagregação das atuais equipes de trabalho, perdas financeiras em muitos casos, risco de não adaptação e adoecimento, tão só para extrair o máximo de produção, sem garantia de melhora para os servidores e servidoras.
É de interesse de todos os servidores e servidoras tudo o que acontecer em Santos, inclusive o tratamento que será dispensado pela Administração às reivindicações específicas desses/as colegas inicialmente afetados/as.
O SINTRAJUD reitera a necessidade da ampliação do debate no curso da implantação do Projeto-piloto e que sejam incorporadas as sugestões já documentadas.
São Paulo, 14 de novembro de 2019.
Diretoria Executiva do Sintrajud
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[1] Provimento CJF3R Nº 34 e Resolução CJF3R n.º 44.
[2] Minuta de relatório final do projeto apresentada ao Conselho de Governança Integrada, Participativa e Inovadora (Congip) em 11 de março deste ano.