Maioria vota que redução salarial é ilegal, mas Toffoli posterga decisão do STF


22/08/2019 - Helcio Duarte Filho

Seis ministros do Supremo Tribunal Federal se posicionaram pela inconstitucionalidade do dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal que permite a redução de salários de servidores para ajustar o orçamento aos limites fiscais. No entanto, o ministro Dias Toffoli, presidente da Corte, se recusou a proclamar o resultado apesar do apelo de dois de seus colegas, e de certa forma ‘embargou’ o voto da ministra Cármen Lúcia, que já não se encontrava na sessão.

Com isso, o desfecho do mais polêmico item em julgamento, nesta quinta-feira (22), nas ações diretas de inconstitucionalidade que contestam dispositivos da LRF foi adiado. Isso ocorre às vésperas de outro julgamento, desta vez virtual, que também trata de possível redução salarial de servidores: os embargos declaratórios referentes ao recursos extraordinário da incorporação dos quintos.

A conclusão do julgamento da constitucionalidade deste dispositivo do artigo 23 da LRF, que autoriza redução de salários proporcionalmente à jornada, ficou para uma próxima sessão, ainda sem data definida. Toffoli encerrou a sessão e não concluiu o julgamento alegando que, como ainda não havia, em sua visão, se formado uma maioria, aguardaria o voto do ministro Celso de Mello. O decano do STF não participou da sessão.

Para o servidor Fabiano dos Santos, dirigente da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e do MPU (Fenajufe) e do Sintrajud, o STF tem três pautas para julgar que geram muita apreensão nos servidores: essa da redução salarial e a LRF, os embargos declaratórios dos quintos e a que trata da indenização por descumprimento da data-base. Todas elas, afirmou, têm relação com uma política governamental de responsabilizar o servidor pelos problemas do país. “É um ataque num momento em que o governo busca uma solução para uma crise que não tem origem nos servidores ou na prestação dos serviços públicos. Não é muito diferente de todo o debate que o governo tenta fazer na Previdência, em que ele não trata a crise, mas tenta encontrar alguém para pagar a conta”, criticou o servidor, que participa das visitas aos ministros do STF nesta semana de mobilização contra a redução salarial.

Voto do relator

A atitude do presidente do STF causou surpresa em parte dos ministros e preocupação em dirigentes sindicais do funcionalismo. Isto porque sabe-se que um ministro pode mudar de voto ao longo de qualquer julgamento. Ao não proclamar o resultado, na prática Toffoli postergou a decisão e deu tempo aos defensores da redução salarial, entre eles o governo federal e governadores, para tentar reverter a derrota.

O voto do relator, ministro Alexandre Moraes, foi pela rejeição da ação e aceitação dos dispositivos contrários aos servidores – sendo acompanhado integralmente por Roberto Barroso e Gilmar Mendes. O ministro Edson Fachin abriu divergência, assinalando a inconstitucionalidade da medida. Foi seguido sem ressalvas pelos ministros Luiz Fux, Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski.

Cármen Lúcia

A ministra Cármen Lúcia anunciou seu voto dizendo que seguia a divergência no que se refere à ilegalidade da redução salarial, mas “divergia da divergência” quanto à diminuição da jornada de trabalho. Disse que o STF já havia se posicionado em outros momentos pela constitucionalidade da diminuição de jornadas, desde que sem redução de salários. Esse posicionamento foi claro ao longo de sua intervenção.

Disse a ministra ao declarar seu voto: “O inciso 15 do artigo 37 prevê expressamente o princípio da irredutibilidade de subsídios e vencimentos de cargos e empregos públicos, o que não pode ser adotado em sentido diverso pelo legislador complementar como aqui foi feito, ainda que para adequação de despesas e ainda que eu não discorde em nada do que foi dito até aqui quanto à situação gravíssima que vivem os entes federados neste momento”.

Reforçou mais adiante: “Pode-se reduzir a jornada, mas não pode-se reduzir o valor”. Em dado momento, expressou de forma confusa o que seria seu voto ao dizer: “Eu divirjo da divergência apenas na parte relativa à locução quanto à redução dos valores a ele atribuídos”. Foi nesse momento que Lewandowski pediu que ela esclarecesse o voto:

– Ministra, por gentileza, eu queria entender melhor. Vossa Excelência está entendendo que é constitucional a redução desde que não se reduza os vencimentos, é isso? – perguntou.

– Redução não. Pode mudar a carga horária, não pode reduzir o valor por causa do princípio da irredutibilidade dos vencimentos – respondeu Cármen Lúcia, espantando quaisquer dúvidas quanto ao seu voto. Chegou a mencionar que a sua diferenciação com Fachin fazia sentido apenas em termos jurídicos e abstratos, já que para o caso específico não haveria sentido falar em diminuição apenas de jornada quando se trata de reduzir despesas.

Divergências

Neste momento, a sessão era conduzida pelo ministro Luiz Fux, vice-presidente do Supremo. Posteriormente, ao declarar o seu voto, o presidente do STF disse que concordava com o relator quanto à legalidade da permissão de reduções salariais para adequação aos limites fiscais, mas que abria o que chamou de uma quarta posição, ao entender que essa redução nos vencimentos só poderia ser utilizada após esgotadas as demais medidas previstas no artigo 169 da Constituição Federal para ajustar o orçamento, que inclui a demissão de servidores. Em seguida, disse que desta forma havia cinco votos pela inconstitucionalidade total dos dispositivos e outros cinco que consideravam pelo menos parte destes itens da LRF constitucionais.

Ao ser contestado por Lewandowski, foi ríspido – “Eu estou conduzindo a presidência”, disse. Lewandowski retrucou: “Estou exercendo meu direito…”. Toffoli prosseguiu com a intenção de adiar a conclusão do julgamento para aguardar o voto de Celso de Mello. Chegou a ler o que tinha da transcrição do voto de Cármen Lúcia, justamente aquele trecho pouco claro, que já havia sido esclarecido por ela mesma quando solicitado por Lewandowski.

O presidente do STF disse que adiava o desfecho do julgamento para não ter que proclamar um voto médio, preferia colher o voto de Celso de Mello, sugerindo mais uma vez que não considerava a posição da ministra Cármen Lúcia como explicitamente contrária à redução salarial. Mais uma vez, em vão, Lewandowski e Marco Aurélio observaram que o voto da ministra já permitia a proclamação do resultado. “Todos nós somos a favor da redução da jornada, desde que não haja redução dos vencimentos”, afirmou Marco Aurélio, que, por fim, sugeriu que se aguardasse da própria ministra, quando ela estivesse na Corte, o esclarecimento. “Vamos remeter os embargos declaratórios à autora dos votos embargados”, disse.

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