Judiciário não segue nem mesmo recomendações da OIT para o teletrabalho


01/06/2020 - helio batista

(Foto: Divulgação/Migalhas)

A disseminação do teletrabalho (ou trabalho remoto, home office) em todo o mundo é um dos efeitos mais imediatos e visíveis da pandemia do coronavírus, atingindo trabalhadores e atividades que não estavam habituados a essa modalidade. Mesmo nos setores em que já era praticado, o teletrabalho alcançou escala antes inimaginável, envolvendo desde a alta administração até o pessoal da linha de frente.

Diante dessa nova realidade, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou um vídeo com recomendações básicas para garantir a efetividade do teletrabalho.

“Há certas coisas fundamentais que se aplicam a todos os casos, talvez um pouco mais agora”, diz Jon Messenger, especialista em condições de trabalho da OIT, no vídeo produzido pela organização. A seguir, ele apresenta cinco dicas:

  1. Apoio administrativo em todos os níveis. “Da alta gerência ao supervisor da linha de frente, [é] absolutamente fundamental para o teletrabalho efetivo”, afirma Messenger.
  2. Ferramentas e treinamento apropriados. “Essenciais para ficar conectado com os colegas na administração”, diz o especialista, que aponta a necessidade de “aplicativos apropriados, suporte técnico adequado e treinamento tanto para os administradores como para os teletrabalhadores”.
  3. Expectativas claras para a gerência e para a equipe. “Os resultados e as condições esperados, o horário em que os trabalhadores devem estar disponíveis – tudo precisa ser fixado claramente, desde o princípio”, recomenda Messenger.
  4. Domínio do tempo para apoiar a produtividade. “É preciso dar aos trabalhadores a capacidade de trabalhar nos horários e lugares que lhes sejam mais convenientes, para que eles possam ser tão produtivos quanto possível.”
  5. Estratégia clara de gerenciamento de limites. “Todos devem ter sua própria estratégia individual de gerenciamento de limites”, declara o especialista da OIT. “Isso inclui vários mecanismos para que se possa ter uma fronteira entre o trabalho e a vida pessoal, como espaços dedicados, especialmente se há mais de uma pessoa na casa tentando fazer teletrabalho. Mas, ao mesmo tempo, você precisa conseguir se desconectar do trabalho e ter tempo para descansar e relaxar.”

Por fim, Messenger diz que o teletrabalho depende da confiança. “Essa é a cola que une tudo”, afirma. “É preciso haver confiança entre o administrador e o teletrabalhador e entre todos os colegas.”

Judiciário se atropela

Na semana passada, o Judiciário Federal em São Paulo e no restante do país divulgou uma série de portarias desencontradas sobre a suspensão do expediente e o teletrabalho.

No TRF-3, foram três portarias ao longo da semana. A última, publicada na quinta-feira (19 de março), ainda prevê compensação de horas para quem não atua em atividade compatível com o teletrabalho – o que é questionado pelo Sintrajud, tendo em vista que a ausência dos servidores é uma imposição da realidade.

A Central Unificada de Mandados (Ceuni) da capital demorou quase uma semana, mas acabou  dispensando os oficiais de justiça do comparecimento presencial, após intervenção do Sindicato. As devoluções, impressões e quaisquer outras providências necessárias à execução de mandados de urgência devem ser feitas em home office. Ainda há situações específicas a serem reguladas pela administração, como a dos oficiais que têm de cumprir mandados em presídios, por exemplo.

O TRT suspendeu o expediente nos prédios, mas o Sindicato recebeu denúncias de que servidores estavam sendo pressionados ao teletrabalho mesmo sem ter as condições necessárias.

Regulamentação em São Paulo

Para além da emergência causada pela pandemia de coronavírus, o teletrabalho é tema de debate entre os servidores do Judiciário Federal. Em 2016, o CNJ editou a Resolução 227 para regulamentar a adoção da modalidade, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) desde 2011.

A norma foi modificada em outubro do ano passado para permitir o teletrabalho a partir de locais fora da jurisdição do tribunal e até do exterior. Essa mudança possibilitou, por exemplo, o início da implantação do Programa e-Vara, que reestrutura a Justiça Federal em São Paulo com base no teletrabalho.

Julho de 2019: diretores do Sintrajud e servidores discutem regulamentação do teletrabalho no TRF-3/JF. (Foto: Claudio Cammarota)

A Resolução do TRF-3 29/2016, que regulamenta o teletrabalho na 3ª Região, foi tema de discussões entre os servidores no ano passado, quando o TRF-3 abriu consulta à categoria e aos magistrados sobre modificações no texto.

Um dos pontos mais questionados foi a fixação da meta de desempenho, 30% superior à do trabalho presencial. Os servidores também manifestaram preocupação com a infraestrutura necessária para o teletrabalho, a garantia de suporte técnico, a intensificação do ritmo de trabalho em meio à pressão por redução de gastos e as brechas abertas para o assédio moral, entre outros aspectos.

O Sindicato levou os questionamentos e reivindicações à administração, inclusive durante a implantação do Programa e-Vara.

No TRT, a administração atendeu parcialmente as demandas apresentadas pelo Sindicato na regulamentação do teletrabalho, feita em 2018. Inicialmente, o Tribunal propôs uma meta de rendimento para os servidores nessa modalidade superior em 15% à dos colegas em trabalho presencial, mas acabou retirando a exigência.

O sindicato defende que o estabelecimento de metas superiores implica redução relativa de salários, até porque não é possível pressupor que o trabalho em domicílio resulte em maior produtividade ou rendimento, sem que se imponha maior ritmo de trabalho ou jornada excedente.

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