Greve dos petroleiros completa 14 dias com atos em todo o país e denúncia do Judiciário


14/02/2020 - helio batista

Ato diante da sede da Petrobras, no Rio. (Foto: FNP)

 

Os trabalhadores da Petrobras marcam o 14º dia de sua greve nacional, nesta sexta-feira (14 de fevereiro), com atos de protesto nos portões de refinarias em todo o país.

Em São Paulo, a CSP-Conlutas organizou caravanas com trabalhadores de outras categorias para se juntar às manifestações nas unidades de Cubatão e Paulínia. No centro do Rio, uma passeata de apoio à greve foi realizada na tarde desta quinta-feira, a partir da Candelária.

Em abrangência territorial, adesão e número de unidades paradas, essa já é a maior greve dos petroleiros desde 1995, que se estendeu por 32 dias à época. O balanço da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) e da Federação Única dos Petroleiros (FUP) apontava até esta quinta-feira 113 unidades paralisadas em 13 estados, com mais de 20 mil petroleiros de braços cruzados.

Entre as manifestações de apoio recebidas pela categoria, estão a do Fórum dos Trabalhadores do Setor Público no Estado de São Paulo e a do Sintrajud, que realizaram plenária e assembleia no último sábado. Logo no início da paralisação, a direção do Sindicato já tinha manifestado solidariedade à luta e repúdio à postura do Tribunal Superior do Trabalho, que tem imposto decisões antissindicais, como multas e declaração de abusividade da greve (leia mais no quadro abaixo).

Ao longo desta semana, o diretor do Sintrajud José Dalmo Duarte, servidor do TRF-3, esteve acompanhado de outros servidores públicos prestando solidariedade aos trabalhadores concentrados nos portões da Refinaria Capuava (Recap), em Mauá. Nesta sexta, a servidora do TRT e também diretora do Sindicato Inês Leal esteve no ato em apoio à greve na Refinaria de Paulínia (Replan). “Os petroleiros realizaram atos hoje em todo o país, em protesto contra as demissões que se iniciaram também nesta data, em Araucária. São 14 dias de greve enfrentando o assédio da empresa, que ameaça demitir e cortar o ponto, e do judiciário – que determinou que 90% dos trabalhadores devem trabalhar durante a greve -, além do bloqueio e das mentiras da mídia. É preciso cercar essa greve de apoio e solidariedade”, aponta Inês.

Ato na Refinaria de Paulínia (Replan) nesta sexta-feira, 14 de fevereiro. (Foto: CSP-Conlutas)

 

Sucateamento

Os atos nos portões das refinarias nesta sexta-feira foram marcados para coincidir com o desligamento dos trabalhadores demitidos da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen-PR).

Os petroleiros reivindicam a suspensão das demissões, já que o acordo coletivo estabelece que a Petrobras não pode fazer demissões em massa sem negociações prévias com a categoria.

Ato na Petrobras de Manaus. (Foto: FNP)

Eles também denunciam a desativação da Fafen como parte dos planos de sucateamento da Petrobras para sua posterior privatização, no contexto de entrega das riquezas nacionais ao capital estrangeiro.

Apontam ainda que a política de preços dos combustíveis adotada pela Petrobras desde 2016 causa prejuízos aos consumidores e faz parte do desmonte da empresa. A estatal reajusta os preços dos derivados nas refinarias de acordo com o mercado internacional, penalizando a população com os efeitos da disparada do dólar (que chegou a R$ 4,33 nesta quinta-feira).

Os petroleiros observam que, por outro lado, a Petrobras vem reduzindo o uso de suas refinarias, favorecendo a utilização do petróleo importado, e que a situação pode se agravar com a planejada venda de oito das 15 refinarias da empresa. Desde o início da greve, sindicatos de vários estados têm buscado alertar a população sobre os impactos da política de gestão da empresa vendendo gasolina e botijões de gás com desconto. O botijão de 13 quilos a R$ 35,00 é subsidiado pelos Sindicatos para demonstrar que seria possível o abastecimento nas residências ser muito mais barato do que os atuais R$ 70,00 cobrados em média ao consumidor.

Intransigência

Além das demissões sem negociação prévia, outras cláusulas do acordo coletivo estão sendo desrespeitadas pela Petrobras, conforme aponta Pedro Augusto Nascimento, que trabalha na Recap e é filiado ao Sindicato dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro Unificado).

Ele diz que a empresa vem ignorando os trabalhadores na implantação de mudanças no regime de trabalho, ao contrário do que prevê o acordo. “Foi estabelecido um grupo de trabalho que discutiria a implementação do banco de horas, mas a empresa impôs seu próprio entendimento de como o banco deveria ser gerido”, menciona.

Ato na Revap, em São José dos Campos. (Foto: FNP)

O programa de participação nos lucros e resultados, por sua vez, estabeleceu um prêmio por desempenho que amplia a distância entre o que ganham os trabalhadores da base e os executivos da empresa. “Na prática, foi instituída uma remuneração variável que cria uma distinção absurda entre a base e a administração”, explica Pedro Nascimento.

As tabelas de turno são outro instrumento utilizado pela Petrobras para desrespeitar o acordo. Segundo Pedro, a empresa vinha perdendo ações trabalhistas por causa das tabelas utilizadas nas refinarias e em outras unidades. Por isso, decidiu padronizar a organização dos turnos de trabalho impondo uma tabela que já havia sido rejeitada pela categoria. Trabalhadores que preferissem outra tabela teriam de abrir mão dos créditos trabalhistas.

“É uma gestão que reproduz fielmente o governo Bolsonaro e a linha Paulo Guedes, de hiperliberalismo e total intransigência”, resume o petroleiro.

 

Judiciário decide contra os trabalhadores

Ives Gandra, no TST, e Dias Toffoli, no STF, praticamente eliminam o direito de greve.

Além de reproduzir os métodos e a ideologia do governo Bolsonaro, a Petrobras se tornou um exemplo da atuação do Judiciário contra os trabalhadores. Para o petroleiro Pedro Augusto Nascimento, desde 2018 as decisões judiciais sobre as greves na empresa refletem também as mudanças na legislação trabalhista e o nível de politização do Poder.

Em maio daquele ano, os petroleiros deflagraram uma greve de 72 horas juntamente com a paralisação dos caminhoneiros, mas o movimento foi suspenso por decisão judicial, que impôs multa de R$ 2 milhões por dia para cada sindicato.

Ives Gandra Filho. (Foto: Marcelo Camargo/Ag. Brasil)

No ano passado, uma greve parcial da categoria foi declarada abusiva por decisão do ex-presidente do TST, Ives Gandra da Silva Martins Filho, um dos poucos na Corte a defender a ‘reforma’ trabalhista. “Ele concedeu liminar que considerava a greve abusiva antes mesmo que ela acontecesse”, lembra Pedro Nascimento.

Acatando recurso dos petroleiros, a Seção de Dissídios Coletivos do TST cassou a liminar em janeiro deste ano e suspendeu a aplicação de multas aos sindicatos. Mas a Petrobras recorreu ao STF e o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, restabeleceu a decisão de Gandra, inclusive com as multas milionárias e a determinação de que pelo menos 90% dos trabalhadores continuassem trabalhando durante a greve.

Gandra e Toffoli são os mesmos protagonistas das decisões judiciais sobre a greve deste ano. O ministro do TST não ocupa mais a presidência do Tribunal, mas é o relator da ação da Petrobras para o dissídio da greve.

Dias Toffoli. (Foto: Nelson Jr.-SCO/STF)

Ele voltou a determinar o mínimo de 90% dos trabalhadores em atividade e fixou multa de até R$ 500 mil por dia para os sindicatos. No dia 6 de fevereiro, mandou bloquear as contas de entidades sindicais e autorizou a contratação de trabalhadores temporários.

A assembleia do Sintrajud realizada no último sábado aprovou uma moção de repúdio ao ministro e o declarou inimigo da classe trabalhadora.

Toffoli também foi além e, ao confirmar as medidas contra os sindicatos, determinou que a Seção de Dissídios Coletivos do TST – um órgão colegiado – não pode mais reverter as decisões monocráticas de Gandra.

“Na prática, estão dizendo que não pode existir greve”, concluiu o petroleiro Pedro Nascimento.

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