Feminicida de Mara Helena é condenado às vésperas dos três anos do crime


20/12/2021 - joebetho
Coletivo de Mulheres do Sintrajud acompanha o caso desde 2018 e homenageia a servidora que dá nome ao colegiado.

De óculos escuros, na greve de 2015 (foto: Jesus Carlos)

Aconteceu no último dia 26 de outubro o júri popular que condenou Leandro Lustoza dos Santos pelo feminicídio da servidora da Justiça Federal Mara Helena dos Reis. Ex-diretora de base do Sintrajud, Mara foi assassinada na noite de Natal de 2018 pelo homem com quem vivia, dentro de casa, em uma chácara no bairro Jardim Novo, na cidade de Ribeirão Pires, no ABC Paulista. Faltavam então apenas dois dias para Mara completar 52 anos de idade.

Arquivo pessoal.

Contadora, Mara (foto) atuou na Seção Judiciária de São Paulo de 12 de novembro de 1996 até às vésperas de sua morte. O último setor onde serviu foi Núcleo de Apoio Regional da JF em São Bernardo do Campo, também na região do ABC, onde era supervisora de cálculos judiciais.

Leandro foi absolvido da acusação de furto, pedida pelo Ministério Público pelo fato de o autor ter fugido do local do crime deixando Mara sem vida e levando um cartão de crédito, o celular e o carro da vítima. A confissão do feminicídio foi considerada atenuante, e por isso ele foi condenado à pena mínima de 12 anos de prisão estabelecida no Código Penal para os crimes contra a vida. O benefício de progressão a regimes diferentes do fechado só poderá ser pedido a partir da metade do tempo de cumprimento da pena. Leandro está preso desde que se entregou à polícia, na cidade de Juquitiba, em 26 de dezembro de 2018.

Uma frase na sentença indignou a coordenação do Coletivo de Mulheres do Sintrajud, que recebeu o nome de Mara Helena dos Reis em homenagem à colega. Pelo fato de Leandro não ter antecedentes, e embora o conselho de sentença tenha reconhecido a futilidade da alegada motivação para o crime (uma discussão entre Leandro e Mara), o juízo afirma que “não há nada nos autos que desabone a conduta social e a personalidade do réu.” “‘Só’ o fato dele ser um assassino”, afirmou a diretora do Sindicato Luciana Martins Carneiro, integrante da coordenação do Coletivo.

“Eu entrego ele nas mãos de Deus. Tem gente que faz as coisas e some no mundo. Foi um salva-vida ele ter confessado. Eu como espírita acredito que a gente paga aqui o que faz aqui. E não desejo mal a ele. Quando ele se lembra ou se lembrar do que fez ele já vai sofrer para o resto da vida. Eu perdi a presença da minha filha aqui, mas o sentimento independe da matéria”, afirmou dona Laudelina.

Aos 85 anos, a mãe de Mara Helena é um exemplo força. Com voz firme, apesar da idade avançada, ela nunca se negou a falar à reportagem sobre o caso e sempre lembra a dor de ter sido obrigada a sepultar três deles como um processo pelo qual acredita que teve de passar. Hoje dona Laudelina vive sozinha em uma casa próxima à residência de um dos dois filhos ainda vivos. A pandemia impediu que ela continuasse viajando com amigas, uma forma que ela encontrava de não permanecer o tempo todo na residência onde as lembranças são mais marcantes.

A diretoria do Sintrajud e a coordenação do Coletivo de Mulheres reafirmam a solidariedade à família e amigos de Mara Helena.

O assassinato de mulheres por sua condição de gênero foi incorporado como um tipo penal no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei 13.104/2015, tornando-se uma qualificadora do crime de homicídio equiparável à hediondez. A Lei de Feminicídio foi uma das recomendações da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investigou a violência contra as mulheres nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal, de março de 2012 a julho de 2013, dado o tamanho do problema no país.

Em 2020, uma mulher foi assassinada por sua condição de gênero no Brasil a cada 7 horas, de acordo com levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública junto às secretarias de segurança. Foram 1.350 registros, mais da metade dos crimes ocorridos dentro das casas da vítimas. Um tipo de morte evitável que evidencia a responsabilidade de toda a sociedade no seu enfrentamento.

Mara participando de uma das manifestações da greve da categoria em 2012 (Foto: Jesus Carlos).

 

Mara, na primeira fileira de servidores, ao centro da foto, em manifestação da categoria em Brasília, no ano de 2011 (Arquivo Sintrajud).

 

Mara em atividade da greve de 2015, no Fórum Ruy Barbosa (Foto: Joca Duarte)

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