O que pensa a presidente eleita do TRT-2 sobre as demandas dos servidores


01/08/2018 - Shuellen Peixoto

No último dia 30 de agosto, a reportagem do Sintrajud entrevistou os dois então concorrentes à Presidência do TRT-2. No dia 1º de agosto, sessão plenária do Tribunal elegeu a desembargadora Rilma Aparecida Hemetério. Publicamos abaixo os posicionamentos da nova presidente da Corte, que tomará posse no dia 1º de outubro, sobre as principais demandas da categoria no maior regional trabalhista do país.

O Sintrajud tem como princípio a absoluta independência frente às administrações, e busca espaço de interlocução e diálogo permanente com o objetivo de avançar no atendimento às demandas dos trabalhadores.

Leia abaixo a íntegra da entrevista concedida com exclusividade pela desembargadora Rilma.

Já tendo se posicionado contra as ameaças de enxugamento e/ou extinção da Justiça do Trabalho, dada a sua função social na solução de conflitos, que ações considera importantes caso se torne presidente da maior Corte Trabalhista Regional do país para evitar tal cenário? Qual papel avalia que o presidente do TRT-2 tem neste debate?

A questão não é somente do TRT-2. Na realidade temos que enfrentar em conjunto com todos os TRTs e também com o TST. E em vista das propostas que têm sido feitas de fusão de justiças, também tem que ser amplamente discutidas com outros ramos do Direito e da Justiça, como a Justiça Estadual e Federal. O papel do presidente do TRT-2 tem que ser de vanguarda, porque afinal de contas somos o maior regional do país e tudo o que vier a ser feito nos afetará primordialmente. Além disso, teríamos um impacto social com toda a realocação das pessoas quem compõem o Poder Judiciário, e uma mudança muito grande no perfil do advogado que atuará nessas esferas, com qualquer modificação que possa advir. Mas acredito que o papel do presidente do TRT-2 é mostrar que a Justiça do Trabalho é uma justiça operante, necessária, e que somente quem não a conhece a fundo se posiciona pela sua extinção.

As lides trabalhistas não deixarão de existir. E toda a lesão de direito tem que ser submetida à apreciação do Poder Judiciário por garantia constitucional. Então, de uma forma ou de outra, quer com o nome de Justiça do Trabalho ou com o nome que se denomine essa nova justiça, ou essa atual justiça com uma roupa nova que lhe querem colocar, será sempre a Justiça do Trabalho. Porque o conflito é entre o trabalhador e o dador [no Direito, aquele que concede um direito a outrem] de trabalho.

O ramo da Justiça do Trabalho só foi criado por essa característica peculiar que o trabalhador traz em si a força do trabalho e coloca a disposição não só a sua pessoa, um serviço, mas a sua própria força de trabalho. De forma que não se pode desassociar esta força de trabalho, que gira em torno da dignidade da pessoa humana.

Então, rebaixar o Direito do Trabalho para um direito que não considera a dignidade da pessoa humana como sua razão primordial é como negar a existência do próprio trabalhador. E é inadmissível numa sociedade de capital e trabalhador anularmos uma das partes. E mesmo para o empregador é uma forma de garantir a possibilidade de discutir as suas posições, sem que isso ocasione um impacto social que possa, ao invés de solucionar o seu litígio sem prejuízo para o seu desenvolvimento econômico possa causar mais prejuízo econômico. Então, é salutar para ambas as partes ter uma justiça altamente especializada para solucionar esse tipo de conflito.

Os ataques à Justiça do Trabalho não se encerram na reforma trabalhista e na Lei das Terceirizações, estendendo-se a todo o Judiciário Federal por meio do congelamento orçamentário imposto até 2036 pela Emenda Constitucional 95, que impacta nos salários, carreira, benefícios, nomeações e realização de novos concursos. Como pretende lidar com a necessidade de expansão orçamentária para a adequada prestação jurisdicional, tendo em vista que o TRT-2 já tem a maior produtividade do país, e a realidade de compressão nas verbas destinadas ao Tribunal?

Já é uma realidade a questão do congelamento. Não só para a Justiça do Trabalho, mas para todas as justiças federais. Desta forma, a nossa ação não fica somente restrita à Justiça do Trabalho. Também tem que ser feita em conjunto. Não somente na esfera administrativa, mas também na Legislativa. Porque esta modificação veio através do Poder Legislativo e sua modificação passa pelo cenário legislativo. E nós estando agora em época de mudanças no cenário político, Executivo e Legislativo, teremos que fazer, junto com as associações e outras entidades – a Ordem dos Advogados, a Associação de Advogados Trabalhistas, as associações de funcionários públicos ou mesmo os sindicatos dos funcionários públicos, nas esferas estadual e nacional, para que possamos em conjunto formularmos políticas modificativas desta questão econômica que nos atinge.

Os benefícios como auxílios pré-escolar, saúde e alimentação estão com valores defasados há anos, sem a devida reposição inflacionária integral. Como pretende resolver essa questão neste cenário econômico?

Penso em trabalhar na mesma perspectiva, porque tem que ser uma ação conjunta. Não temos como modificar a dotação orçamentária com relação às despesas essenciais. O gestor tem que se ater única e exclusivamente às diretrizes específicas direcionadas para cada setor.

A única coisa que podemos modificar são questões de necessidades primárias, onde teremos que trabalhar, mas que não é aquilo que impacta orçamento. De forma que a ação conjunta engloba também a questão dos auxílios, dos benefícios, dos reajustes. Tudo isso tem que ser solucionado pela via legislativa.

Em relação ao enfrentamento ao assédio sexual e moral na 2ª Região, recentemente o Tribunal reconheceu a importância do combate frequente a essas práticas, e o CSJT instituiu um Comitê de Combate ao Assédio Moral. Que medidas pretende adotar?

O assédio moral é uma questão que precisa ser amplamente debatida, com a conscientização dos administradores, servidores, juízes, advogados. E isso também engloba a questão do assédio sexual. Acredito que este trabalho de ser muito cuidadoso, mas passa primeiro pelo crivo do Sindicato e das associações, porque são os órgãos primeiros defensores dos próprios direitos e garantia dos trabalhadores – quer na condição de servidores, quer na condição de juízes, quer na condição de advogados. Desta forma fica muito mais fácil conscientizar o próprio assediador e o assediado sobre como proceder no serviço para evitar o assédio. E também, estando este consumado, quais os canais que deve procurar para conseguir sanar este problema. Então, por exemplo, através de comissões especiais onde se possa dar uma abertura para o assediado procurar proteção, auxílio, não só para o seu problema em si, mas também um apoio moral, psicológico e jurídico, passa pelo crivo dessas associações porque são as que geralmente melhor representam o trabalhador. E para que elas, tendo um canal aberto com a administração, possam então tomar posição diante da administração e ela possa também tomar as providências necessárias para corrigir e sanar essas irregularidades. Até mesmo com os procedimentos administrativos que se façam necessários.

Que medidas pretende adotar com vistas à preservação e prevenção à saúde do trabalho e à adequação das condições físicas de atividade laboral na 2ª Região, visto que a gestão da produtividade deve preservar a saúde física e mental de trabalhadores e magistrados?

Tem que andar pari passu, porque o trabalhador tem que ser valorizado, o servidor tem que ser valorizado. Porque dele depende a eficiência da administração, quer na parte técnica, quer na parte administrativa em si. Se o trabalhador não estiver bem física e psicologicamente não terá uma produção adequada. Então, vamos ter que exigir sim do trabalhador. Mas também criar condições para que ele possa desenvolver o seu trabalho sem afetar a sua condição física e mental, e criar suportes para isso, de apoio, preparação, através de cursos e palestras, da promoção de eventos sociais. Para que o servidor entenda a sua utilidade para o desenvolvimento da atividade-fim da prestação jurisdicional, mas também se sinta valorizado.

Também já manifestou disposição de valorizar os servidores do Tribunal. Que medidas nesse sentido integram seu plano de gestão?

Quando me candidatei anteriormente fiz uma proposta que resgato para responder a essa questão, e evidenciar que gostaria de valorizar o servidor mantendo um arquivo de servidores (através de uma pesquisa e um recadastramento de todos os que atuam na Segunda Região), com todas as suas habilidades e competências, para utilização numa possível ocupação de cargos e funções que se fizerem necessárias. De forma que quando um juiz, um desembargador ou mesmo um outro setor de serviços do Tribunal necessite de um trabalhador, tenha um arquivo do qual possa se valer e verificar quem estaria apto para aquelas competências.

A designação do exercício da função seria por um critério de formação?

Sim. Hoje, quando preciso de um funcionário, pergunto para meus colegas e funcionários ‘você conhece alguém? E muitas vezes esse alguém não está visível porque não tem essa transparência. Então, com esse banco de dados de funcionários, daríamos a oportunidade do próprio servidor demonstrar, através da sua formação profissional, as suas aptidões e competências, mesmo aquelas não ligadas ao cargo ao qual está ocupando atualmente. Suponhamos um servidor com formação na área de Engenharia que esteja atuando num cargo da área técnica que não seja afeta à Engenharia. Se ele demonstra no seu currículo e na sua formação profissional essa competência, fica mais fácil quando da ocupação de um cargo ou mesmo para o desempenho de uma função que seja visibilizada essa questão. Muitas vezes precisamos de alguém que tenha conhecimento técnico até para dar um enfoque a algumas questões, ou aptidão para a tecnologia, que aqui não ocupa essa função mas tem esse cabedal de conhecimento. Então, temos que ter um banco com todas essas competências para que quando forem necessárias possamos utilizá-las. De uma forma objetiva para que quando for preciso não seja necessário sair perguntando e possa consultar o banco de dados.

Ou mesmo questões sociais. Quantas vezes a própria Ejud promove cursos. Nós não poderíamos fazer atividades sociais como uma competição de cozinha ou chamar as pessoas que fazem o curso para um almoço onde ela possa utilizar tudo aquilo que ela aprendeu por exemplo num curso de Nutrição? Temos que observar tudo isso porque é uma forma de valorizar o servidor e também torna as pessoas no âmbito social numa forma mais maleável, mais compatível com o que é uma justiça social.

A senhora anunciou a intenção de manter o espaço de diálogo institucional conquistado pelo Sindicato para resolução de demandas da categoria. Estarão mantidas as reuniões mensais com o Sintrajud?

Vocês estão estabelecendo mensal. Eu estabeleço sem periodicidade. Quantas vezes forem necessárias. Se for necessário semanal, será semanal. Se for necessário diária, será diária. O que temos que manter é uma porta aberta. Sempre. Evidente que uma Administração deve depois de uma eleição sentar e conversar. Se for necessário manter somente a mensal, manteremos. Mas o diálogo tem que ser mantido sempre. E temos que escutar muito, não só o que queremos escutar, porque é assim que se caminha. Senão o diálogo não evolui, serão apenas conversas para não se levar em consideração. Podemos estabelecer uma periodicidade maior ou menor, mas sempre de acordo com a necessidade.

Considerando os impactos da intensificação do ritmo de trabalho ao longo dos anos e a realidade de jornadas menores que as praticadas em São Paulo por alguns Regionais, vê possibilidade para abertura do debate sobre a redução da jornada de trabalho na 2ª Região?

Estamos numa fase de muitas transições. Não podemos deixar de levar em consideração que todas as mudanças tecnológicas que a Justiça tem sofrido vão levar a uma remodelação de tudo isso. Temos que começar a discutir desde logo. Não talvez com essa preocupação de estabelecer uma jornada de seis horas, de quatro horas ou de oito horas, mas de ter uma jornada flexível. Porque é desta forma que se encaminha o serviço em todos os setores, seja no setor público ou no setor privado. Porque na realidade o que acontece é que muitas oportunidades, se apostarmos tudo na tecnologia, vamos poder trabalhar até menos que as seis horas. Mas também, a depender da situação, precisaremos trabalhar um pouco mais. Vai depender das ocasiões. Então, o que temos que deixar aberto e bem esclarecido é que temos que manter um diálogo para que isso se estabeleça. Por exemplo, os funcionários de gabinetes, geralmente tem alguns, em geral os assessores, que não desenvolvem a maior parte das suas atividades internamente. E fica na sua responsabilidade o exercício e a distribuição dessas horas de trabalho. Porque o que nós exigimos é o resultado. Eu não quero estatística atrasada, como não tenho. Mas em alguns meses em que a demanda de processos é baixa, é claro que eles têm uma disponibilidade de tempo muito maior. Mas sem perder o foco de que a prestação jurisdicional é para o que estamos aqui.

Mas hoje as consultas que antigamente eram feitas no balcão já não são mais. E talvez no futuro a gente tenha a possibilidade até mesmo da extinção de certos cargos, como datilógrafo de audiências, que passarão a ser através de vídeo. E tudo isso vai ter que ser conversado. E aí está o papel que nós temos que manter como Sindicato e Administração. Passando também pelo crivo do juiz de primeiro grau, que é o que mais tem necessidade, para que possamos solucionar essa questão. Considero que resolver essa questão através de lei não resolve porque cria uma problemática, porque estamos na hora certa de procurar outros caminhos, porque o orçamento encolheu. E não existe necessidade de estar presentes em determinadas situações, por exemplo, se esse funcionário poderia estar desenvolvendo a mesma atividade com a mesma produção em casa ou a distância.

E isso tem que ser debatido, discutido pela Ejud em cursos e palestras, com o Sindicato também trazendo propostas. Porque não teremos  uma proposta vencedora. Estamos todos juntos.

Por último, qual o seu posicionamento sobre a possibilidade de realização de eleições diretas para os corpos diretivos dos Tribunais, com participação dos servidores no colégio eleitoral?

Qualquer democratização deve ser vislumbrada com a participação de todos. Mas também tem que ser objeto de debate como será essa participação. Porque os números são discrepantes. Quando batemos os números de funcionários, juízes , é uma discrepância muito grande. Então temos que discutir como será este passo, como será essa representação, quais são as decisões que poderão ou não ser tomadas. Porque somos uma administração, não somos uma casa de política. Então isso também tem que ser debatido para que não se torne um balcão de troca de mercadorias. Aqui já ventilamos sobre isso e considero que temos que debater, todo mundo fala que tem que participar. Mas quando se fala em participação eu imagino que ampla e irrestrita não poderá ser. Porque nós temos que ver qual será o peso de cada um, porque a responsabilidade que recai sobre um presidente de Tribunal, com todas as questões que têm que ser direcionadas, não é o mesmo peso de uma administração voltada somente para um setor do funcionalismo ou para um setor do Poder Judiciário. Então temos que equalizar a participação do juiz substituto, do titular, do vitaliciado, do não vitaliciado, do servidor já vitaliciado, etc. para verificar qual a melhor representação disso aí. O melhor seria como a Grécia Antiga, todo mundo participando, que não era todo mundo, era só a elite. Não podemos elitizar e nem também desestruturar tudo isso, mas temos que debater. O debate tem que estar aberto, até porque é inevitável. Evidente que temos que privilegiar determinadas situações, não podemos tacar fora questões como a da antiguidade, porque no serviço público tudo é pautado nessa questão, então temos que verificar qual o peso disso. Tudo tem que ser verificado senão acontecerá que uma pessoa que acaba de chegar serviço público possa mandar numa instituição inteira, sentar na janelinha como se diz. Em detrimento de outra, só porque fez política. E não podemos esquecer que antes de tudo o Tribunal é um órgão administrativo voltado para a prestação jurisdicional. Por isso o debate não pode ser superficial. Porque tornar o Judiciário um poder politizado é uma direção que não sabemos se queremos nessa altura do campeonato.

Atualizado, apena para inclusão da apresentação à entrevista, em 02/08/2018 às 17h40.

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