O Instituto Butantan pediu à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para testes em humanos de uma vacina 100% nacional na mesma semana em que vieram à tona denúncias de que empresários do ramo de transportes de Belo Horizonte (MG) importaram imunizantes para proteger a si, familiares e políticos contra a covid-19. Representantes patronais vêm questionando a obrigatoriedade legal de doar ao Sistema Único de Saúde vacinas que venham a ser importadas pelo setor privado.
A revelação de que empresários estavam fazendo a vacinação ilegal e às escondidas foi publicada pela Revista Piauí, em 24 de março de 2021 (veja aqui). Neste mesmo dia, servidores públicos realizaram um dia nacional de protestos e paralisações, do qual servidoras e servidores do Judiciário Federal participaram.
As manifestações, convocadas pelo Sintrajud e muitas outras entidades, defenderam justamente a vacinação urgente e em massa de toda a população e a valorização dos serviços públicos, “que salvam vidas” e são alvos de ataques do governo Bolsonaro. Tanto o presidente quanto grandes corporações empresariais e financeiras atuam para passar medidas como a ‘reforma’ Administrativa no Congresso Nacional, que têm como alvo o setor público e os servidores.
Tanto a ‘reforma’ Administrativa (PEC 32), que se encontra na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, quanto a emenda constitucional que congela salários e restringe investimentos no setor público recentemente aprovada, a PEC Emergencial, foram prometidas a banqueiros e empresários pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), aliados de Bolsonaro.
O anúncio do desenvolvimento em fase avançada da Butanvac, uma vacina nacional, pelo instituto público do Estado de São Paulo, foi festejado por setores da sociedade que defendem os serviços públicos e a Ciência contra políticas apontadas como privatistas e/ou negacionistas. “Esta notícia confirma a qualidade e a relevância da saúde, ciência e pesquisa pública no país tanto no nível federal quanto no nível estadual, e demonstra que se estas instituições e universidades recebessem o investimento necessário, possivelmente não estaríamos na situação que estamos hoje”, afirmou Tarcisio Ferreira, diretor do Sintrajud e servidor do TRT-2.
Em entrevista à GloboNews, o infectologista Roberto Medronho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também destacou o desempenho da pesquisa pública apesar do baixo investimento e dos cortes orçamentários. “Apesar dos governos, são respostas que nos dão orgulho”, disse o médico. “É um dia de celebração para o Brasil e para a Ciência”, ressaltou o infectologista.
Na véspera do anúncio do Butantan, o Congresso Nacional aprovou, com apoio do governo federal, a lei orçamentária para 2021 com cortes nominais ou relativos em praticamente todo o setor público, com exceção das Forças Armadas, atingindo inclusive áreas como saúde, pesquisa e universidades públicas.
Pouco tempo antes do início da pandemia, o Butantan estava nos planos de privatização do governador do Estado de São Paulo, João Dória (PSDB). Hoje, a instituição pública é a responsável pelo fornecimento da maior parte dos imunizantes aplicados até agora na população brasileira – a Coronavac, desenvolvida na China e que teve o Butantan como parceiro nas pesquisas. Cabe também a outra instituição pública, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), da esfera federal, o fornecimento da quase totalidade do restante dos imunizantes que estão sendo usados na vacinação pelo sistema público de saúde.
A expectativa exposta pelos pesquisadores do Butantan é de que até o fim do ano os testes já permitam a produção de 40 milhões de doses da vacina brasileira. Há ainda outras seis pesquisas em andamento para busca de uma vacina nacional contra a covid-19, também em instituições públicas de pesquisa e educação.