Em performance, servidores acusam Bolsonaro de genocídio e de tentar ‘matar’ serviço público


20/10/2021 - Helcio Duarte Filho
Manifestação ocorreu em Brasília pouco antes da leitura de relatório da CPI da Covid que acusa presidente de crime contra a humanidade.

Em ato na Câmara, dirigentes encenaram compra de votos (Foto: Scarlett Rocha).

 

Poucas horas antes da leitura do relatório da CPI da Covid no Senado, que acusa Jair Bolsonaro de crime contra a humanidade, servidoras e servidores públicos realizaram um ato público na Praça dos Três Poderes na qual afirmaram que o governo também tenta ‘matar’ os serviços públicos, cuja atuação ajudou a salvar milhares de vidas na pandemia.

Servidores também denunciaram crimes contra a humanidade cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro em ato no Planalto (Foto: Valcir Araújo)

 

A manifestação da campanha contra a PEC 32 foi marcada pelo simbolismo: parte dos servidores usavam máscaras que representavam o bolsonarismo, outros, com aventais brancos, as vítimas das atitudes e omissões do governo que alimentaram a crise sanitária – tinta vermelha expunha o sangue de uma tragédia que em grande parte poderia ser evitada.

Servidora aposentada do TRF-3, Alcídia Alberto de Oliveira participou da performance. “A encenação mostrou o quanto nós brasileiros estamos sendo massacrados e maltratados, só com obrigações e poucos direitos, quantas vidas perdidas, famílias destruídas com a perda dos seus entes queridos”, disse à reportagem. “Eu, particularmente, fiquei emocionada. Eu fiz parte da representação dos mortos pela pandemia. O outro lado, que representou os bolsonaristas, estava vestido de preto e levava bexigas com corante vermelho”, relatou a servidora, que integra a delegação do Sintrajud que está em Brasília, com 16 pessoas que participam desta sexta semana consecutiva de protestos na capital federal em defesa dos serviços públicos.

“É uma representação dramática, de um presidente genocida que matou mais de 600 mil pessoas, é uma representação do que foi e do que é o assassinato de milhares e milhares de brasileiros”, disse o servidor Paulo Barela, que participava da coordenação do ato, que teve transmissão ao vivo pelas redes sociais – entre elas, a página do Sintrajud no Facebook.

A CPI e os servidores

O relatório do senador Renan Calheiros (MDB-AL), de pouco mais de mil páginas, pede o indiciamento de 66 pessoas e duas empresas por um total de 24 crimes. O presidente Jair Bolsonaro é acusado de dez crimes, com penas que, juntas, somam até 40 anos de prisão, no cálculo mais recuado. Ironia da história: a pena máxima de reclusão no país foi aumentada de 30 para 40 anos com a aprovação do chamado Pacote Anticrime levado ao Congresso Nacional pelo governo Bolsonaro.

Duas empresas, Precisa Medicamentos e VTCLog, também citadas no relatório da CPI já foram apontadas por sindicatos como exemplos do que os interesses privados e a busca do lucro podem acarretar para a saúde pública – hoje ameaçada pela ‘reforma’ administrativa.

Também é pedido no relatório o indiciamento do deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara que, quando ministro da Saúde na gestão de Michel Temer, propôs o fim do Sistema Único de Saúde. Mais recentemente, na comissão especial que analisou a PEC 32, Barros defendeu o fim da estabilidade nos serviços públicos e disse que muitos servidores ‘só leem jornal’ nas repartições públicas. Foi justamente a denúncia de um servidor do Ministério da Saúde concursado e com estabilidade  que desencadeou a investigação sobre Barros, acusado de participação na tentativa de compra de vacinas superfaturadas contra a covid-19.

Em Russas, no interior do Ceará, cidade que visitava no seu roteiro que tanto se assemelha a uma campanha pela reeleição, Bolsonaro voltou a criticar a CPI: “Nada produziram, a não ser o ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas sabemos que não temos culpa de absolutamente nada, fizemos a coisa certa desde o primeiro momento”, disse. Já o seu filho Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que integrava como suplente a comissão, disse a jornalistas que seu pai reagiria com uma gargalhada ao relatório da CPI, que repercutiu mundialmente – “São acusações gravíssimas”, escreveu o francês “Le Monde”.

‘Horror e vergonha’

“20 de outubro de 2021: um dia de horror e vergonha que não iremos esquecer tão cedo”, escreveu o jornalista Ricardo Kotscho, do Portal UOL. Também houve quem lembrasse as ‘gargalhadas’ dadas pelo presidente quando imitou alguém com falta de ar pela covid-19 ou mandou o brasileiro comprar vacina “na casa da mãe”.

Ao final da tarde, quando o relatório da CPI já havia sido lido, os servidores realizaram mais uma encenação em frente à Câmara dos Deputados. Nesta, distribuíram ‘cédulas’ de 200 laranjitos, com os rostos de Bolsonaro, de Arthur Lira, presidente da Câmara, e Paulo Guedes, ministro da Economia, estampadas numa das faces. O ‘dinheiro’ simbolizava as denúncias de que o governo, sem apoio à ‘reforma’ no Congresso, tenta ‘comprar’ o voto de deputados com emendas parlamentares no orçamento no valor de R$ 20 milhões.

Guedes também é acusado de faturar durante a pandemia com fortuna mantida em paraíso fiscal no Caribe, que valoriza a cada alta do dólar, enquanto, no Brasil, o preço dos alimentos e dos combustíveis aumenta. Já Lira é criticado por manter engavetados mais de uma centena de pedidos de impeachment contra Bolsonaro, agora oficialmente acusado de ‘crime contra a humanidade’ pela CPI da Covid.

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