No dia em que se comemora os 21 anos de história de luta do movimento Trans no Brasil, em 29 de janeiro, Dia Nacional da Visibilidade Trans, o grupo que já conquistou o uso do nome social em repartições e órgãos públicos federais (Decreto 8.727/16), continua denunciando os altos índices de violência contra as diversidades sexuais e de gênero. Colocar as pessoas trans no centro do debate é um passo para a garantia de respeito, oportunidade, reconhecimento social da diversidade.
Passadas duas décadas da data histórica, a população trans e travestis continuam sendo impactada pela ausência ou escassez de políticas públicas, de mercado de trabalho e do preconceito na enorme maioria dos espaços sociais e políticos.
Nesse contexto, há ainda setores conservadores dedicados a afastar o debate de gênero e diversidades das salas de aulas de escolas e universidades. Trata-se de um projeto de manutenção da opressão e exclusão nos marcos do capitalismo.
O recém-divulgado novo dossiê da Rede Trans Brasil informa que 105 pessoas trans foram mortas no país em 2024. Apesar da redução de 14 casos a menos do que foi registrado em 2023 (quando houve 119 vítimas), o país lidera, pelo 16º ano consecutivo, a posição de nação que mais mata pessoas trans no mundo.
Estas informações integram o documento “Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024: da Expectativa de Morte a um Olhar para a Presença Viva de Estudantes Trans na Educação Básica Brasileira”, que está sendo lançado nesta quarta, 29 de janeiro.
Segundo o estudo, o perfil majoritário das vítimas é de mulheres trans ou travestis (93,3%), das quais 36,8% tem de 26 a 35 anos (36,8%) e 62,5% são negras. A expectativa de vida dessa parcela da população é de apenas 35 anos, quando a média nacional de toda população brasileiro é de 76 anos.
O país que lidera o ranking de assassinatos de pessoas trans, não por acaso, também está entre os que mais assassinam jovens negros e mulheres no mundo. A intersecção aponta que as opressões não são fenômenos isolados, mas têm cor e gênero.
Índices por região
A região que concentrou a maioria das mortes foi o Nordeste, pelo segundo ano consecutivo, com 38% das ocorrências. Já o Sudeste atingiu a marca de 33% dos óbitos, ocupando o segundo lugar. Em números absolutos, São Paulo foi o estado com o maior número de mortes, com o registro de 17 assassinatos, seguido de Minas Gerais, com dez casos, e do Ceará, com nove.
Transfobia
A população trans enfrenta os desafios da violência social para afirmar o gênero no qual se identifica, e é preciso luta e resistência para se auto afirmar nessa forma de sociedade excludente.
Em 2023, os estudos publicados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), no Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTIA+, mostrou que no Brasil os ambientes políticos e sociais foram os principais propagadores da LGBTIfobia estrutural. Esses espaços acabam impactando como as pessoas LGBTQIA+ são recebidas, aumentando os riscos de violações de direitos humanos e violência contra esses corpos, suas identidades de gênero, orientações sexuais e expressões de gênero.
Sem conseguir vender a força de trabalho, segundo a Antra, 90% das mulheres trans estão atuando na prostituição. A maioria não tem família para acolhê-las, pois grande parte é expulsa de casa ainda adolescente, o que acarreta problemas de insegurança financeira, falta de moradia adequada e submissão a mais violência.
Para enfrentar o grave quadro de transfobia que atravessa o Brasil, defende-se a adoção de medidas que perpassem pela criação de políticas públicas – capazes de garantir direitos; proporcionar experiências de identificação por meio de campanhas publicitárias; ampliação das medidas de proteção; e a construção de um diálogo que vise a conscientização efetiva do combate à discriminação.
Mas a efetivação desse conjunto de medidas não basta. É preciso enfrentar o sistema capitalista que se alimenta dessa e de tantas outras opressões, como racismo e machismo.
Nome social em órgãos públicos federais
A regulamentação do uso do nome social é uma grande conquista no combate à discriminação e na promoção de políticas de inclusão e visibilidade. Nos órgãos federais, a ação só foi possível com o Decreto 8.727/2016, que determinou que pessoas travestis e transexuais sejam tratadas pelo nome social.
Outra conquista foi a Resolução 270/2018 do CNJ, que também garante o uso do nome social pelas pessoas trans, travestis e transexuais usuárias dos serviços judiciários, membros, servidores, estagiários e trabalhadores terceirizados dos tribunais brasileiros.