Defesa dos direitos humanos foi relembrada internacionalmente neste dia 24


25/03/2019 - Shuellen Peixoto

Passeata dos 100 Mil, no Rio de Janeiro, em 26 de junho de 1968, em reação ao assassinato do estudante secundarista Edson Luís (praticado por tropas do regime ditatorial em 28/03/1968, no restaurante Calabouço). Crédito: Evandro Teixeira.

Neste domingo, 24 de março, pela segunda vez oficialmente o Brasil somou-se às celebrações do Dia Internacional para o Direito à Verdade para as Vítimas de Graves Violações dos Direitos Humanos.

Criada há oito anos pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, a data é uma referência ao assassinato de Monsenhor Óscar Arnulfo Romero, bispo de El Salvador, morto enquanto realizava uma missa, durante os conflitos armados daquele país. O bispo era conhecido pela dedicação à defesa dos direitos humanos e da democracia, e seu assassinato causou protestos em todo o país e pressão de organismos internacionais que exigiam do país o enfrentamento à violência política.

Apenas em janeiro 2018, a data foi reconhecida como parte do calendário oficial brasileiro, com a Lei 13.605.

Na opinião da diretora do Sintrajud, Ana Luiza Figueiredo, servidora aposentada do TRF-3, a data é importante por dar publicidade às atrocidades que aconteceram no país durante o período da ditadura empresarial-militar.”No Brasil, a anistia acabou beneficiando os militares e os torturadores, garantiu para eles manterem suas carreiras e postos de trabalho, todos os crimes de tortura e assassinato foram perdoados, ou seja, não contemplou os que lutaram [contra o regime]. Por isso, é preciso sempre contar essa história, para que não esqueçamos o que aconteceu e evitar que estes fatos se repitam”, destacou.

Ana sofreu os efeitos da repressão no período da ditadura civil-militar no Brasil. Chegou a ser presa e foi demitida do banco em que trabalhava em 1979, enquadrada na Lei de Segurança Nacional, por ter participado da greve dos bancários. Mesmo com a comprovação de que foi perseguida e perdeu seu emprego no período, a servidora ainda não foi anistiada.

“Acho que este governo é consequência de não termos feito ajuste de contas com a ditadura. O Brasil não foi até o fim, derrubamos a ditadura, mas a luta pela reparação não foi feita até o fim. Temos que seguir nesta luta, e mais ainda porque hoje temos um governo com um peso dos militares muito grande e isso é sempre uma ameaça de retrocesso, aos direitos civis e às liberdades democráticas”, afirma Ana.

Joel Teixeira

Também servidor aposentado da Justiça Federal, Joel de Andrade Teixeira é outro colega que perdeu o emprego naquele período. O aposentado era funcionário da companhia aérea Transbrasil e militante do PCB, e foi demitido no mesmo dia em que foi preso, 16 de abril de 1975, e levado para o centro de torturas instalado no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna). Lá, Joel conta que sofreu “todas as torturas possíveis” nos dias em que esteve detido. Atualmente, o servidor é um dos 4.300 brasileiros anistiados.

Joel recebeu um pedido de perdão do Estado brasileiro por todas as atrocidades e perseguição política pelas quais passou nos anos da ditadura. No entanto,  afirma que ainda há muito a percorrer no caminho em busca da verdade e justiça. “A Comissão da Verdade cumpriu um papel importante, mas ainda há muito o que fazer em prol daqueles que foram torturados e para dar respostas às famílias dos que foram mortos e até hoje não foram descobertos [os locais de sepultamento]”, afirmou Joel Teixeira.

“Esperamos que esta data seja sempre mais um momento de união para restabelecer os direitos civis dos que lutaram pelo fim da ditadura, e principalmente punir os torturadores e os que participaram do regime de ditadura civil-militar”, finalizou Ana Luiza Figueiredo.

A busca pela verdade e justiça sobre os crimes do regime ditatorial no Brasil já rendeu ao país ao menos três condenações internacionais. A mais recente deve-se à inércia do Estado em apurar as circunstâncias e responsabilidades do assassinato do jornalista Vladimir Herzog, também nas dependências do DOI-Codi, em 24 de outubro de 1975.

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