No último dia do Encontro de Aposentados, Aposentadas e Pensionistas do Sintrajud, domingo (1º de setembro), a mesa ‘Etarismo e saúde na terceira idade’ movimentou o plenário. Participantes aposentados há mais tempo e recém ingressos no que os organismos internacionais consideram o marco para a condição de idoso – mais de 60 anos de idade – brilharam os olhos ao ouvir avaliações e análises sobre as vantagens, preconceitos e desafios para suas vidas em um evento sindical. Essa foi também a discussão que gerou o maior número de inscrições da plateia.
A mestra em Gerontologia pela PUC/SP e especialista em Gestão de Programas Intergeracionais pela Universidade de Granada/Espanha Celina Dias iniciou sua palestra falando sobre os estereótipos acerca do envelhecimento e como eles afetam a subjetividade das pessoas numa sociedade organizada para a geração de de lucros. O “etarismo”, “ageísmo” ou, no caso das pessoas com mais idade, a velhofobia ou gerontofobia, são preconceitos derivados de rótulos sociais que organizam as desigualdades e assimetrias nas relações. Uma forma de discriminação que se intersecciona com outros marcadores sociais de diferenças, como sexo, gênero, sexualidade, raça e classe social.
A especialista alertou que o debate sobre os preconceitos etários vem evoluindo desde a década de 1960, mas só em 2022 a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou um relatório internacional sobre o “idadismo”.
A especialista chamou a atenção para o fato de que até mesmo o crescimento do tema na sociedade capitalista está vinculado ao projeto social dominante. “Será que essas questões não estão sendo inseridas por conta de uma questão econômica mundial, dos velhos terem que ainda servir de mão de obra?”
Celina alertou também para o fato de que “internalizamos o etarismo” e somos autoafetados pelos preconceitos socialmente construídos por toda a cultura “anti-aging” (anti-idade) e pelo uso de eufemismos como “melhor idade”, “idade de prata”. Ideias como “estou velho/a, não tenho mais o que fazer”, “meu futuro já chegou”, são exemplos dessa internalização.
Paulo Spina – educador físico na área de saúde mental no SUS, mestre em Ciências Sociais e doutorando na FFLCH-USP – compôs a mesa abordando os impactos do etarismo no adoecimento psíquico e físico. “As características da opressão etarista são muito específicas e sua percepção é muito recente”, ressaltou.
“O etarismo traz impactos para a pessoa que sofre aquela violência, mas é algo que está na cultura, está no contexto. Então, mesmo que eu não pratique etarismo, velhofobia, de alguma forma eu sofro, porque isso está no contexto cultural e atinge a gente de alguma maneira”, destacou. É assim que internalizamos essa percepção de mundo, explicou o especialista.
Spina ressaltou que “Não dá para esperar a sociedade deixar de ter esses preconceitos para as pessoas se colocarem na sociedade.Não se isolar, não deixar nos puxarem para baixo é muito fundamental”
O especialista trouxe ainda o conceito de saúde mental da OMS, que aponta a condição saudável como a conjunção de “um estado de bem-estar em que o indivíduo realiza suas capacidades/habilidades, supera o stress normal da vida, sente-se produtivo e contribui de alguma forma para a sua comunidade”.
Ivo Oliveira Farias, oficial de justiça aposentado do TRT-2, lembrou que vem sendo muito destacado pela OMS o crescimento da prevalência de suicídios na faixa etária de 15 a 29 anos. “É gritante e cada vez mais alta mortandade por suicídio [neste grupo etário], mas isso invisibiliza que sempre a taxa mais alta foi e é na velhice. Só que para o capital não importa, é melhor que a gente morra mesmo e não onere o INSS, na lógica deles”. Ivo questionou também o capacitismo e produtivismo na definição da OMS sobre a saúde mental. O servidor é voluntário em grupos de apoio a sobreviventes enlutados pelo suicídio.
Rosana Nanartonis, diretora do Sindicato e servidora do TRE-SP que coordenou os trabalhos nesta mesa, lembrou que muitas vezes os mais velhos são tratados de forma infantilizada e desrespeitosa inclusive por profissionais que deveriam cuidar da sua saúde. “Muitas vezes a gente vai a um médico e ele diz ‘Você tem que parar de comer isso e caminhar’. Aí você pontua que já faz atividade física e ele nem te escuta e repete que você tem que parar de comer isso ou aquilo e caminhar. Nos resta virar as costas e procurar outro profissional”, apontou.
A oficiala de justiça aposentada do TRT-2 Maria Francisca Rueda começou sua fala informando que “vim aqui esperando ouvir esta palestra, estava ansiosa por isso”, relatou. Ela defendeu ainda que os especialistas convidados para falar sobre essa temática tenham maior tempo de fala nos eventos do Sindicato e que o assunto seja debatido também com os colegas da ativa. “Porque por trás do preconceito existe também o medo de envelhecer”, disse.
Ana Luiza, diretora do Sindicato e aposentada do TRF-3, destacou que “Embora a OMS e a ONU estejam falando muito contra os preconceitos, nunca vivemos um período de tanto adoecimento e preconceitos. Ontem falávamos da decadência do sistema ao qual estamos submetidos, e algo que está em decadência piora tudo. Não vai ter possibilidade de bem-estar numa sociedade que destrói o humano, a natureza e tudo. Vamos ter que construir saídas para isso”.