Cristiane Brasil no Ministério do Trabalho expressa caráter do governo


26/01/2018 - Luciana Araujo

A luta judicialmente travada pelo governo Temer para manter a designação de uma cidadã implicada em pelo menos três processos e duas condenações por burla de leis trabalhistas na chefia do Ministério do Trabalho diz muito sobre o caráter do segmento das elites brasileiras que ocupa o Palácio do Planalto. A nomeação da deputada federal Cristiane Brasil (PTB/RJ) se arrasta desde o dia 3 de fevereiro. O Executivo e a própria deputada dizem que não vão desistir. O motivo: a negociação da pasta responsável por efetivar o novo sistema de contratações após a derrubada da CLT com a reforma trabalhista é parte das articulações por votos pró reforma da Previdência.

A presidenta do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, pode decidir a qualquer momento sobre o caso. Os autos do processo estão conclusos para apreciação desde a noite desta quinta-feira, 25.

Balcão de negócios para retirada de direitos

Depois de nomear o primeiro ministério inteiramente branco e sem nenhuma mulher desde o ditador Ernesto Geisel, ter um terço dos ministros citados na Operação Lava Jato e abrir sem melindres os cargos de primeiro e segundo escalão como moeda de troca para aprovação de medidas impopulares, como a reforma da Previdência. No último sábado, 20 de janeiro, ao sair de uma reunião com Temer no Palácio da Alvorada, o líder do governo na Câmara dos Deputados, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), comemorava a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de autorizar a posse da nova ministra como uma ajuda na tramitação da PEC 287. Conforme noticiou o jornal ‘O Globo’, Aguinaldo Ribeiro declarou que a decisão “dá tranquilidade para que nós possamos avançar nas conversas com os partidos para aprovar a reforma da previdência”.

Não é exatamente estranho para um governo que desmontou a Consolidação das Leis Trabalhistas, tentou relaxar as regras de combate ao trabalho escravo e busca extinguir o que ainda resta do sistema de Previdência Social consolidado na Constituição de 1988.

A nomeação de Cristiane tem ainda a marca de ter sido articulada por seu pai e controlador da sigla partidária que já foi o partido do ex-presidente Getúlio Vargas. Roberto Jefferson, delator e um dos condenados do escândalo ‘Mensalão’, anunciou a nomeação da filha entre sorrisos e bravatas de que a Justiça do Trabalho seria uma “babá cara”, “uma excrescência brasileira” que deveria ser extinta.

Celeuma jurídica

Desde o dia 3 de janeiro, quando foi anunciada, a nomeação de Cristiane Brasil virou uma queda de braço do governo Temer com o judiciário. Suspensa pela 4ª Federal de Niterói em decisão posteriormente confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a questão agora está no Supremo Tribunal Federal.

Na última segunda-feira (22), pouco antes da cerimônia marcada de última hora com base em liminar do Superior Tribunal de Justiça, a ministra Cármen Lúcia suspendeu novamente a posse até que seja juntada a decisão do STJ. O posicionamento da presidenta do Supremo se deu em mais uma ação movida por um coletivo de advogados que vem questionando a nomeação de Cristiane desde o início.

A Procuradoria Geral da República manifestou na última quarta-feira o entendimento de que cabe ao Supremo analisar o pedido de suspensão da liminar que assegurava a posse da ministra.

Fundamento legal da posse divide juristas

Juristas vêm divergindo também sobre a legitimidade do conteúdo dos questionamentos e das decisões sobre a posse de Cristiane Brasil.

Em entrevista ao jornal ‘Folha de S.Paulo’ o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto defendeu que a Corte Suprema é o foro competente para decidir sobre o mandato de Cristiane com base nos princípios constitucionais da “soberania do trabalho” e de que “a ordem social tem como base o primado do
trabalho”.

Para Britto estas devem ser as bases jurídicas para avaliar se a Constituição vigente “autoriza ou desautoriza a investidura de alguém no cargo de ministro de Estado que, concretamente, revelou na sua vida desapreço pelo trabalho a ponto de receber duas condenações”, declarou à ‘Folha’.

Outros especialistas apontam que execuções trabalhistas não impedem a nomeação ou exercício de cargo público em geral, ou que a Constituição não proíbe a ocupação de cargo ministerial por condenados em ações cíveis ou trabalhistas. Esta foi a tese defendida pela professora da Fundação Getúlio Vargas Marta Machado também em entrevista à Folha.

A ação popular que pediu ao STF a suspensão da posse invoca o princípio da moralidade previsto no artigo 37 da Carta Magna para a nomeação em cargo público. Os advogados também invocam a nulidade de ato de admissão ao serviço público “com desobediência, quanto às condições de habilitação, das normas legais, regulamentares ou constantes de instruções gerais”, prevista no inciso I do artigo 4º da Lei 4.717/1965.

Para a direção do Sintrajud, ainda que se resolva a controvérsia jurídica na nomeação de um ministro com a trajetória de Cristiane Brasil, é inegável a mácula moral de entregar o controle das relações trabalhistas do Brasil a alguém que é reincidente no descumprimento de direitos dos trabalhadores.

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