Bolsonaro admite que sabia de denúncias levadas por servidor; Câmara debate ‘estabilidade’


14/07/2021 - Helcio Duarte Filho
Servidores puxam hashtag #EstabilidadeSimCorrupçãoNão nesta quarta (14), dia em que a CPI da Vacina deve ser levada à audiência da 'reforma' Administrativa

A estabilidade dos servidores públicos, tema de audiência pública na comissão especial da Câmara que analisa a ‘reforma’ Administrativa, a partir das 14h30min desta quarta, 14 de julho, segue sendo uma pedra no caminho de Jair Bolsonaro e de possíveis esquemas de fraude no governo.

O presidente bem que tentou afastar de si a suspeita de prevaricação ou mesmo envolvimento direto no possível crime. Fez isso finalmente admitindo a jornalistas, na segunda-feira, 12 de julho, ter recebido papéis de um parlamentar aliado sobre indícios de fraude na compra de vacinas indianas.

Disse logo ter passado adiante os papéis, sem baixar olhos neles. Mas não se livrou das evidências de prevaricação, de ter se omitido diante de um caso de corrupção. Pode, ainda, ter se complicado mais ainda na suspeita de envolvimento direto no caso de corrupção.

Isto porque Bolsonaro disse que encaminhou os papéis apenas para o então ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, que não integrava órgão algum responsável por apurar denúncias de irregularidades e corrupção. Como chefe da pasta, poderia estar entre os envolvidos caso o teor das denúncias se confirmasse. E de fato hoje é tratado como investigado pela CPI da Covid, instalada no Senado Federal.

18 dias para admitir que sabia das denúncias

O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e seu irmão, o servidor público Luis Ricardo Miranda, depuseram em 25 de junho de 2021 na CPI da Covid, quando afirmaram ter levado as denúncias a Bolsonaro. O presidente assistiu por 18 dias o caso ganhar destaque na mídia e muita atenção nas redes sociais, para reconhecer que eles falaram a verdade sobre o encontro. Luis Ricardo Miranda é servidor público do Ministério da Saúde, concursado e com a estabilidade a que Bolsonaro tenta pôr fim com a proposta que carrega o serviço público de seus sonhos.

Luís Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde,, ao depor na CPi da Covid em 25 de junho (Foto: Pedro França/Ag. Senado)

Ao longo destas quase três semanas em que não negou, porém também não confirmou, o governo ameaçou abrir um processo administrativo disciplinar contra o servidor – pelas regras da ‘reforma’ que tenta aprovar, não precisaria disso: poderia demiti-lo sumariamente.

Além disso, a base aliada bolsonarista entrou com pedido de quebra de decoro contra o deputado na Comissão de Ética da Câmara. Nas redes sociais, partidários de Bolsonaro ameaçaram os autores da denúncia de retaliações e até de morte.

Corrupção e mortes

A versão divulgada por Bolsonaro, na busca de um álibi para o crime de prevaricação, está, portanto, longe de livrá-lo de responsabilidades – e que, registre-se, podem envolver a morte de mais de 500 mil pessoas em decorrência da pandemia da covid-19.

Afinal, as providências que o próprio Bolsonaro assume ter tomado se limitaram a isso: avisar a um dos suspeitos que recebeu documentos relacionados a possível crime de corrupção, no qual ele próprio, o ministro, poderia estar envolvido. Pediu ao suspeito para que cuidasse da denúncia. E parou por aí. Nada foi encaminhado aos órgãos de controle e investigação, como o presidente chegou a afirmar em versões pretéritas.

Visita a Fux

As declarações de Bolsonaro admitindo ter sido informado da possível fraude – sem explicar o motivo de só agora tornar isso público – foram dadas a jornalistas no mesmo dia em que o ministro Luiz Fux o recebeu. O presidente do Supremo Tribunal Federal, investindo-se de um papel moderador não previsto na Constituição Federal, disse ter proposto um pacto entre os chefes dos três poderes em prol da democracia.

Fux e Bolsonaro, na posse do presidente do STF, em setembro de 2020 (Foto: Marcos Correa/PR)

Fux recebeu Bolsonaro para um cafezinho após uma série de ameaças do presidente às eleições, de possíveis golpes e ataques ferozes ao próprio STF. O presidente da República chamou o ministro Luís Roberto Barroso de imbecil e, falsificando argumentos, de pedófilo. Disse ‘caguei’ para um pedido da CPI da Covid de esclarecimentos sobre o caso da suspeita de vacina com propina – para alguns dias depois admitir a jornalistas que de fato os irmãos Miranda o procuraram quatro meses atrás.

Enquanto se defendia, o presidente parou a entrevista ao ser importunado com perguntas incômodas. Rezou o Pai Nosso. Não se sabe se pediu a Deus um álibi melhor ou talvez por aliados que o livrem de quaisquer investigações no parlamento ou na Justiça. Ou, quem sabe, ajuda para acabar com a estabilidade dos servidores públicos, que nesta quarta-feira levam os escândalos da CPI da Vacina para os debates sobre a ‘reforma’ Administrativa, puxando a hashtag #EstabilidadeSimCorrupçãoNão, pelo arquivamento da Proposta de Emenda Constitucional 32/2020.

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