Bolsonarista critica concurso público: serve para pôr ‘boi na sombra’ e não trabalhar


24/05/2021 - Helcio Duarte Filho
Deputado se junta a comentários de Guedes e relator e corrobora com associação da PEC 32 a fim dos concursos e volta do apadrinhamento.

O deputado Carlos Jordy, que costuma atuar sem máscara (reprodução).

Mais uma manifestação de aliado do presidente Jair Bolsonaro indica que o governo tem aversão ao concurso público como critério impessoal de acesso aos serviços públicos. O deputado federal Carlos Jordy (PSL-RJ) disse na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara que os serviços públicos e os concursos públicos se tornaram um “grande negócio” para quem não quer trabalhar. “As pessoas falavam ‘eu quero me formar, eu vou fazer o concurso público e eu vou ter lá meu boi na sombra durante a minha vida inteira, não vou ser demitido'”, disse.

As declarações reforçam a compreensão de sindicatos e movimentos contrários à reforma de que a Proposta de Emenda Constitucional 32/2020 tem entre seus objetivos acabar não só com a garantia de estabilidade no emprego, como também com o modelo impessoal hoje existente de concursos para acesso a cargos na administração pública.

O parlamentar, que é servidor concursado da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, disse não querer generalizar e que há quem trabalhe no setor público, mas isso foi um detalhe num discurso que teve como ênfase o lugar-comum de que servidor não trabalha. Jordy já foi motivo de moções de repúdio de servidores de universidades públicas, ao associar sem provas a educação pública a “fábrica de orgias”.

Nos comentários do chat da transmissão da TV Câmara, muitas críticas à proposta e mensagens em defesa da estabilidade e dos concursos públicos impessoais. “Esse PEC vai legalizar os apadrinhados e as rachadinhas”, disse Márcia Monteiro. “A estabilidade protege os cargos contra arbitrariedades dos políticos de plantão. Votar a favor dessa PEC é reforçar o coronelismo, deputados. A população está de olho!”, escreveu Moisés Machado. “Serviço público para ser justo tem que ser impessoal, e essa reforma fere em cheio a impessoalidade, além de permitir a contratação de ainda mais apadrinhados políticos e cabos eleitorais”, afirmou Iris Karine Silva.

O deputado bolsonarista também se equivocou ou mentiu ao tratar da estabilidade e possibilidades de demissão de servidores pelas regras atuais. Disse que ninguém é demitido exceto se cometer algum crime. Isso é falso. Servidores com ausências em excesso ou que se recusem a trabalhar ou que cometam desvios, entre outros casos, podem sim ser demitidos, após responderem por processo administrativo. “Ouvi um deputado falar que o servidor já pode ser demitido. É mentira, o servidor só vai ser demitido se ele cometer um crime, um peculato, se ele estiver subtraindo alguma coisa no serviço público. Fora isso, ele não pode ser demitido”, disse, contrariando o que está na lei.

Curioso que o deputado ressaltou que a estabilidade será mantida para policiais e outras carreiras exclusivas de Estado – não mencionou mais nenhuma além da referência às forças policiais. Como disse isso logo após afirmar que na sua visão hoje o servidor nem precisa trabalhar que não será demitido, conclui-se, por seu discurso, que em sua avaliação mesmo policiais que se recusem a comparecer ao trabalho devem ser protegidos pela estabilidade no emprego.

Deputados e deputadas se revezam nesta segunda (24) em discursos sobre a PEC-32. A intenção da presidente da comissão, deputada Bia Kicis (PSL-DF), é que a matéria seja levada a voto na tarde desta terça (25). Os movimentos contrários à proposta pediram a intensificação das manifestações nas redes sociais, para dar visibilidade à rejeição à reforma de Bolsonaro. A hashtag usada é #PEC32voteCONTRA.

Darci e Paulo Guedes

O relator da matéria, deputado Darci de Matos (PSD-SC), também reiteradas vezes identificou na proposta, de modo às vezes aparentemente confuso, a revogação da exigência de concurso para a maioria dos cargos no setor público. Quando esteve na CCJ para defender a ‘reforma’, o ministro Paulo Guedes (Economia) chegou a criticar o concurso público comparando-o a uma porta de entrada de militantes favoráveis ao governo – não explicou de onde extraiu esse raciocínio, mas não deixou dúvidas de que a ‘reforma’ do governo busca restringir ao máximo os concursos públicos impessoais no Brasil.

Trecho da fala do deputado da CCJ na TV Câmara: 

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