Após dizer a servidores ser contra privatizar, Lira comandou privatização dos Correios na Câmara


13/08/2021 - Helcio Duarte Filho
Trabalhadores de empresas estatais, também atingidos pela 'reforma' administrativa de Bolsonaro, devem participar dos atos e da greve de 18 de agosto.

Quando recebeu representantes de entidades sindicais dos servidores e das centrais sindicais, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse ser contrário a privatizações e terceirizações nos serviços públicos. Foi enfático neste discurso, enquanto defendia a urgência de se aprovar a ‘reforma’ Administrativa, mesmo que com alterações em seu conteúdo, e tentava assegurar que não se mexerá em nenhum direito dos atuais servidores públicos.

Menos de 24 horas após a conversa com os representantes sindicais do funcionalismo, ocorrida no dia 4 de agosto de 2021, o presidente da Câmara comandou a votação em Plenário do projeto de lei que abre caminho para privatizar os lucrativos Correios, a mais antiga e tradicional estatal do país. “Que o serviço público seja público, que se tenha concurso. Agora, a gente não poder redesenhar o sistema público brasileiro para um sistema mais moderno? O nascimento e o surgimento de novas profissões e o encerramento de outras tantas? Não se pode dizer que não é o momento, gente”, disse aos servidores poucas horas antes de defender a privatização dos Correios.

Não houve surpresa nisso. Todos sabiam que privatizar a estatal é uma das prioridades do governo Bolsonaro e do presidente da Câmara. Porém, a proximidade entre uma coisa e outra expôs mais a distância existente entre o discurso do parlamentar — um dos líderes do chamado Centrão — e a realidade do que coloca em prática.

E corrobora com a desconfiança dos sindicatos — ou o melhor seria dizer certeza — de que não dá para confiar de forma alguma na promessa do governo de que os direitos dos atuais servidores serão todos preservados.

Não que o texto que está em análise na comissão especial passe a atender às pautas do funcionalismo e dos sindicatos caso dele seja extraído tudo o que atinge os quase 12 milhões de servidores públicos existentes no Brasil nas três esferas de governo — municipal, estadual e federal. Afinal, a avaliação que as entidades fazem é que a proposta é um largo passo no caminho da privatização e do desmonte do setor público — o que atingirá a todos. Não há como mudar isso sem suprimir todas as linhas do texto que teria sido elaborado pelo ministro Paulo Guedes (Economia).

A questão é que esse discurso, sustentado reiteradamente pelas vozes que falam pelo governo federal, não está sendo tão repetido por preocupação com quem já integra os quadros das administrações. Tudo leva a crer que o governo já fez as contas e não encontrou votos para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional 32 caso ela marque os deputados como algo que ataca os atuais servidores.

Por isso, tanto Paulo Guedes quanto Arthur Lira não se cansam de bater na tecla de que os direitos dos atuais servidores serão preservados. É com essa batalha retórica que o Planalto defende a PEC 32 e diz querer votá-la até o final de agosto no Plenário da Câmara.

Manifesto

Quando conversou com as centrais sindicais e as entidades do funcionalismo, numa reunião agendada pela Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, Lira recebeu um manifesto aprovado no Encontro Nacional do Setor Público, que pede a suspensão da tramitação da proposta. É deste encontro — que reuniu mais de 1.200 servidores das três esferas e 11 centrais sindicais — que nasceu o plano de luta contra a ‘reforma’, que prevê a greve geral de 24 horas do setor público contra a PEC 32 marcada para 18 de agosto.

O parecer do relator Gil Cutrim (Republicanos-MA) para o projeto que permite a privatização de 100% dos Correios — e entrega o monopólio de envio de cartas e postais ao setor privado — foi aprovado por 288 votos a favor, 173 contra e duas abstenções. Lira teve papel determinante para o resultado — recusando inclusive pedidos de suspensão da votação da proposta, que é apontada como inconstitucional. A Constituição Federal prevê que o serviço postal é exclusivo da União.

Com a possível privatização — o projeto vai para o Senado — cerca de 90 mil empregados públicos da empresa podem ser demitidos. Os Correios estão presentes em todos os 5.570 municípios. É a empresa pública mais antiga do Brasil, fundada há 358 anos. Além do transporte de cartas e encomendas com as menores tarifas do mercado, fornece outros serviços à população, como pagamentos, serviços bancários e emissão de documentos. Também transporta provas do Enem e vacinas.

Audiência pública e greve

Na quarta-feira (11), audiência pública na Comissão Especial da PEC 32 abordou a “Situação dos empregados públicos na reforma”. Representantes dos trabalhadores afirmaram que a ‘reforma’ administrativa atinge os trabalhadores das estatais e que a luta para impedir a sua aprovação é de todos que trabalham no setor público. As manifestações e greves previstas para o dia 18 de agosto (quarta-feira) deverão contar com a participação de trabalhadores dos Correios e de outras empresas públicas.

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