Após defender ‘universidade para poucos’, ministro da Educação fala contra expansão universitária


17/08/2021 - Helcio Duarte Filho
Na véspera de greve de 24h, Milton Ribeiro falará sobre orçamento para 2022 e deverá ser questionado sobre suas posições elitistas; também haverá audiência sobre PEC 32.

Uma semana após declarar que o acesso à universidade “deve ser para poucos” no Brasil, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi ouvido na Comissão Mista de Orçamento nesta terça-feira, 17 de agosto, em audiência pública sobre a situação orçamentária das universidades federais e dos institutos federais de ensino. A reunião semipresencial foi transmitida no Canal da Câmara no Youtube (assista aqui) e foi solicitada pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP) e pela senadora Rose de Freitas (MDB-ES).

Ribeiro afirmou logo no início de sua fala nesta audiência “que assim como na pandemia os grandes protagonistas foram os médicos, os hospitais, os enfermeiros e as pessoas da saúde, eu creio que no pós-pandemia os grandes protagonistas serão os professores e todos os profissionais de educação”. A constatação desconsiderou o fato de que a ‘reforma’ administrativa do governo que integra atinge em primeiro lugar profissionais de saúde e educação, cerca de 40% dos servidores públicos de todo o país, de acordo com o Ipea (instituto governamental de pesquisas socioeconômicas).

Também nesta terça haverá audiência pública sobre a ‘reforma’ Administrativa (PEC-32), a partir das 15 horas, abordando ‘os efeitos da reforma sobre os atuais servidores públicos’. Na véspera de um dia nacional de greve e protestos no setor público contra a ‘reforma’ administrativa (PEC-32), no qual os cortes orçamentários e os riscos que a proposta traz para a educação pública deverão ser também levados às ruas. Os servidores do Poder Judiciário Federal também vão participar – em São Paulo, a categoria decidiu em assembleia aderir à greve de 24 horas e participar das manifestações deste dia.

O ministro da Educação, que está completando um ano no cargo, falou sobre o projeto de lei orçamentária para 2022 e foi questionado sobre os cortes e bloqueios de verbas nas instituições federais de ensino, sobre os quais disse ter conseguido liberação. A realidade é que o setor vive talvez a maior crise orçamentária de sua história, decorrente dos cortes determinados pelo governo de Jair Bolsonaro.

Ribeiro, que, ao contrário de seus antecessores, pouco foi visto ao longo de um ano no cargo, tem sido muito contestado e criticado por sindicatos, entidades estudantis e educadores pelas posições que defendeu. “Então acho que o futuro são os institutos federais, como é na Alemanha. Na Alemanha são poucos os que fazem universidade, universidade na verdade deveria ser para poucos nesse sentido de ser útil à sociedade”, disse em entrevista recente, sem explicar porque, mesmo com essa controversa posição, os institutos federais também sofrem cortes que vêm ameaçando até a possibilidade de funcionamento de seus campi.

Embora tenha causado barulho, a declaração de Milton Ribeiro não chega a ser uma novidade no governo Bolsonaro. O jornal ‘Folha de S.Paulo’ lembrou que ela é muito semelhante à que deu, em 2019, o primeiro titular do MEC na gestão de Bolsonaro. Na ocasião, Ricardo Vélez disse ao jornal ‘Valor Econômico’ que as universidades deveriam “ficar reservadas para uma elite intelectual”, também sendo muito criticado pelas entidades sindicais.

Para tentar justificar a sua posição, o ministro mencionou na entrevista citada o desemprego entre pessoas com o terceiro grau de ensino. “Com todo o respeito que tenho aos motoristas, é uma profissão muito digna, mas tem muito engenheiro, muito advogado dirigindo Uber porque não consegue colocação devida. Mas se ele fosse um técnico em informática estaria empregado, porque há uma demanda muito grande”, disse.

Hoje, Ribeiro voltou a afirmar que “não adianta enchermos de universidades e cursos superiores no território nacional, apenas, isso sim é importante, dando acesso”. Além de repetir que orçamento “não resolve tudo” e dizer que a prioridade do governo seria a alfabetização – o que também se choca com a ‘reforma’ administrativa que atinge em cheio docentes da educação básica, fundamental, de nível médio e superior.

O ministro disse também não ver problema em jovens “filhinhos de papai” ocuparem vagas das universidades públicas, porque eles pertenceriam às classes sociais que pagam impostos e sustentam a educação pública. “O que também eu acho justo [‘filhos de papai’ ocuparem 50% das vagas, segundo ele], considerando que os pais desses meninos tidos como filhinhos de papai são aqueles que pagam os impostos no Brasil, que sustentam bem ou mal a universidade pública”, disse. Também não mencionou pesquisas que desmentem este perfil universitário e ignorou que os trabalhadores assalariados são os que mais pagam impostos no país, embutido e quaisquer produtos ou serviços adquiridos que tenham passado pelo mercado formal.

Outra declaração polêmica foi referente às reitorias. Disse que os reitores das universidades federais não precisam “ser bolsonarista, mas não pode ser esquerdista, não pode ser lulista”. “As universidades federais não podem se tornar um comitê político do partido A, nem de direita, mas muito menos de esquerda”, disse. Levantamentos mostram que, desde que assumiu a Presidência, Bolsonaro desconsiderou o primeiro colocado das listas tríplices escolhidas nas universidades em 40% dos casos ao escolher o reitor.

* Colaborou: Luciana Araujo

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